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Os EUA e o desejo de um papa conservador

Maurício Rands
Advogado, professor de Direito Constitucional da Unicap, PhD pela Universidade Oxford

Publicado em: 05/05/2025 03:00 Atualizado em: 04/05/2025 22:12

Dos EUA já vieram muitas coisas boas. A visão multilateralista do presidente Woodrow Wilson, que rompera com o isolacionismo tradicional do país para defender a cooperação internacional e um sistema de segurança coletiva baseado em ideais liberais de paz e democracia. As inovações tecnológicas e a universidade aberta. O regime de freios e contrapesos, com autonomia dos poderes da república. O incentivo ao livre comércio, com redução de barreiras comerciais e promoção da prosperidade econômica global. As ações afirmativas que empoderaram negros, mulheres, gays e trabalhadores nos anos 60. A abertura para receber refugiados políticos, mas também econômicos. O soft power do jazz, do rock, do cinema. Não mais. A julgar pelos 100 dias de abandono dessas virtudes, seria inapropriado afirmar que o MAGA é a exaltação do egoísmo e da falta de compaixão social? Paul Dans, o arquiteto do Projetto 2025 - a plataforma de Trump - argumenta que o sistema americano precisava ser desmantelado e reconstruído. O governo Trump teria método para cumprir o desafio. Trump seria uma ameaça não à democracia, mas à burocracia (The Economist, 3/5/25). Mas não seria mais pertinente afirmar que ele seria a afirmação da plutocracia?

Não bastassem essas inflexões que pioram a vida humana, dos EUA ainda vêm clamores para que o novo papa seja um conservador. Clérigos da Igreja Católica americana plantam nomes de “favoritos” à sucessão de Francisco. Para eles, o novo papa deveria fortalecer dogmas que têm afastado a Igreja dos desfavorecidos e discriminados. Querem o retorno de um estilo Beneditino de mais “substância na governança” da Igreja (Washington  Post, 1º/5/25). Nomes como os dos cardinais Raymond Burke, bispo de Wisconsin, Robert Sarah, de Guiné, Peter Turkson, de Gana, e Peter Erdo, da Hungria, parecem ter chances nos círculos católicos da ultradireita americana. Mesmo com as excentricidades de suas ortodoxias. A volta da missa em latim com o padre de costas para o público. A remoção da abertura para a comunidade LGBTQIA+ e para os divorciados. A reação à maior participação das mulheres na Igreja. O combate ao que seria uma “obsessão pela política”. Aspirações retrógradas que parecem condenadas às franjas do conclave. Agitadas pelos que apenas tentam intimidar os reformistas. Ainda bem que esssa não parece ser a tendência de um conclave que tem 80% dos cardeais nomeados pelo papa Francisco. Que, a partir de sua força moral, soube combinar a modernização com a preservação da tradição.

Nos assuntos terrenos, felizmente, o mundo parece estar se reposicionando diante da ascensão da política supremacista de Trump. Ao seu sonho de imposição unilateral do poder americano, outros países e regiões estão sabendo se rearticular. Econômica, financeira e politicamente. Outros percebem os benefícios do livre comércio, da ciência e do multilateralismo. Algo essencial. Pelo menos até que o próprio povo americano saia do seu torpor e volte a ser parte da comunidade global. Algo que pode estar em curso, como atestam algumas do poder judiáiro e e de universidades como Harvard. E mobilizações populares como as registradas em mais de mil eventos no dia 05/4/25. As últimas pesquisas apontam que apenas 42% aprovam o desempenho de Trump. Contra 53% que desaprovam. Sua gestão econômica é ainda mais reprovada (56% a 36%). Parecem em baixa tantos os desvarios dos católicos ultraconservadores como os daquele que já se vai encaminhando para ser o pior presidente da história dos Estados Unidos. Que esse fiasco de lá estimule reflexões por aqui. Daqui a um ano e meio estaremos elegendo um novo governo. Não podemos nos esquecer daquelas fotos de governadores de ultradireita que pousaram com boné do “Make America Great Again”. Saudosos seguidores do notório “Bob Fields”, que preconizava ser bom para o Brasil tudo que fosse bom para os EUA.

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