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Francisco Brennand

Raimundo Carrero
Jornalista e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 23/12/2019 03:00 Atualizado em: 23/12/2019 08:36

A obra de Francisco Brennand marcou a minha vida... Sim, a minha vida, com todos os esses e erres, como se dizia antigamente. Já na infância ou, ainda na infância, tive o meu primeiro alumbramento diante de uma natureza morta – creio que era uma natureza morta – que havia na casa de um parente, talvez na casa de uma parente – seria a sogra? Do meu irmão Valdemar no bairro de São José –, o bairro cheio de sortilégios, mistérios e segredo, onde comecei a conhecer o Recife escuro e fantasmagórico. Estas coisas não têm explicação.

Antecipavam-se as imagens de Dona Sinhá, a inesquecível personagem de Gilberto Freyre, que ainda estava para ser criada. Minha entrada no Recife dava-se com Dona Sinhá, Gilberto Freyre, Brennand e a maçã...

Era uma maçã vermelhíssima sobre um prato cheio de frutas. Uma maçã que era um corte na alma, atacada por espinhos de xiquesxiques. Esta maçã era, na verdade, o coração de Cristo castigado pelos homens. Foi o que me disseram. O que me contaram e isso me marcou para sempre. Eu tinha 10 anos e o mundo mudou.

Chegara do paraíso de Salgueiro no fim da tarde e ali começara a conhecer a dor do Recife, toda esta dor do Recife, conforme o verso de Cabral no poema do Auto do Frade, em meio à agonia de Frei Caneca. Não voltei mais a ver este quadro, mas chegou-me como um aviso de que a vida começara.

Quadro grande, espalhado na parede, vi na casa de Ariano Suassuna, já homem feito, onde passei a ter fortes e belas conversas nos domingos pela manhã, já aí fervendo o caldo da minha formação intelectual. Era este um Cristo torturado, crucificado, os pedaços espalhados por todos os campos. Não com este naturalismo a que me refiro. Mas representados por espinhos. Em nada, em absolutamente nada, Brennand era naturalista.

Um pouco antes deste tempo, vim a conhecer o grupo que todos os domingos se reunia na Oficina de Brennand, na Várzea, para conversas e debates intelectuais, Francisco Brennand, Ariano Suassuna, César Leal, Paulo Fernando Craveiro e Débora, a mulher de Francisco. A conversa circulava, principalmente, sobre a grande literatura ou a grande arte, com paralelos sobre a situação política do país.

De minha parte, comecei a frequentar a Várzea para entrevistas na qualidade de repórter cultural deste Diario de Pernambuco para o momento superior do caderno Viver...

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