Editorial Cautela marcou reação de Teerã e Washington

Publicado em: 09/01/2020 03:00 Atualizado em: 09/01/2020 09:04

O Irã não é para principiantes. É para craques. O país dos aiatolás é a terra dos persas. Eles inventaram o xadrez, jogo que exige inteligência, estratégia e paciência. São características que parece terem orientado Teerã na resposta aos Estados Unidos. O ataque a duas bases americanas no Iraque é fruto de cuidadoso cálculo. Deu satisfação ao público interno. A multidão que levou às ruas milhares de pessoas que pediam vingança pela morte do general Qassem Soleimani sentiu-se atendida. E o governo, que enfrentava oposição interna crescente, conseguiu apoio quase milagroso.

O “tapa na cara”, como o líder espiritual, Ali Khamenei, qualificou a agressão, veio carregado de simbolismos. A República Islâmica abdicou de passar procuração a terceiros (milícias ou terroristas regionais) para efetuar a represália como sempre faz. Usou o próprio território para disparar os mísseis contra a base inimiga, fato que reveste de importância a ação retaliatória.

Mas teve o cuidado de avisar o primeiro-ministro do Iraque, que deve ter avisado as autoridades americanas. Não houve mortes. “Até agora está tudo bem”, tuitou Donald Trump. Também pelo Twitter, o chanceler iraniano, Javad Zarif, recorreu a tom cauteloso: “O Irã tomou medidas proporcionais em autodefesa, baseado no art. 51 da Carta da ONU. Não buscamos uma escalada de guerra, mas iremos nos defender de qualquer agressão”.

No discurso ansiosamente esperado pós-ataque iraniano, Donald Trump mostrou-se sensato. Cantou vitória, mas evitou improvisos (sempre perigosos) e leu o pronunciamento. Justificou o assassinato de Soleimani, a quem responsabilizou pela promoção de uma série de ações terroristas. A eliminação do general teria livrado o mundo de grave ameaça.

Disse que aplicará novas sanções ao Irã até o país mudar de comportamento — desistir das armas nucleares e do apoio ao terrorismo. Convocou a Otan a participar com mais efetividade dos processos do Oriente Médio. E, depois de exaltar o poder econômico e militar da maior potência do planeta, frisou que a força existe para deter os inimigos e para levar avante trabalhos conjuntos como o efetivado contra o Estado Islâmico.

“Os Estados Unidos querem paz”, insistiu o presidente. Nesse contexto, conclamou Reino Unido, Alemanha, França e China a abandonar o acordo nuclear e firmar novo pacto, capaz de tornar o Irã um grande país: “Precisamos trabalhar para chegar a um acordo com Irã que torne o mundo um lugar mais seguro”.

Depois da resposta de Teerã e de Washington, o clima é de alívio. O Irã, ao não ultrapassar a linha vermelha, deixou uma brecha para a diplomacia. Os Estados Unidos também acenaram com a mesa de negociações. A pausa na escalada das tensões não significa fim da guerra entre os dois países que se arrasta há 40 anos. Significa amenização da crise.

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