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As dificuldades das empresas

Alexandre Rands Barros
Economista, PhD pela Universidade de Illinois

Publicado em: 28/03/2020 03:00 Atualizado em: 28/03/2020 08:26

O isolamento das pessoas vem causando prejuízos imensos às empresas. As angústias causadas foram atenuadas pelo anúncio de ações que efetivamente não se concretizaram até então. Crédito mais fácil e mais barato e redução de ônus de salários, encargos e tributos, sem contrapartida de geração de valor, foram algumas das medidas anunciadas, mas que efetivamente não se concretizaram até então. As medidas na esfera trabalhista foram adequadas, mas não são suficientes para conter o prejuízo das empresas e segurar muito a magnitude da crise. A liberação de compulsórios e outros instrumentos para dar mais liquidez ao sistema financeiro não geram mais ímpeto à atuação dos bancos para aliviar a necessidade de recursos das empresas. Principalmente por decorrência da elevação da percepção de risco que passaram a ter. Apesar de tais medidas, houve na verdade redução de crédito às empresas e elevação das taxas de juros cobradas e das garantias exigidas. Ao contrário do que se desejava.

O risco associado a cada empresa pode ser decomposto em três componentes. O sistêmico, que está associado a toda a economia, o setorial, que reflete particularidades do seu setor de atuação específico, e o particular, que reflete as suas condições operacionais. Ao pôr mais liquidez no sistema e baixar a taxa Selic, o governo apostava num maior acesso ao crédito e menores taxas de juros. No entanto, houve um aumento muito grande no componente sistêmico do risco das empresas. A desestruturação da economia gerada pela redução da atividade econômica põe em risco a sobrevivência de conjunto elevado de empresas. Por isso, mesmo com a redução da Selic e maior disponibilidade de recursos líquidos, os bancos preferem não emprestar. A lógica de funcionamento da política monetária por meta de inflação assegura que qualquer quantidade de recursos à disposição dos bancos possa ser emprestada ao Banco Central à taxa Selic. Os bancos estão preferindo garantir esta do que perder dinheiro emprestando a empresas com alto risco de inadimplência.

A única solução para esse problema é o governo criar maior ônus aos bancos para aplicar dinheiro em títulos públicos remunerando a Selic. Para isso bastaria criar uma taxa sobre reservas excedentes dos bancos. Por exemplo, todos os recursos acima da reserva compulsória que fossem aplicados em títulos públicos ou mesmo retidos em caixa nos bancos pagariam uma taxa, ao invés de receber remuneração (Selic) ou ficar isento de taxa (reservas em caixa). Isso forçaria os bancos a emprestarem os recursos disponíveis acima das reservas compulsórias. O Bacen poderia variar a taxa paga em reservas excedentes de acordo com meta de empréstimos. Se ele elevou em R$ 1,2 trilhão os recursos disponíveis para os bancos para empréstimos, a taxa cobrada seria elevada até esse patamar de empréstimo ser atingido.

Ao final do período em que essa política fosse efetiva, o Bacen faria o levantamento do desempenho de todos os empréstimos do período. A perda média seria compensada aos bancos pelo tesouro como seguro pago ao risco sistêmico de crédito. Se o Bacen quiser realmente ser eficiente, ele ainda poderia criar riscos setoriais, a partir da classificação CNAE das empresas. Nesse caso, a perda não seria de acordo com a média total, mas setorial. Bancos que emprestarem mais a setores com maiores perdas não seriam penalizados. Certamente com tal atuação, a diminuição dos riscos sistêmicos faria com que as perdas totais do Tesouro Nacional com compensação do risco sistêmico talvez fossem menores do que ele terá com a queda de receitas decorrentes de crise mais severa.

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