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A nova tributação do consumo no Brasil

Ricardo Alexandre de Almeida
Procurador-Geral do Ministério Público de Contas de Pernambuco e autor do recém lançado "Reforma Tributária: a nova tributação constitucional no Brasil"

Publicado em: 26/03/2024 03:00 Atualizado em: 26/03/2024 07:41

Temos uma reforma tributária. Não é a reforma ideal, algo impossível quando sentam à mesa de negociação Estados mais industrializados, Estados menos industrializados e representantes dos contribuintes. O que conseguimos foi a reforma fruto da arte do possível, mas que pode, sim, trazer uma certa paz ao contribuinte e para a convivência federativa. Nossa tributação do consumo, se não passa a merecer “nota dez”, sai de um vergonhoso cinco para um aceitável sete.

Os especialistas defendiam um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) federal, com alíquota única e arrecadação dividida entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Não deu. Os entes menores não aceitariam ficar sem um IVA para chamar de seu. Adotou-se, então, um modelo de IVA dual, composto pela federal Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS) e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de inédita “competência compartilhada” entre os entes menores.

Na prática, a dualidade não será transtorno para o contribuinte, que fará apuração única da base de cálculo e aplicará as alíquotas dos dois tributos, sem maiores dificuldades. No entanto, até 2033, quando serão extintos o ICMS e o ISS, o manicômio fiscal estará efervescente, pois esses dois impostos conviverão com os novos, gerando um grau de complexidade jamais enfrentado pelo brasileiro.

A paz só invadirá os escritórios de contabilidade a partir de 2033, quando a transição entre os tributos estará completa. Mas o sono tranquilo vai depender das leis que instituirão IBS, CBS e definirão suas alíquotas … especula-se que a soma poderá chegar a 29%. Esse percentual assombroso também valerá para os prestadores de serviços, que estavam acostumados a pagar quatro vezes menos de ISS do que o comerciante paga de ICMS. Agora estarão todos suportando a mesma carga.

E tem mais. Para quem quer aguardar os próximos capítulos degustando um bom vinho ou tragando um desaconselhável cigarrinho, que o faça logo, pois vem aí o “imposto do pecado”, que vai taxar pesadamente produtos considerados nocivos à saúde ou ao meio ambiente.

Pensa que acabou? Finalmente os proprietários de jatinhos, helicópteros e iates passarão a, da mesma forma que o motoboy, pagar IPVA sobre seus veículos; quem receber heranças e doações pagará tanto alíquotas maiores do imposto de transmissão quanto maiores forem os valores recebidos; os prefeitos vão poder reajustar o IPTU por decreto e você, que já pagava uma contribuição de iluminação pública, vai ter que pagar mais, porque agora ela também vai custear sistemas eletrônicos de monitoramento das ruas. E que o pulso ainda pulse!

Desejamos que o legislador seja criterioso na hora de elaborar as leis regulamentadoras da reforma, sendo iluminado pela ideia de que a carga tributária é definida pelo tamanho que se deseja para o Estado. E que respeite dois princípios expressamente citados no texto da reforma: a justiça fiscal, o primeiro passo para a justiça social, exigindo que cada  pessoa contribua para o bem comum na medida de sua capacidade; e a transparência fiscal, garantidora de que todos estejam cientes do quanto contribuíram, gerando o legítimo desejo de cobrar a boa aplicação do que se arrecadou.

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