A origem desenvolvimentista da saúde e da doença em PE

Dr. Raul Manhães de Castro
Médico, Professor Emérito da UFPE, Membro Honorário do DOhaD%u2013Brasil e Membro da Academia Pernambucana de Ciências (patrono Josué de Castro)

Publicado em: 20/12/2023 03:00 Atualizado em: 20/12/2023 06:30

Darwin no século XIX propôs a “Teoria da Evolução das Espécies”. Tornou-se fundamentado que as espécies no confronto com o ambiente se modificavam para sobreviver, se adaptando às variações. Darwin havia constatado através de observações rigorosas que indivíduos com características vantajosas em relação a outros no enfrentamento das condições ambientais, possuíam chances maiores de sobrevivência. Esses indivíduos pela mesma razão possuem mais chances de descendência. Nessa peleja, só os sobreviventes se reproduziam e deixavam descendentes: é a seleção natural! E agora, o que pensam os cientistas? As bases conceptuais para evolução proposta por Darwin não são dogmáticas, mas provisórias, incompletas e sempre sujeitas a aperfeiçoamentos ou mesmo refutações. Entretanto, até os dias atuais, a Teoria da Evolução possui muitos elementos robustos, comprovados e verificados. Ademais, a partir do século XX, passamos a conhecer seus principais mecanismos genéticos de base. Por essa soma de elementos, até nos dias atuais, a Teoria da Evolução é um marco científico, racional e credível com um grande poder explicativo. Todavia, a seleção natural, importante e comprovada em vários casos, não explica múltiplos aspectos da evolução. Doravante, além das basilares contribuições de Darwin, despontam os conceitos da biologia moderna magistralmente organizados por Ernerst Mayr, considerado o pai da “Moderna Síntese Evolucionista”. Uma conjunção de fatores levou esse movimento a incorporar à concepção darwinista, fundamentos da genética e da ecologia, desembocando assim no “Neodarwinismo” ou “Teoria Sintética da Evolução” do século XX. No século XIX, dos primeiros estudos evolucionistas, ainda não eram conhecidos os mecanismos de hereditariedade e mutação, apresentados por Gregor Mendel. Surpreendentemente, as ideias de Darwin só se destacariam novamente a partir de 1936. Nessa época, o geneticista soviético Dobzhansky uniria o darwinismo à genética. Durante o século XX, contudo, mesmo a partir dos modelos baseados no gene, houve uma nítida transição. Reconhecia-se altamente significativo o papel do ambiente em induzir modificações. É espetacular a clarividência cientifica do pernambucano Josué de Castro que através de observações requintadas, embora limitadas pelo pouco avanço da fisiologia, já atentava em Recife para a importância do ambiente na resposta orgânica dos seres humanos. Contudo, West Eberhard, uma bióloga e teórica, foi decisiva nesse debate, em meados da década de 80. Suas pesquisas experimentais trouxeram intrinsicamente o novo conceito de plasticidade fenotípica; ou seja, o organismo é capaz de reagir aos desafios impostos pelo ambiente, modificando a sua forma, estado, movimento ou padrão de atividade. Portanto, uma variedade de fenótipos pode ser expressa por um único genótipo, a depender da particular interação do ser com o ambiente. Ademais, outras evidências inclusive epidemiológicas demonstram que variações ambientais, inclusive a da nutrição, levam a mudanças fenotípicas com eventuais repercussões duradouras ou permanentes no metabolismo, estrutura, função dos sistemas fisiológicos e do comportamento. A Unidade de Estudos em Nutrição e Plasticidade Fenotípica da UFPE vem produzindo muitos estudos sobre a plasticidade fenotípica do desenvolvimento, demonstrando que influências no início da vida podem acarretar modificações no adulto. Nesse sentido, é fantástico, que passados mais de 170 anos, baseando-se nos princípios iniciais de Darwin, corroborada e ampliada por novos achados, inclusive em laboratórios pernambucanos, há atualmente uma teoria da “Origem Desenvolvimentista da Saúde e da Doença” (DOHaD, na sigla em inglês) que estabelece novos conceitos e ditames. Vale a pena ressaltar a epigenética, mas esse empolgante assunto fica para outra oportunidade!

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