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Lições do novo coronavírus

Dom Fernando Saburido
opiniao.pe@diariodepernambuco.com.br

Publicado em: 21/03/2020 03:00 Atualizado em: 21/03/2020 07:13

“Sentinela, em que ponto está a noite? Sentinela, em que ponto está a noite? A luz brilhará nas trevas e esta noite resplandecerá como o dia”
(antiga antífona oriental cantada no Sábado Santo, antes da Vigília Pascal ).
 
Meus muito amados filhos e filhas da nossa arquidiocese,

Da quarentena em que me encontro, por fazer parte do grupo de risco, vos escrevo com o coração dilacerado pelo sofrimento que estamos passando. As palavras acima, inspiradas na profecia de Isaías 21,11-12, parecem bem apropriadas para esse tempo que vivemos. Em que ponto está a noite? No momento, ninguém tem essa resposta. Tudo é imprevisível, como são imprevisíveis os nossos dias. O coronavírus (Covid-19) está provocando uma crise que ninguém esperava e para a qual o mundo não estava preparado.

A ordem pública é a de evitar reuniões e cada um se isolar, por tempo indeterminado, até que o surto maior de contaminação se detenha. Sem dúvida, quem mais sofre como sempre são as pessoas mais pobres. Penso, especialmente, nos sem-teto que vivem nas ruas das grandes cidades, os biscateiros e ambulantes que, em uma hora como essa, não têm como se defender e sobreviver.

É nesse contexto que como irmão e pastor, me dirijo a todos vocês. Nossa quaresma este ano está sendo muito especial e nunca uma Campanha da Fraternidade foi tão expressiva como a deste ano de 2020 ao nos aconselhar a viver a experiência do Bom Samaritano e dando como modelo a nossa querida Santa Dulce dos Pobres: “Viu, teve compaixão e cuidou dele” (Lc.10,33-34). Sei que em uma guerra mundial, sobretudo a que vivemos contra um inimigo invisível, a tendência natural é cada um buscar defender a si próprio e os seus. Lembremo-nos, porém, que não podemos deixar de praticar o Evangelho que nos ensina: “Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei” (Jo, 15,12).  Jesus nos amou dando sua vida por todos. E nós?

Que tudo isso nos sirva para nos recordar que a vida é realmente transitória e somente em Deus está a nossa segurança. Ninguém caia na tentação de querer responsabilizar a Deus por tudo o que está acontecendo. Precisamos sim, bater no peito e fazer um “mea culpa” entendendo que os pecados da humanidade contra a vida, humana, a vida animal e, sobretudo, contra a natureza, frutos do egoísmo e da ambição desenfreada, provocam reações naturais desta ordem, como já vimos acompanhando, cada vez mais frequentemente. Não precisa ser profeta para assegurar que, se nada for feito, o problema não vai parar por aí.

Que tudo isso sirva para a nossa conversão. Certamente, passada essa fase difícil, vamos valorizar mais a Eucaristia de que estamos sendo privados, a nossa convivência fraterna na Igreja, na família, no mundo do trabalho e na sociedade como um todo. Vamos, sobretudo, valorizar mais a presença de Deus em nossas vidas e entender que somente Ele nos poderá oferecer a verdadeira segurança que nem a irmã morte, como chamava São Francisco, poderá tirar.

Coragem, vamos sair dessa! Façamos a nossa parte unindo-nos em oração confiante, pessoal ou comunitariamente. Com certeza, o Deus que libertou o povo de Israel da escravidão do Egito, do dilúvio e manifestou-se vitorioso guerreiro nas batalhas, vai ouvir as nossas preces e vir em nosso auxílio.

Deus abençoe e dê serenidade a todos e todas.

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