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Por uma cidade que saiba das coisas

Rodrigo Pellegrino de Azevedo
Advogado

Publicado em: 08/02/2020 03:00 Atualizado em: 08/02/2020 08:22

Esse mês de janeiro deve ter servido de alerta aos gestores municipais, organizações da sociedade civil e cidadãos para o risco ao qual as pessoas viventes em cidades estarão sujeitas; as catástrofes decorrentes de megaeventos naturais.

Fiquei estarrecido com as imagens da cidade de Belo Horizonte. O pior é que observo pouca inquietação da sociedade, o que suscita em mim duas reflexões: imaginam que isso nunca poderia ocorrer na sua cidade ou vivem num estado permanente de alienação.

O fato é que, absolutamente, a maioria das cidades brasileiras não estão preparadas para esses tipos de ocorrências, o resto é retórica política para justificar o injustificável. Minha geração, ao que me consta, passou por coisas do tipo, com os fenômenos das enchentes no Recife, mitigados com a construção de barragens.

Entretanto, de lá para cá, as cidades mudaram, os políticos mudaram, as pessoas mudaram e nossa infraestrutura urbana permaneceu a mesma. O fato é que, segundo algumas estatísticas, 1,3 milhão de pessoas passam a viver nas cidades em geral a cada semana e, até 2040, 65% da população mundial viverão em cidades e não no campo.

As pessoas que moram em cidades precisam se locomover, trabalhar, morar e se encontrar. O fato é que num mundo altamente rápido e fluido, com transformações digitais disruptivas, acossado por eventos climáticos cada vez mais importantes, não podemos engessar a forma de gerir uma cidade, com “planos diretores” que não dialogam com a velocidade através da qual as coisas caminham.

Existe uma agenda global voltada para identificação de soluções inteligentes para cidades inteligentes (Smart Cities). Essa agenda está consolidada em diversos países e cidades, são uma oportunidade para que as grandes mazelas que ainda rondam os grandes centros urbanos possam, através de um compartilhamento efetivo de dados, iniciativas e inovação, tornar as cidades melhores para todos.

Para tanto existem seis grandes categorias que devem ser objeto de políticas voltadas para a transformação das cidades: infraestrutura, edifícios, serviços públicos, transporte, meio ambiente e governança.

Em relação à governança, não dá mais para termos uma gestão engessada e pouco permeável aos dados e às informações que diariamente são gerados nas cidades. A falta disso gera o caos diário no trânsito, no ir e vir das pessoas, na segurança, nos custos. É preciso que a gestão pública tenha efetivos dados abertos e possíveis de captura para que as universidades, os empresários, os cidadãos e as pessoas possam interagir com eles e encontrar soluções efetivas para o caos que vivemos.

Além dos dados abertos, devemos ter opções de tecnologia, engajamento dos munícipes e espaços nos quais a análise dos problemas possa implicar em soluções efetivas. E as soluções, não pensem, estão somente com a tecnologia digital. Um exemplo simples posso referir é o aeroporto de Munique, construído sem ar-condicionado. A inovação arquitetônica faz com que ele não esquente no verão e não faça frio no inverno.

O fato é que, somos um povo ainda pouco engajado e diligente para com os espaços públicos, sempre aguardamos de dois em dois anos a chegada do novo “Sebastião” da ocasião. O perfil do novo gestor para as cidades terá que ser alguém aberto ao diálogo, aos dados, com capacidade de engajamento das pessoas e com o olhar para a transformação inovadora.

Lembro que inovação já foi, e efetivamente sim, isso era inovação, colocar luz onde ninguém tinha acesso à energia, empreendimento ousado no último quarto do século passado, levado em efetividade por Miguel Arraes, e na época isso era o óbvio, como uma pessoa poderia se inserir no mundo moderno se não tinha acesso à energia elétrica?

Hoje, temos condições de cada um ser um consumidor e gerador de energia, por que não? E lanço uma reflexão, que não é minha, mas ouvida numa palestra do professor Fabiano Passuelo Hessel, utilizando a alegoria dos postes de energia. “é tão simples, temos que pensar em inovação para as cidades a partir dos postes de energia, 22 metros de altura desperdiçados com uma única utilidade, acender e apagar, vejam que desperdício.”

Nossos postes podem ser uma fonte inesgotável de serviços, de obtenção e geração de dados, e de soluções para o trânsito, segurança, geração de energia e predição de acidentes. Precisamos de uma cidade que saiba das coisas e de “Smart Managers”.

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