Frei Rinaldo Santos Entrevista: 'A maior parte (dos bens religiosos de influência portuguesa) está comprometida' O presidente da Comissão Arquidiocesana de Pastoral para Cultura da Arquidiocese de Olinda e Recife conversou com o Diario sobre a situação das igrejas no Recife e em Olinda

Por: Alice de Souza - Diario de Pernambuco

Publicado em: 06/05/2017 10:10 Atualizado em: 05/05/2017 20:24

Para Frei Rinaldo Santos, a situação atual dos templos de influência lusitana é crítica. Foto: Julio Jacobina/DP.
Para Frei Rinaldo Santos, a situação atual dos templos de influência lusitana é crítica. Foto: Julio Jacobina/DP.

Como a Igreja Católica tem se mobilizado para preservar os bens histórios religiosos de influência portuguesa no Recife e em Olinda?
Na Arquidiocese (de Olinda e Recife) existe uma comissão de restauro encarregada justamente de apresentar projetos para algumas igrejas nossas, que estão em situação extremamente caótica. Essa comissão trabalha intensamente em parceria com órgãos públicos, responsáveis por esse mesmo caminho. Existe também uma comissão de cultura, para fomentar e juntar coisas espalhadas, enquanto a comissão de restauro foca na necessidade de intervenção, sobretudo, da intervenção na edicação. Nós, da comissão de cultura, estamos realizando um inventário do acervo da maioria dessas igrejas históricas. Tem sido um trabalho muito bonito, que começou em 2015 e já nos deu bons números. É um inventário doméstico, diferente do realizado pelo Iphan, já que não teríamos pessoal para isso. Basicamente fotografamos as peças, identificamos e procuramos levantar um breve histórico e dizer onde ela está. Isso tem nos ajudado muito, inclusive para conhecer o acervo que temos. Esse inventário também nos dará uma grande segurança, já que há muitas igrejas que não são tombadas a nível federal. É uma forma de salvaguardar. Também foi feito um estudo em busca do laudo diagnóstico dos telhados das principais igrejas, com o contrato de uma empresa de drones. Começou em 2016 e estamos na fase final. Além disso, existem as iniciativas próprias de cada padre ou da comunidade responsável pela igreja, para resolver desde goteira a acessibilidade.

Qual é a situação desse patrimônio?
Esse acervo, em sua maioria, está bastante comprometido. A estrurura das edificações precisa de intervenção. Descobrimos que parte do telhado da Madre de Deus já havia cedido. Estamos andando com o restauro dele. Nem temos ideia do custo todo, mas estamos em campanha para levar isso adiante. Temos um coisa que é triste, doi na alma, que é a Igreja de São José. Ali, o combinado é de que, dentre as contrapartidas exigidas pela prefeitura ao Consórcio Novo Recife, estava o restauro da Igreja Matriz. Então, praticamente a Igreja está esperando que isso saia do papel para dar sequência ao restauro. Lá, o telhado já caiu. E está se deteriorando cada vez mais. Estamos com o Seminário de Olinda interditado. A Igreja do Bonfim de Olinda também. Essa inclusive só não começou o restauro por questões burocráticas. Ela será restaurada com recursos do PAC. Isso já chegou, mas, por questões burocráticas, não está sendo feita. Ao mesmo tempo, a Igreja de Santo Antônio, no Centro do Recife, e Conceição dos Militares estão em obras. A Igreja de São Pedro dos Clérigos também estava em obras e houve uma crise entre o Iphan e a empresa que estava atuando no serviço. Antes de terminado o trabalho, o Iphan à época (não com a atual superintendência) nos devolveu a igreja sem terminar o trabalho. Sem banheiros e limpeza. A gente tinha um projeto de abrir em junho, mas não sei se conseguiremos. Vai depender da aprovação dos projetos. Estamos na fase de cotação de orçamentos. Temos lutado muito para conseguir o processo de limpeza e já conseguimos fazer o banheiro. Fizemos recentemente uma intervenção no telhado da Igreja do Livramento e uma pequena intervenção na Igreja do Rosário dos Pretos de Olinda. Além da edificação, há o acervo. E o acervo doi também na alma. Temos percebido a urgência também do restauro dos bens móveis e integrados. E isso só se consegue com projeto. De forma autônoma, carreira solo, não conseguiremos resolver de jeito nenhum.

Quais os desafios enfrentados pela igreja no processo de manutenção desse patrimônio?
É uma força-tarefa grande e os recursos são poucos. São monumentos grandes e, quanto a gente fala de telhados, são vários níveis. Então a manutenção de um monumento assim é quase impraticável de fazer sozinho, sem o apoio do poder público e também da sociedade civil, dos fiéis. A Igreja não está de braços cruzados diante dessa realidade, pelo contrário. Isso nos faz sofrer, nós temos buscado parcerias. No caso do Seminário de Olinda, o arcebispo pessoalmente tem se empenhado na luta pelo restauro. Sou diretor do Museu de Arte Sacra de Pernambuco. O museu só existe por conta de parceira com a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe). Seria impossível a arquidiocese manter. Estamos com um projeto de revitalização e requalificação do museu, enviado e escrito pela Lei Rouanet. Estaria orçado em R$ 10 milhões. Há muito o que fazer. Temos uma riqueza grande aqui. Precisamos começar a pensar que virão os 500 anos do Recife. O que seria a cidade com tudo bem restaurado, pronto, daqui para lá? Nosso desafio não é somente o resrauto, mas também a sustentabilidade.

Como essa sustentabilidade poderia ser garantida?
Quantas igrejas nós temos aqui no Centro? Não temos fiéis para tanto, pois é um centro comercial. As pessoas que frequentam a missa da Madre de Deus, por exemplo, em sua maioria, vêm de fora. Ninguém mora aqui. Essa pouca frequência também resulta em pouco recurso para manutenção do prédio. Então, a descoberta de novas práticas de sustentabilidade é urgentíssima. Senão, a gente ficará no mesmo ciclo vicioso que existe ao longo de décadas: restaura-se um monumento, devolve-se ao proprietário (vale salientar que um bem tombado não tira a propriedade do seu dono) e ele não tem como manter. Dez anos depois, outro projeto de restauro vem e vai-se embora a verba pública, dinheiro do povo. Por isso, dentre as iniciativas de restauro do seminário está a possibilidade de parcerias que possam garantir a autossustentabilidade do monumento. Temos equipamentos com espaços privilegiadíssimos e que são pouco explorados. Precisamos dessa parceria pública e privada, de modo a potencializar esses espaços, com novas ideias. O que poderia ser feito para gerar renda e garantir a manutenção do prédio, pois com recursos doados pelos fiéis é impossível.

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