A inspiradora aglutinação sonora
Marcus Prado
Jornalista
Publicado em: 05/05/2025 03:00 Atualizado em: 04/05/2025 22:13
O Mercado de São José, na Praça Dom Vital (Recife), inspirado no mercado público de Grenelle (Paris), inaugurado há exatos 150 anos, tem no seu ambiente de maior circulação de usuários (peixaria) um detalhe que inspirou essa crônica, para a qual tive como referência as pesquisas de Theodor Adorno (1903-1969) e R. Murray Schafer (1933-2021).
Autores de importantes livros sobre música, estudaram o conceito de “paisagens e ambientes sonoros”. Na década de 1960 e 1970 Schafer chama de Paisagem Sonora o World Soundscape Project, iniciativa pioneira de pesquisa e conscientização sobre a paisagem e outros ambientes sonoros. Tinha como objetivo explorar e documentar a diversidade dos sons do mundo, desde os naturais até os produzidos pelo homem.
Segundo Schafer, citado por Elma Vilma Silva Ferreira (Universidade Federal do Maranhão), as transformações dos ambientes acústicos, principalmente dos centros urbanos, com o aparecimento de sons de máquinas de diferentes tipos, dão uma mostra do quanto as cidades foram ganhando de inquietante aglutinação sonora.
Uma surpreendente experiência auditiva se daria no Mercado de São José, nos boxes de venda de peixe. Ali, desde a hora em que o mercado abre as suas portas, até as 18 horas, ouve-se o som do martelo, são dezenas deles a um só tempo sobre a pele congelada do peixe que sai do frigorífico. Depois, é a martelada no tratamento e limpeza do produto sobre um balcão de madeira. De tanta batida de martelo a madeira vai aos poucos perdendo a sua forma, desenrijecendo-se. Um impacto auditivo, que se ouve o dia todo, pois a freguesia não para de chegar.
São tantos gestos aos martelos que lembram, bem comparando, a cena clássica do Chaplin operário de fábrica, saindo pelas ruas de uma cidade industrial dos EUA, depois do trabalho o dia inteiro, apertando sem parar os seus imaginários parafusos. Que lembram também Theodor Adorno, nas suas pesquisas sobre os sons, “até o silêncio, nos poemas sinfônicos”.
Segundo Schafer, os ambientes acústicos com o aparecimento de sons de máquinas de diferentes tipos, carros, motocicletas, aviões etc., dão uma mostra do quanto as cidades foram ganhando de ruídos sonoros. Para ele, no entanto, qualquer coisa que soe pode transformar-se em música e, dessa maneira, o simples bater de um martelo ou o tilintar de talheres durante um jantar pode se transformar numa obra musical, isto é, “se os sons forem organizados e intencionalmente utilizados”, explica Schafer.
Não foi outra a inspiração do genial Vila Lobos (1887-1959) na sinfonia Os pássaros da Floresta Amazônica – Canto III. Os cães que ladram à noite nos velhos quintais por causa do poder devorador da cidade (dizem que os cães odeiam o silêncio da madrugada), não duvido, serão tema para um solo de clarineta. O canto de milhares de pássaros no fim de tarde, na mata dos Brennand da Várzea (Recife), nos Jardins do Colégio Marista Nossa Senhora da Conceição, em Apipucos (Recife), nos jardins etnográficos da Fundação Joaquim Nabuco (Campus de Casa Forte), a algazarra o dia inteiro de ambulantes na Rua Direita (Recife) são grandes temas à espera de um inspirado compositor.
Autores de importantes livros sobre música, estudaram o conceito de “paisagens e ambientes sonoros”. Na década de 1960 e 1970 Schafer chama de Paisagem Sonora o World Soundscape Project, iniciativa pioneira de pesquisa e conscientização sobre a paisagem e outros ambientes sonoros. Tinha como objetivo explorar e documentar a diversidade dos sons do mundo, desde os naturais até os produzidos pelo homem.
Segundo Schafer, citado por Elma Vilma Silva Ferreira (Universidade Federal do Maranhão), as transformações dos ambientes acústicos, principalmente dos centros urbanos, com o aparecimento de sons de máquinas de diferentes tipos, dão uma mostra do quanto as cidades foram ganhando de inquietante aglutinação sonora.
Uma surpreendente experiência auditiva se daria no Mercado de São José, nos boxes de venda de peixe. Ali, desde a hora em que o mercado abre as suas portas, até as 18 horas, ouve-se o som do martelo, são dezenas deles a um só tempo sobre a pele congelada do peixe que sai do frigorífico. Depois, é a martelada no tratamento e limpeza do produto sobre um balcão de madeira. De tanta batida de martelo a madeira vai aos poucos perdendo a sua forma, desenrijecendo-se. Um impacto auditivo, que se ouve o dia todo, pois a freguesia não para de chegar.
São tantos gestos aos martelos que lembram, bem comparando, a cena clássica do Chaplin operário de fábrica, saindo pelas ruas de uma cidade industrial dos EUA, depois do trabalho o dia inteiro, apertando sem parar os seus imaginários parafusos. Que lembram também Theodor Adorno, nas suas pesquisas sobre os sons, “até o silêncio, nos poemas sinfônicos”.
Segundo Schafer, os ambientes acústicos com o aparecimento de sons de máquinas de diferentes tipos, carros, motocicletas, aviões etc., dão uma mostra do quanto as cidades foram ganhando de ruídos sonoros. Para ele, no entanto, qualquer coisa que soe pode transformar-se em música e, dessa maneira, o simples bater de um martelo ou o tilintar de talheres durante um jantar pode se transformar numa obra musical, isto é, “se os sons forem organizados e intencionalmente utilizados”, explica Schafer.
Não foi outra a inspiração do genial Vila Lobos (1887-1959) na sinfonia Os pássaros da Floresta Amazônica – Canto III. Os cães que ladram à noite nos velhos quintais por causa do poder devorador da cidade (dizem que os cães odeiam o silêncio da madrugada), não duvido, serão tema para um solo de clarineta. O canto de milhares de pássaros no fim de tarde, na mata dos Brennand da Várzea (Recife), nos Jardins do Colégio Marista Nossa Senhora da Conceição, em Apipucos (Recife), nos jardins etnográficos da Fundação Joaquim Nabuco (Campus de Casa Forte), a algazarra o dia inteiro de ambulantes na Rua Direita (Recife) são grandes temas à espera de um inspirado compositor.
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