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Editorial Protestos em Hong Kong

Publicado em: 17/08/2019 03:00 Atualizado em: 17/08/2019 15:13

Manifestações sacodem Hong Kong há dois meses. Com auxílio das mídias sociais, multidão de jovens se organizam e tomam ruas e lugares estratégicos da cidade. Entre eles, o aeroporto, que registrou atrasos e teve voos paralisados. Rapazes e moças protestam por democracia, ameaçada pelo projeto de lei da extradição. Proposto pela chefe do Executivo, Carrie Lam, o texto permite a extradição para a China e, claro, a submissão às regras de Pequim. Em suma, dá aval para que a pessoa seja julgada no país ora comandado por Xi Jinping.

Em resposta ao movimento que se agrava e parece não ter fim, a repressão mostra-se cada vez mais violenta. O uso de gás lacrimogênio, balas de borracha, bastões para espancamentos não inibe os manifestantes, mas os leva ao hospital ou à cadeia. Para se defender da fúria policial, os jovens organizam concentrações relâmpagos, que se desmobilizam quando se observam sinais de perigo. Carrie Lam, na esperança de acalmar os ânimos, prometeu interromper a tramitação do projeto. Fracassou. A exigência é pelo arquivamento.  

A raiz do problema está na história da província chinesa. Em 1841, Hong Kong passou para o domínio inglês. Tornou-se, graças sobretudo à globalização, importante centro financeiro mundial. Em 1997, depois de amplas negociações, voltou às origens. Pequim firmou acordo em que se estabeleceu um status especial para a província, conhecido por “um estado, dois sistemas”. A cidade, segundo o acerto e a Constituição, deve ter alto grau de autonomia em todas as esferas, exceto nas relações exteriores e na defesa militar. As diferenças entre o território semiautônomo e o continente são muitas — língua, moeda, passaporte, internet livre.

Duas décadas depois, vê-se que o arranjo não deu certo. Especialistas culpam o regime chinês, repressor, incapaz de conviver com a diferença. Com recursos eletrônicos sofisticados, entre os quais a identificação facial, Pequim exerce crescente vigilância sobre a sociedade. Para não serem captados pelas câmeras, populares se protegem com guarda-chuvas. Os manifestantes fazem o mesmo. Daí por que as passeatas são conhecidas por “movimento dos guarda-chuvas”.

No mundo conectado, desordens longas, com perspectiva de agravamento, causam preocupações. A Câmara de Comércio Americana alertou para o risco de a crise gerar a percepção de que Hong Kong seja lugar inseguro. Michelle Bachelet, alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, pediu que o governo tivesse cautela e abrisse investigações sobre o uso de gás lacrimogênio de forma que viola as leis internacionais. Donald Trump, sem grandes explicações, disse que o governo chinês moveria tropas para a fronteira de Hong Kong. Também pediu encontro do presidente chinês com os manifestantes.

Há temores de que ocorra tragédia semelhante à de 1989 em Pequim. Na ocasião, jovens clamavam por democracia. Houve uma série de passeatas. Quando tomaram a Praça da Paz Celestial, foram duramente reprimidos por tanques e tropas. Mas é pouco provável que o massacre se repita. Uma repressão violenta traria mais prejuízos à segunda economia do mundo do que os protestos de rapazes e moças que não querem abdicar do regime de franquias democráticas.

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