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Teoria do Medalhão

Francisco Dacal
Administrador de empresas e escritor

Publicado em: 10/01/2020 03:00 Atualizado em: 10/01/2020 08:38

Em homenagem ao Dia do Leitor, comemorado no Brasil em 7 de janeiro, vamos falar um pouco, caríssimo, do escritor Joaquim Maria Machado de Assis, também um grande leitor, cujo nome está no patamar mais alto da literatura brasileira, para muitos dos nossos intelectuais, críticos e leitores, principalmente. Com uma vasta obra, Machado transitou por todos os gêneros literários, e, no labirinto da escrita, foi um primoroso observador da sociedade da época em que viveu, durante o Império e nos primórdios da República, na cidade do Rio de Janeiro, a capital, ainda sem o Bondinho, o Copacabana Palace e o Cristo Redentor.

Dentre as influências que Machado recebeu, a cervantina é a mais distinta, certamente. Demonstram os livros Memórias Póstumas de Brás Cubas, O Alienista e Quincas Borba, bem como alguns poemas, contos e crônicas. O escritor mexicano Carlos Fuentes, um de seus importantes admiradores, no ensaio Machado de la Mancha afirma ser o autor de Dom Casmurro o maior novelista ibero-americano do século 19, “...O milagroso, um adiantado no universo da imaginação e da ironia, da mestiçagem e do contágio, em um mundo ameaçado cada dia mais pelos verdugos do racismo, da xenofobia, do fundamentalismo religioso e de outro implacável fundamentalismo: o do mercado.”

Quanto aos aspectos do tino observador e as sutilezas da escrita machadiana, apesar de pouco conhecido, mas, alinhado a este assunto e vigente, considerando o moderno comportamento social (em tempos de influencer), podem ser vistos no conto Teoria do Medalhão, publicado inicialmente em jornal e depois no livro Papéis Avulsos. Nele, o autor carioca narra às orientações dadas pelo pai ao filho, logo após a festa de aniversário de 21 anos deste, visando facilitar-lhe a conquista de um futuro de sucesso superior ao normal, se é que isso pode acontecer assim. Diz, entre outras coisas: ”Podes entrar no parlamento, na magistratura, na imprensa, na lavoura, na indústria, no comércio, nas letras ou nas artes. Há infinitas carreiras diante de ti. Nenhuma me parece mais útil que o ofício de medalhão.” As dicas, paterna, até no sentido de se fazer uso de propaganda enganosa, limitando as possíveis qualificações do filho e o ímpeto da natural evolução, é para que o querido rebento tenha como prioridade a conquista da riqueza, de posição social e fama, ou seja, torne-se um medalhão – uma ironia, considerando o significado da palavra: figura importante e que se destaca muito mais do que o necessário, às vezes sem merecer. Enfim, seguindo o filho as recomendações feitas pelo pai, por exemplo, entre os possíveis benefícios, pode vir a ocupar um cargo de destaque, sem preencher os requisitos, uma posição irreal, ou se tornar uma figura indispensável em festas, pelo adorno projetado. 

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