Diario de Pernambuco
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A mudança na divulgação dos números

Vladimir Souza Carvalho
Magistrado

Publicado em: 15/08/2020 03:00 Atualizado em: 16/08/2020 17:30

A contagem era manual, e, desta forma, lenta e lerda. Os resultados, de seção por seção. Os que estavam por dentro, de antemão, sabiam que a vitória de Jânio era tranquila. Lott, pesado, com discursos que não atraíam voto. Lá de casa, o pessedismo vitimava todos os habitantes na expectativa de vitória, que não se consumou. Além da espada, ficou a contagem dos votos, a partir do dia seguinte à eleição, até o resultado final, centralizado na bodega de Chico Bateria, na esquina, em frente. Ali estava o combustível que a memória captou.

Tudo se resumia na conversa de dois udenistas. Um, o dono da bodega, de rádio ligado, som alto, os resultados parciais sendo divulgados, estado por estado. O outro, Osvaldo Massa Crua, morador da Rua das Flores, sentado, os dois felizes com a diferença que Jânio ia obtendo, cada vez mais. Eu comprava o pão e me retirava, para, no dia seguinte, assistir à mesma cena, a alegria de eleitores cujo candidato disparava na frente. A vassoura vencia a espada, o consolo nosso, pessedistas de carteirinha, de Sergipe ter sido o único estado onde Lott ganhou. E aí a bandeira alevantando a dúvida da lisura da eleição anterior, dois anos antes, quando o PSD perdeu o governo do estado. Pura choramingas de derrotados.

Agora, de manhã, rádio na mesa, eu, na primeira e demorada refeição, atento ao número de infectados e de óbitos do dia anterior, avaliando se o vírus aumenta ou diminui, a expectativa do azul do céu brilhar. A eterna e risonha conversa alegre de Chico Bateria e Osvaldo Massa Crua, por Jânio estar na frente, sai de cena. A realidade engole a de ontem. A refeição matinal fica silenciosa. Ainda não há queda nos números. Continuo mastigando.

Então, percebo a mudança, aliás, total, a começar pela idade. Em 1960, eu carregava dez anos nos ombros. Quando a outra eleição direta, para presidente, foi realizada, trinta e oito. Ocupava, então, uma cadeira no Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe. Na mesma noite, antes das 22 horas, já se sabia o resultado do primeiro turno. Estava ali, nas máquinas, à frente.

A apuração dos votos de antanho deu lugar ao resultado imediato. Só que, agora, é de infectados e mortos, a gente batendo palmas para os que estão vivos. Tristes tempos...

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