Cinema Rixa com manguebeat e cenas inéditas dos metaleiros em Pernambuco marcam filme Pesado Documentário sobre o metal pernambucano traz registros históricos e aponta caminhos para o rock

Por: Alef Pontes

Publicado em: 14/10/2017 10:00 Atualizado em: 16/10/2017 18:26

Registros raros narram a estreia de Andreas Kisser nas guitarras do Sepultura durante show em Caruaru. Foto: Pesado/Divulgação
Registros raros narram a estreia de Andreas Kisser nas guitarras do Sepultura durante show em Caruaru. Foto: Pesado/Divulgação

"Nadar contra a maré”. Esse é o sentimento coletivo que une headbangers, punks e demais fãs da música pesada numa terra tradicionalmente conhecida pelos "caranguejos com cérebro", frevos, maracatus, caboclinhos e afoxés. A evolução de uma rica movimentação do rock e as muitas variantes na terra exportadora do "maior carnaval" e do "melhor São João" do mundo é a temática abordada no filme Pesado: Que som é esse que vem de Pernambuco?, que estreia neste sábado, às 14h, no Cinema do Museu, no último dia da Mostra Play the Movie, ramificação do festival No Ar Coquetel Molotov, com ingressos a R$ 2.

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Reverberação do livro e programa de rádio homônimos, com direção de Leo Crivellare, Pesado acompanha, durante cem minutos, os passos do jornalista e músico Wilfred Gadêlha, responsável pelo roteiro do filme, em busca dos representantes da cena metaleira em diversas partes do estado. "Eu não queria que acabasse se tornando um filme nostálgico, mas que traçasse um paralelo entre esses relatos, a atualidade e os possíveis futuros caminhos para os músicos daqui", conta Wilfred.

São relatos como o do produtor cultural Paulo André Pires, que revela ter tido medo de escalar a Devotos [do Ódio, à época] para a programação da edição inaugural do festival Abril Pro Rock, em 1993, apesar de já reconhecer o grupo como uma das grandes promessas da música pernambucana. "O público das bandas de metal e punk tinham fama de quebrar tudo nas apresentações e eu não queria trazer essa atmosfera para a primeira edição", diz. A participação da banda ocorreu no ano seguinte, dividindo a noite com bandas como a Chico Science & Nação Zumbi, abrindo espaço para que o festival viesse a se consolidar, ainda nos anos 1990, como o maior ponto de encontro dos "camisas pretas" no Norte/Nordeste do país.

Lugares históricos como a extinta loja de discos Mausoleum, o Beco da Fome e a escadaria do Cinema Veneza, antigos redutos da cultura marginalizada no centro da capital, que reunia as turmas do metal, punk, rap, reggae e do skate para trocar discos, fanzines, promover a divulgação de eventos e bandas, são lembrados como importantes pontos de disseminação de uma cultura que sempre passou às margens dos mecanismos tradicionais de veiculação.

Há depoimentos de personagens como o falecido agitador cultural Humberto Brito, colecionador e comerciante responsável pela divulgação dos discos de bandas nacionais e internacionais, raras no Recife dos anos 1980 e 1990, e do caruaruense Moisés Discos, difusor da cultura headbanger no Agreste. Foi em Caruaru, inclusive, que se deu um dos momentos mais marcantes da história do rock em Pernambuco, quando a banda Sepultura, dos irmãos Max e Iggor Cavalera, realizaram a primeira apresentação no estado, em 1987, arrastando uma verdadeira legião de fãs para ver a estreia de Andreas Kisser nas guitarras do grupo. Momento resgatado através do depoimento de quem esteve lá, de fotos raras dos bastidores e de entrevista com o produtor do evento, o hoje deputado federal Wolney de Queiroz, que, curiosamente, tinha apenas 13 anos de idade na época.

A eterna rivalidade entre mangueboys e metaleiros também é abordada em Pesado através de opiniões nem sempre concordantes. Com a explosão do movimento mangue, no início da década de 1990, muitos headbangers mais "radicais" rechaçaram a fusão das guitarras com tambores ancestrais por acreditar que Chico Science e sua turma estariam ofuscando a crescente cena metaleira, dando origem a uma polêmica até hoje discutida nas rodas do gênero. Opinião quebrada, por exemplo, pelo trabalho da Cangaço - representante de uma geração mais nova do metal pernambucano, que leva referências regionais para o palco -, tratada quase como unanimidade de uma insuspeita proximidade entre os movimentos de contracultura.

Segundo Wilfred, mais de 70 pessoas foram entrevistadas entre abril e novembro do ano passado, em sete cidades pernambucanas, provocando um verdadeiro desafio na hora da montagem do projeto. "Muitas histórias ficaram de fora do livro, relatos importantes e imagens raras de momentos marcantes da música pesada em Pernambuco", diz. "Se, por um lado, há uma limitação de tempo no audiovisual, por outro, há a possibilidade de explorar essas histórias de outras maneiras que não sejam necessariamente pelas entrevistas", observa.

E aí está um dos trunfos de Pesado, além da trilha que resgata faixas inéditas e registros raros de fitas demos de bandas como Herdeiros de Lúcifer, Fire Worshipers, Arame Farpado e Necrópsia: a direção de arte apresenta excelente apanhado desse movimento através de recortes de jornais, capas de discos, cópias de fanzines e fotografias que dão conta, assim como da música, da vida social que gira em torno dos encontros dos metaleiros. "Pesado é sobretudo história de amor. Amor à música, à rebeldia, à amizade e à liberdade de expressão", afirma o diretor Leo Crivellare.

Assista ao teaser do filme:




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