![Prefeitura discutiu minuta em audiência pública (Marília Parente/DP Foto) Prefeitura discutiu minuta em audiência pública (Marília Parente/DP Foto)]() |
Prefeitura discutiu minuta em audiência pública (Marília Parente/DP Foto) |
Na tarde desta terça-feira (8), a Prefeitura do Recife promoveu uma audiência pública para discutir as mudanças nas leis de Uso e Ocupação do Solo, de 1996, e de Parcelamento no Solo, que vigora desde 1997. Na nova legislação, a gestão municipal aposta em dispositivos para atrair construções subsidiadas pelo Minha Casa, Minha Vida no centro. Diante da criação de uma nova faixa do programa, que contemplará beneficiários com renda de até R$ 12 mil, especialistas temem que pessoas de baixa renda sigam morando longe das áreas centrais da cidade.
De acordo com o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Licenciamento, Felipe Matos, entre os anos de 2010 e 2022, o Recife perdeu quase 48 mil moradores. A tese da prefeitura é a de que a baixa oferta de moradia financiada com recursos de programas habitacionais na cidade, estimulou a saída dessas pessoas para municípios vizinhos. “A gente verifica que o que tem acontecido é que essas pessoas têm buscado outras cidades da Região Metropolitana. E, na Região Metropolitana inteira, somente quem perdeu população foram Recife, Olinda e Moreno, enquanto todos os outros 11 municípios cresceram”, disse Matos.
Para o secretário, o aumento de poder aquisitivo desses ex-moradores teria motivado a saída deles da cidade. “Então, o que a gente tem é um movimento de pessoas que estão na baixa renda ou na pobreza que crescem de renda e são obrigadas a sair do Recife. E aí, quando a gente analisa o que tem acontecido nessas outras cidades, é uma proliferação de conjuntos Minha Casa, Minha Vida. O que, na prática, indica o seguinte: há, no Brasil, um programa de aquisição e habitação voltado à baixa renda, mas ele não funcionou no Recife”, acrescentou.
Com o objetivo de estimular a construção de habitações de interesse social no Centro, a nova legislação inclui uma política de retrofit, isto é, uma permuta entre poder público e setor privado, em que a área revitalizada por empreendedores, inclusive para finalidade habitacional, seja recompensada com potencial construtivo em outras áreas da cidade. Na prática, a proposta sugere que, a cada 1m² revitalizado para interesse social, sejam cedidos 2m² de potencial construtivo em outras áreas da cidade, como o bairro de Boa Viagem.
Questionamentos
A associação estabelecida pela prefeitura entre a perda de moradores e os programas de habitação foi questionada por especialistas como Iana Ludermir Bernardino, professora de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “Não é uma relação de causa e efeito. Se a gente tem um déficit habitacional com ônus excessivo com aluguel, esse problema não se resolve imediatamente quando a gente constrói um Minha Casa, Minha Vida”, afirmou.
Para a professora, os altos preços de aluguel praticados na cidade estão relacionados ao custo elevado dos lotes. “A dificuldade de morar no Recife é decorrente do alto preço cobrado nos nos grandes terrenos, que impede que o Minha casa, Minha Vida seja construído aqui. Você lê essa lei inteira e não encontra como é que a gente vai reverter essa prática da especulação imobiliária”, destacou.
O perfil de moradia que pode se estabelecer no centro da cidade também foi alvo de questionamentos. “O que chama atenção é a questão do retrofit que não vai para a população mais vulnerável, mas novamente para essa faixa de renda de R$ 1,5 mil a R$ 12 mil. Então, sempre ela não é adequada para moradia para as pessoas mais vulneráveis da nossa cidade que sofrem com o déficit habitacional”, comentou a representante do Centro Dom Hélder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec), Cristinalva Lemos.
Em entrevista ao Diario de Pernambuco, Nathan Nigro, que tem representado o Instituto dos Arquitetos do Brasil em Pernambuco (IAB-PE) em boa parte dos debates com a prefeitura, reforçou a preocupação da instituição com a permanência de um modelo de cidade em que a classe trabalhadora vive distante das áreas centrais da cidade, precisando inclusive se deslocar por longas distâncias diariamente para trabalhar.
“Eu acho que é positivo ocupar o centro, mas você precisa ter instrumentos muito claros e formas de viabilizar a habitação social. Não adianta estimular o mercado imobiliário no centro e manter a população de baixa renda nas periferias, pois os problemas da cidade, como os engarrafamentos, continuam”, ressalta.
Mercado
Procurado pela reportagem, o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Pernambuco (Sinduscon), Antônio Cláudio Couto, disse que recebeu com otimismo a notícia da ampliação do público do Minha Casa, Minha Vida. Ele garante que o setor tem interesse em atuar na revitalização de imóveis no Centro do Recife a partir da proposta de permuta presente na minuta.
“É um grande estímulo. Com essa abertura, é criada a possibilidade dos empresários construírem muitas unidades dentro desse programa, o que vai trazer exatamente a condição melhor de valor de uma prestação para as pessoas que hoje estão pagando aluguéis caros”, frisa.