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Acerca da luz negra em salão de dança

Vladimir Souza Carvalho
Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras

Publicado em: 30/04/2022 03:00 Atualizado em:

Posso afirmar com a autoridade que minha palavra impõe que a luz negra em baile não nasceu em Itabaiana. Deveria. Lá chegou numa noite de sábado, no único clube, noite dançante, impregnada por uma série de discos escolhidos por quem gostava de dançar. Minutos antes, apagaram as luzes do salão de dança.  Ficar no escuro equivalia à luz negra. Dava tudo no mesmo. O problema surgiu quando um sócio, cuja filha estaria presente com o namorado, apurou o motivo da escuridão, e, não teve conversa. Acendeu todas as lâmpadas, sentenciando, no alto de sua idade: quem quiser dançar no escuro feche os olhos.

A estreia de luz negra, abortada. Um tio meu, militar reformado, perguntou ao marido da tia, lá em viagem de visita, se conhecia algum clube no Rio de Janeiro que fizesse baile com luz negra. Resposta negativa. Depois de tudo, indaguei ao marido da minha tia-avó qual a última vez em que estivera em um baile? Esclareceu: 1935. O homem estava realmente autorizado a dar a sua resposta diante de fatos ocorridos no início da década de setenta. Estava mais do que atualizado.  Foi, assim, o meu primeiro contato com a luz negra.

Passou. Em um júri, quando juiz de direito da comarca de Nossa Senhora da Glória, à  míngua de forum, à época, e, mais do que isso, de um lugar apropriado para o júri, a escolha recaiu na sede do clube dos bancários, sala apta, pelo seu tamanho, para tanto. Lá fizemos a arrumação das cadeiras dos jurados, uma mesa em frente a cada um, cadeiras afastadas para os presentes, tudo direitinho, acomodações para juiz, promotor, defesa, acusado, escolta policial, etc. e tal. Entre acusações e defesa, réplicas e tréplicas, o tempo passando, o sol dando sinais evidentes de que ia se retirar, até que eu pedi que acendessem as lâmpadas. Olhe a luz negra de volta.   

E agora, José? O júri continuou, apesar das dificuldades, votação secreta, realizada, o resultado proclamado, a sentença lida em voz alta. A luz negra não atrapalhou tanto. Hoje, décadas e décadas depois, fico me indagando se aquela noite não foi a primeira e última em que, luz negra no teto, ali não se tocou música alguma, nem ninguém dançou? Aposto que sim.

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