As epidemias no Brasil Holandês
Leonardo Dantas Silva
Escritor e historiador
Publicado em: 26/03/2020 03:00 Atualizado em: 25/03/2020 21:19
Nesses tempos da epidemia do coronavírus, vale uma reflexão sobre as condições sanitárias do Recife, por ocasião da Ocupação Holandesa - 1630-1654.
A partir de 1630, com a crescente busca por riquezas na Terra do Açúcar, vieram para Pernambuco homens, mulheres e crianças, originários dos mais diferentes portos, aproveitando-se das facilidades oferecidas pela Câmara de Amsterdã para quem desejasse se estabelecer no Brasil Holandês.
Segundo recenseamento realizado em fins de 1645 e nos começos de 1646, o qual não inclui e nem indica o efetivo das guarnições militares acantonadas no Recife, estimado em 1.169 soldados, estariam confinados no atual bairro portuário um total de 4.660 pessoas, “entre particulares, empregados da Companhia e escravos”.
Por essa época, viviam precariamente no Recife cerca de 8 mil habitantes, segundo estimativa do cronista do Journael, publicado em Arnhem no mês de junho de 1646.
Comenta o escritor Hermann Watjen, que “algumas dessas horríveis moradas eram verdadeiras pocilgas”.
A fim de abrigar tanta gente foram reconstruídos os armazéns do porto, incendiados por ocasião da invasão (1630), aproveitando-se os sótãos dos sobrados, alguns dos quais com até oito pavimentos. Eram acomodações destinadas a “caixeiros, auxiliares de escrita e serventes”, em número de três a oito deles em cada cômodo, sob um calor asfixiante, com suas camas coladas às outras, na maior das promiscuidades; segundo se depreende de cartas do Conselho do Recife, com datas de 31 de março e 20 de dezembro de 1641:
Se nós não abrigarmos essa gente em habitações coletivas, ela vai procurar alojamentos nas bodegas do porto, que são os bordéis mais vis do mundo. Ai! Do mancebo que ali cair: fica votada a irremissível perdição.
Diante de tamanha promiscuidade, não é de admirar que a vida na colônia tornou-se um verdadeiro inferno. A falta de alimentação adequada, sobretudo a ausência de vitaminas no cardápio diário, trouxe consigo o crescimento dos casos de escorbuto e outras doenças, como a hemeralopia [deficiência de visão à luz do sol; cegueira diurna], disenterias sanguíneas (ventris fluxus, Piso), moléstias do fígado, surtos de gripes, dentre outras que dizimaram um grande parte da população.
A ausência das mais comezinhas noções de higiene e de asseio corporal veio contribuir para o aparecimento de parasitas, que, por vezes, levava à morte, como testemunha Ambrosius Richshoffer em seu Diario de um Soldado (1629-1632), ao narrar a morte de certo marinheiro da sua companhia: “Apesar de o meterem, inteiramente nu, dentro de uma tina de água do mar, esfregarem-lhe fora a bicharia com uma vassoura, e vestirem-lhe uma camisa limpa, logo encheu-se outra vez deles, e não só inchou extraordinariamente como ficou cego”.
O Hospital do Recife, localizado junto ao Forte de São Jorge, quando da epidemia de 1646, tornou-se insuficiente para abrigar tão grande número de doentes.
Pierre Moreau, que acompanhou os últimos anos da presença holandesa em Pernambuco, acerca das doenças que dizimavam a população é conclusivo em suas observações:
Eram doenças comuns como o escorbuto, o fluxo de sangue e os vermes engendrados nas serosidades corrompidas de seu sangue e que apareceram em todas as partes de seus corpos, dos quais se arrancava a pele, mas ficavam sempre alguns óvulos que originavam outros. Trezentos ou quatrocentos sucumbiram mortos pela debilidade, alguns nos hospitais outros, por vezes, no meio da rua.
O cemitério em questão, com as ossadas desses mortos, foi recentemente descoberto quando das escavações realizadas nas proximidades da Igreja do Pilar no Bairro do Recife.
A partir de 1630, com a crescente busca por riquezas na Terra do Açúcar, vieram para Pernambuco homens, mulheres e crianças, originários dos mais diferentes portos, aproveitando-se das facilidades oferecidas pela Câmara de Amsterdã para quem desejasse se estabelecer no Brasil Holandês.
Segundo recenseamento realizado em fins de 1645 e nos começos de 1646, o qual não inclui e nem indica o efetivo das guarnições militares acantonadas no Recife, estimado em 1.169 soldados, estariam confinados no atual bairro portuário um total de 4.660 pessoas, “entre particulares, empregados da Companhia e escravos”.
Por essa época, viviam precariamente no Recife cerca de 8 mil habitantes, segundo estimativa do cronista do Journael, publicado em Arnhem no mês de junho de 1646.
Comenta o escritor Hermann Watjen, que “algumas dessas horríveis moradas eram verdadeiras pocilgas”.
A fim de abrigar tanta gente foram reconstruídos os armazéns do porto, incendiados por ocasião da invasão (1630), aproveitando-se os sótãos dos sobrados, alguns dos quais com até oito pavimentos. Eram acomodações destinadas a “caixeiros, auxiliares de escrita e serventes”, em número de três a oito deles em cada cômodo, sob um calor asfixiante, com suas camas coladas às outras, na maior das promiscuidades; segundo se depreende de cartas do Conselho do Recife, com datas de 31 de março e 20 de dezembro de 1641:
Se nós não abrigarmos essa gente em habitações coletivas, ela vai procurar alojamentos nas bodegas do porto, que são os bordéis mais vis do mundo. Ai! Do mancebo que ali cair: fica votada a irremissível perdição.
Diante de tamanha promiscuidade, não é de admirar que a vida na colônia tornou-se um verdadeiro inferno. A falta de alimentação adequada, sobretudo a ausência de vitaminas no cardápio diário, trouxe consigo o crescimento dos casos de escorbuto e outras doenças, como a hemeralopia [deficiência de visão à luz do sol; cegueira diurna], disenterias sanguíneas (ventris fluxus, Piso), moléstias do fígado, surtos de gripes, dentre outras que dizimaram um grande parte da população.
A ausência das mais comezinhas noções de higiene e de asseio corporal veio contribuir para o aparecimento de parasitas, que, por vezes, levava à morte, como testemunha Ambrosius Richshoffer em seu Diario de um Soldado (1629-1632), ao narrar a morte de certo marinheiro da sua companhia: “Apesar de o meterem, inteiramente nu, dentro de uma tina de água do mar, esfregarem-lhe fora a bicharia com uma vassoura, e vestirem-lhe uma camisa limpa, logo encheu-se outra vez deles, e não só inchou extraordinariamente como ficou cego”.
O Hospital do Recife, localizado junto ao Forte de São Jorge, quando da epidemia de 1646, tornou-se insuficiente para abrigar tão grande número de doentes.
Pierre Moreau, que acompanhou os últimos anos da presença holandesa em Pernambuco, acerca das doenças que dizimavam a população é conclusivo em suas observações:
Eram doenças comuns como o escorbuto, o fluxo de sangue e os vermes engendrados nas serosidades corrompidas de seu sangue e que apareceram em todas as partes de seus corpos, dos quais se arrancava a pele, mas ficavam sempre alguns óvulos que originavam outros. Trezentos ou quatrocentos sucumbiram mortos pela debilidade, alguns nos hospitais outros, por vezes, no meio da rua.
O cemitério em questão, com as ossadas desses mortos, foi recentemente descoberto quando das escavações realizadas nas proximidades da Igreja do Pilar no Bairro do Recife.
MAIS NOTÍCIAS DO CANAL
MAIS LIDAS
ÚLTIMAS