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Mãe, irmão, Covid

Leonardo Accioly
Filho e irmão

Publicado em: 14/07/2021 03:00 Atualizado em: 14/07/2021 05:40

Enxugadas as lágrimas, e premido à inexorável vida cotidiana, posso, com mais tranquilidade, falar um pouco de tudo o que aconteceu.

Nascidos com um dia de diferença, em anos bem distantes, meu irmão e minha mãe partiram com um intervalo de exatas 4 horas. Ele primeiro, ela depois. Como bom cético, acredito em coincidências, mas resisto imensamente em crer que esta seja mais uma de tantas que acontecem na vida.

Existia uma ligação muito forte entre os dois. Algo meio inexplicável entre duas pessoas tão diferentes. Minha mãe, a vida toda, teve pelo meu irmão um sentimento protetivo que nunca dispensou a mim. Não falo isso com sentimento de inveja ou rancor, mas apenas uma constatação de que, a despeito de amar em pé de igualdade, ela sempre soube da necessidade de amparar aquele que necessitou de mais atenção. Acho que por isso partiram juntos.

Após longos e torturantes 42 dias, a Covid e a irresponsabilidade do Estado Brasileiro os levaram de mim e do meu pai, e quanto a  este fato não há mais o que fazer.

Mas isso não me impede de ter claro em minha mente a relação de causa e efeito entre estas mortes e tantas outras no Brasil, com a irresponsabilidade e sadicidade daquele que promoveu a negação da ciência e, com isso, impediu que fossem, ao menos, minorados os graves efeitos da pandemia.

Contra fatos não há argumentos. Vários países que tiveram os processos acelerados de vacinação e medidas eficazes de distanciamento social, hoje comemoram a queda vertiginosa dos infectados e mortos. Já começam a permitir a volta de eventos presenciais e a economia se recupera a passos largos.

Já nós, continuamos a chorar e lamentar por nossos mortos. Não é “mimimi”, senhor presidente. É dor real, concreta e palpável, embora não quantificável pela sua imensidão. Não é uma gripezinha, senhor presidente. É uma doença que mata e causa imenso suplício a tantos e tantos brasileiros.

Não somos covardes, senhor presidente. Faremos sim de nossa dor um protesto, que certamente ecoará no coração e mente de outros brasileiros, que dirão, em breve, um rotundo não ao obscurantismo, à falta de humanidade e à violência que o senhor promove.

Mãe e irmão, descansem em paz. Qualquer dia a gente se vê.

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