Livro Historiador Leandro Karnal lança Todos contra nós, uma análise do viés narcísico dos debates na internet Em tempos de disputa entre 'coxinhas' e 'petralhas', autor afirma que já percebia um desequilíbrio no nosso termômetro político

Publicado em: 20/08/2017 11:40 Atualizado em: 20/08/2017 12:11

Foto: Leya/Divulgação
Foto: Leya/Divulgação
Historiador, escritor, professor de história da Unicamp e doutor em história social pela USP, Leandro Karnal sempre foi figura de prestígio no meio acadêmico. Hoje, se assemelha a uma celebridade, dada a assídua presença no rádio, em jornal e na TV. O impulso na popularidade veio principalmente da coluna diária Careca de saber, que estreou em outubro de 2016 na Bandnews, na qual aborda temas relacionados a religião, filosofia, história, política, ética e comportamento. Ele lança um livro que questiona a visão do brasileiro como pacífico e cordial. Em Todos contra nós, afirma que o ódio é um dos espelhos mais poderosos para olharmos nosso rosto e que a maldade é tão próxima do ódio quanto da inveja.

Em tempos de disputa entre “coxinhas” e “petralhas”, afirma que há tempos percebia um desequilíbrio no nosso termômetro político. Para ele, há pouca avaliação de ideias e pouca escuta. O que predomina é o insulto, a agressão e a classificação. “Não se trata apenas de polarização, como já experimentamos em 1935/37, em 1961/1964 e agora. Existe algo mais grave, que é a blindagem em relação ao outro. Há um furor classificatório e o caráter raso do debate. Acho que está na hora de restaurar não a isenção, que nunca existe ou existiu, mas a capacidade de conversar”, defende. “Escrevi para que tenhamos consciência de que o fim do debate é o fim da democracia e que temos pontos em comum a levantar. Não existe projeto único”.

O historiador acrescenta que o esgotamento de modelos levou a um certo niilismo, falta de utopias possíveis, e fez crescer o viés narcísico dos debatedores. "Somos atraídos por nós mesmos e pela sedução permanente do som da nossa voz falada ou escrita. Elogiamos aos outros dizendo que ‘nos representam’, ou seja, parecem comigo. O mundo líquido da internet é de narcisos que trabalham com a duplicidade: fechados sobre si e infensos ao mundo e, paralelamente, dependentes de likes e da opinião média. É um jogo dialético curioso: quero e repudio opiniões, faço minha exposição ao mundo e reajo mal a interferências na minha soberania", frisa.

Karnal não acredita que com as redes sociais o ódio do brasileiro se exacerbou. Para ele, isso sempre existiu. Defende que agora muito mais gente virou ou se acha protagonista e passou a não trabalhar com a hipótese de que, provavelmente, o protagonismo que as redes criam é fótons, de vento eletrônico. "Leve-se em conta a hipótese: será que estamos dando muitas opiniões a todo instante porque ela não possui mais relevância? Seria minha opinião rápida em grupos uma prova da minha irrelevância?".

Ele profetiza um cansaço do debate, mas não sem pessimismo. O fim da verborragia, diz, não fará emergir o bom senso e o equilíbrio, mas a apatia e a exaustão da gramática política. "E isso é ótimo para a emersão de sistemas autoritários. O cansaço da política é perigoso. A maioria dos brasileiros, porém, continua levando sua vida sem nenhuma preocupação com o universo político, mantendo a luta diária pela sobrevivência e sem se contaminar pelo alarido das redes. Isso é ruim, pois há pouca percepção de que o preço da gasolina é decisão política. Falta a descoberta do sentido da vida na pólis, a política na forma original, da gestão do bem público e de que o preço da liberdade é a vigilância. Meu otimismo é um desejo, um farol, uma luz que projeto a partir da minha esperança. Meu pessimismo é minha realidade atual da percepção de tudo”, resume.

Diálogos
Leandro Karnal lançou no começo de agosto mais uma publicação. Diálogos de culturas (Editora Contexto). O volume reúne crônicas publicadas pelo autor desde julho de 2016 no jornal O Estado de S. Paulo, versando sobre suas preocupações mais frequentes: tolerância, autoconhecimento, história e combate ao preconceito. Alguns textos foram adaptados ao formato mais perene do livro e outros, atualizados. Diálogos de culturas tem 192 páginas e seu preço médio é de R$ 35.
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