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A consulta médica telepresencial: excepcionalidade que veio para ficar

Vinicius de Negreiros Calado
Advogado e professor universitário

Publicado em: 30/06/2020 03:00 Atualizado em: 30/06/2020 07:04

Não é correto afirmar que a telemedicina brasileira inicia-se em 2020 por causa da pandemia decorrente do coronavírus. O Conselho Federal de Medicina (CFM) possui resolução regulando a matéria desde 2002. Contudo, não há o tratamento amplo e irrestrito do assunto, inexistindo um permissivo expresso para a consulta médica à distância (ou teleconsulta) de caráter ordinário.

A Declaração de Tel Aviv (1999) da Associação Médica Mundial (AMM) reconhece como espécies do gênero telemedicina: a teleconsulta, a teleassistência, a televigilância e “uma interação entre dois médicos” (hoje, teleinterconsulta). A declaração destaca ainda, dentre outras questões, que não se deve optar pela consulta de telemedicina, a menos que se considere que é essa a melhor opção disponível para o paciente.

Assim, desde 1999, por meio da Declaração de Tel Aviv, a AMM reconhece a possibilidade de teleconsulta e o Brasil, passados vinte anos tem agora a chance de regulamentar a questão de modo definitivo, mas, ao que parece, o CFM ainda reluta, posto que em ofício encaminhado ao Ministério da Saúde reconhecera apenas a teleorientação, o telemonitoramento e a teleinterconsulta.

É certo que o CFM chegou a regular a teleconsulta em 2018, mas voltou atrás em 2019. Neste ano de 2020 veio a pandemia e o Ministério da Saúde “deu um passo à frente”, tendo o Congresso Nacional agido rápido e regulado a telemedicina de modo excepcional e temporariamente, inclusive no tocante a consulta à distância.

Na resolução revogada a teleconsulta fora assim definida: “Art. 4º A teleconsulta é a consulta médica remota, mediada por tecnologias, com médico e paciente localizados em diferentes espaços geográficos.”

A Lei nº 13.989/2020 permite, enquanto durar a crise causada pelo coronavírus, o uso da telemedicina (e da teleconsulta), deixando claro que o seu caráter é excepcional e transitório, de caráter emergencial.

Após permitir e definir a telemedicina, a lei trata expressamente da teleconsulta, na medida em que exige do médico uma série de cautelas em virtude da impossibilidade de realização de exame físico durante a consulta à distância, deixando evidente o seu permissivo.

Passada a pandemia serão suspensos os efeitos da Lei, mas a sociedade já estará habituada a nova prática, havendo discussão se a telemedicina deverá ser regulada em seus termos gerais por Lei em sentido estrito ou se competirá ao CFM fazê-lo.  

Assim, esse debate não se encerrará neste momento, cabendo ainda muita discussão sobre o tema, seja no tocante ao aspecto mais restrito da teleconsulta, seja no escopo mais amplo da telemedicina que, diga-se de passagem, já é amplamente utilizada no Brasil, seja na esfera privada, seja na esfera pública, principalmente por meio da Rede Universitária de Telemedicina (RUTE).

De um modo ou de outro, entendemos que a teleconsulta veio para ficar, cabendo às autoridades regularem a matéria em definitivo para garantir a segurança jurídica necessária aos médicos e pacientes, potencializando e ampliando sua utilização no SUS, garantindo atendimento especializado a quem mais precisa, seguindo sempre o conselho da Associação Médica Mundial, isto é, a teleconsulta deve ser usada quando for a melhor opção disponível para o paciente.

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