Em menos de 3 anos, Estado trocou 65% dos gestores de presídios: "Não são todos por corrupção", diz secretário
Neste ano, dois presídios foram alvos de operações policiais que flagraram esquemas de corrupção e regalias entre gestores, policiais penais e detentos
Publicado: 01/10/2025 às 17:00

O secretário de Administração Penitenciária e Ressocialização (SEAP), Paulo Paes (Foto: Marina Torres/DP Foto)
Desde o início da gestão, o governo Raquel Lyra mudou 65% dos gestores penitenciários de Pernambuco. Em entrevista ao Diario de Pernambuco, o secretário de Administração Penitenciária e Ressocialização (SEAP-PE), Paulo Paes, declarou que as alterações acontecem por “uma questão de alinhamento com a visão da pasta”, negando que as mudanças tenham motivação punitiva.
Inicialmente, o secretário informou que, das 23 unidades prisionais, a mudança teria sido feita em 21 delas. Posteriormente, em nota, a assessoria de comunicação da pasta declarou que foram trocados ou remanejados 15 diretores de presídios no Estado.
“Praticamente todo nosso quadro de diretores já foi mudado. E não são todos que estão sendo trocados por corrupção, tá? É uma mudança de gestão que tem que ter”, afirmou. “Isso é normal no meio da gente, a mudança de diretor, de chefe de segurança, fazer rodízio. ‘Ah, você já está há algum tempo, você tem mais experiência, venha para cá, ajuda aqui’, sabe?”.
No início deste ano, o Presídio de Igarassu, no Grande Recife, foi alvo da Operação La Catedral, deflagrada pela Polícia Federal. A investigação revelou um esquema corrupto entre policiais penais e detentos, entre eles um ex-secretário executivo da SEAP e um diretor.
Em agosto, o diretor da Penitenciária Dr. Edvaldo Gomes, em Petrolina, no Sertão do Estado, e outros policiais penais foram presos na Operação Publicanos, da Polícia Civil. Segundo o inquérito, o ex-gestor estaria envolvido em um esquema de recebimento de propina em troca de regalias para os presos.
Ao Diario, Paes confirmou que a Secretaria tinha ciência de problemas antes das operações policiais que flagraram corrupção em Igarassu e Petrolina e admitiu que o sistema prisional enfrenta problemas "históricos" como o déficit de policiais penais e a atuação de "cantineiros" e "chaveiros," mas defendeu que a nova gestão tem a "coragem" de enfrentar a crise.
Leia a entrevista com Paulo Paes
Em setembro, a governadora falou que todos os aprovados no edital 2022 para a Polícia Penal serão convocados. A pasta tem alguma previsão de quando será essa convocação?
A gente traçou mais ou menos um cronograma no seguinte sentido, até pelo trabalho diferenciado que estamos fazendo em algumas unidades prisionais do Estado, para sanar déficits antigos — não só de efetivo, mas de segurança e disciplina nas unidades — definimos um direcionamento, um planejamento, para que as novas unidades sejam ocupadas por novos efetivos.
Há um compromisso do governo, da própria governadora, de convocar esse pessoal. A gente não pode, em nenhum momento, cravar data ou dia exato, porque isso é uma questão interna. Nós temos unidades para entregar até o fim do ano, estamos recebendo cinco unidades até janeiro ou fevereiro.
Com isso, praticamente fechamos o complexo de Araçoiaba. Ainda faltam duas unidades para serem concluídas, e já foi iniciada a obra de três unidades em Itaquitinga, previstas para 2026.
O senhor concorda que o déficit de policiais penais faz com que surjam mais cantinas e chaveiros nas unidades prisionais?
Também. Mas veja, em relação à questão do chaveiro, nós temos combatido. Sobre as cantinas, já existe uma demanda junto ao Ministério Público, com prazos estabelecidos para o fechamento dessas estruturas no Estado. Cantinas e chaveiros são problemas antigos. Esse governo teve coragem de encarar a situação como algo sério e enfrentar. Não é uma questão que se resolve de um dia para o outro, girando uma chave.
As novas unidades já estão funcionando sob um regime rigoroso: zero chaveiro, zero cantina. Temos três unidades nesse modelo e todas as próximas também abrirão assim, por determinação minha. Com, efetivo, a gente dá conta do recado e consegue fazer.
No início do ano, tivemos uma Operação da Polícia Federal no Presídio de Igarassu e em agosto em Petrolina, deflagrada pela Polícia Civil. Como estão essas unidades hoje?
Temos combatido fortemente a questão dos desvios de conduta. Esse trabalho vem sendo feito com a nossa Comissão de Disciplina e em diálogo constante com a corregedoria da Secretaria de Defesa Social (SDS), que também é a nossa corregedoria.
O caso de Igarassu ganhou repercussão nacional. Mas já estávamos atuando antes: tanto que eu já tinha desligado um servidor três meses antes da operação. Já vínhamos trabalhando para afastá-lo, e ele acabou sendo preso e agora responde judicialmente. Terá a parte da Corregedoria para todos que erraram. Nós cumprimos a nossa atribuição e entregamos às demais esferas para que façam a parte delas.
E eu lhe digo, com toda sinceridade: os casos em que há indícios e que conseguimos avançar e provar, estamos enviando [para a Comissão de Disciplina], independentemente de quem seja.
O senhor falou que o servidor foi afastado três meses antes da deflagração da operação. Então a SEAP-PE já tinha ciência do que estava acontecendo no Presídio de Igarassu?
A gente tinha ciência de várias situações, principalmente da superlotação. São quase 6.000 presos em uma unidade que deveria comportar apenas 1.200. Não era só girar uma chave. O efetivo era muito baixo para dar conta, e não havia condições de manter a devida fiscalização diária.
É tanto que vimos o que tinha lá dentro. Agora, hoje, temos feito um trabalho lá: a gente mudou a direção, estamos cobrando com muita ênfase o trabalho interno. É tanto que vocês veem que hoje não se fala tanto dos problemas de Igarassu. Pode ter problemas, mas estamos apurando e resolvendo. O problema de Igarassu hoje é mais a superlotação. Não é fácil, mas a gente vai avançar com essas unidades que a gente vai entregar até 2026.
O senhor acha que câmeras corporais para policiais penais ajudariam?
Olha, isso é uma questão que não depende só de nós, é uma decisão do governo. Dentro das unidades prisionais, é necessário fazer uma avaliação, inclusive comparando com outros estados, para entender como funciona e como poderíamos implementar.
Se for adotado, precisamos construir isso com muita cautela e avançar gradualmente. Em algumas situações, eu creio que seria viável e poderia acontecer dentro do Estado. Mas, pela atual estrutura das unidades, é algo que precisa ser implementado com muito cuidado.
A Penitenciária Policial Penal Leonardo Lago, no Complexo do Curado, nos primeiros três meses após inaugurado houve duas mortes. Como está a segurança lá?
Foi um homicídio. Motivado pelo quê? Os presos queriam transferência da unidade. Por quê? O regime é diferenciado. Hoje estamos tratando a situação como deve ser: com efetivo, em uma unidade prisional moderna.
Como você mesmo me cobrou, estamos cuidando da situação dos chaveiros e das cantinas, garantindo que o preso cumpra sua pena. Sem as regalias, mas com os direitos da Lei de Execução Penal garantidos. O banho de sol, fardamento, colchão novo, por exemplo.
Adquirimos 10.000 colchões. Hoje, temos colchão para todos. São colchões antichamas, específicos para unidades prisionais, algo que nunca havia sido feito. O Leonardo Lago é uma das referências que a gente tem, e ela foi inaugurada com presos da Barreto Campelo, que tinham suas regalias antes.
É uma mudança de cultura muito grande fazer isso. E é isso que estamos construindo para o Estado. É isso que estamos implementando nessas novas unidades. Todas as unidades têm estrutura para que possamos trabalhar dessa forma, e as que estão sendo inauguradas também funcionarão nesse modelo.

