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Diretor investigado por corrupção em penitenciária de Petrolina movimentou R$ 3,3 milhões, diz polícia

Relatório da Polícia Civil aponta que diretor e dois policiais penais de penitenciária em Petrolina, no Sertão, tiveram movimentações incompatíveis com a renda declarada

Mareu Araújo

Publicado: 28/08/2025 às 14:32

A frente da Penitenciária Dr. Edvaldo Gomes, em Petrolina/Foto: Reprodução/Google Maps

A frente da Penitenciária Dr. Edvaldo Gomes, em Petrolina (Foto: Reprodução/Google Maps)

Investigação da Polícia Civil de Pernambuco aponta que Alessandro Barbosa Martins de Sousa, diretor da Penitenciária Dr. Edvaldo Gomes (PDEG), em Petrolina, no Sertão, e a mulher dele, Ana Paula Lopes Bezerra, movimentaram R$ 3,3 milhões nos últimos três anos. Principal alvo da Operação Publicanos, que apura um suposto esquema de corrupção na unidade, o gestor está afastado do cargo. Os investigados alegam inocência. 

Segundo relatório policial, obtido pelo Diario de Pernambuco, a análise patrimonial dos investigados evidenciaria “expressiva incompatibilidade com as rendas declaradas”. O valor exato das movimentações, referente ao período de agosto de 2022 a abril deste ano, é de R$ 3.300.666,00, de acordo com o documento. O casal, no entanto, declara renda mensal de R$ 12.385,01.

“Chama atenção o fato de que grande parcela dos valores creditados nas contas ocorreu por meio de depósitos em espécie: foram R$ 315.600,00 distribuídos em 271 depósitos, provavelmente em espécie, em sua maioria, abaixo de R$ 2.000,00, e realizados em terminais de autoatendimento”, registra o inquérito. A Operação Publicanos, deflagrada na semana passada, é conduzida pelo Departamento de Repressão à Corrupção e o Crime Organizado (Dracco).

A suspeita da Polícia Civil é de que o diretor estaria envolvido em um esquema de recebimento de propina em troca de regalias para os presos. Também são investigados os policiais penais Vinícius Diego Sousa Colares, que era assessor dele; Ronildo Barbosa dos Santos, chefe dos plantões; Cledson Gonçalves de Oliveira e cinco presos. Todos os agentes públicos foram afastados.

Propina

De acordo com a investigação, detentos pagavam propina para ter acesso a aparelhos celulares, bebidas alcoólicas e mudanças de pavilhão. Alessandro é suspeito, ainda, de permitir aluguel de cantinas, saídas ilegais e até alteração de rotas de detentos com tornozeleira eletrônica.

Os maiores valores eram destinados para a troca de “chaveiros” (presos que assumem a função de apoio aos agentes de segurança na unidade) e de “cantineiros” (detentos que cuidam das cantinas). Segundo a Polícia Civil, para assumir os postos na cadeia, os escolhidos deveriam pagar entre R$ 10 mil a R$ 20 mil.

Os chaveiros e cantineiros precisavam, ainda, pagar “mesadas”, que custariam R$ 3,5 mil (cada chaveiro) e R$ 4 mil (cantineiro), de acordo com a investigação. Ao todo, a unidade tem oito pavilhões, o que totaliza 16 cargos de “lideranças” para os presos.

Para a Polícia Civil, esses detentos seriam responsáveis por recolher a propina dos demais presos e repassar para agentes de confiança de Alessandro. Entre eles, estaria o policial penal Vinicius Diego, que é apontado como “testa de ferro do diretor” e responsável por receber os pagamentos dos detentos via Pix.

Também seria papel de Vinícius comprar eletrodomésticos, televisões, celulares e até remédios de disfunção erétil para a cadeia. “Foram R$ 472.312,74 gastos em cartão de crédito em seis anos, mesmo período em que Vinicius adquiriu 28 aparelhos celulares de marcas diversas, pagando R$ 108.087,89”, diz o documento.

A entrada dos eletrodomésticos seria facilitada por Ronildo Barbosa, apontado na investigação como a segunda maior figura de autoridade funcional dentro do presídio.

Patrimônio

No Relatório de Inteligência Financeira, os investigadores perceberam divergências entre as movimentações e as declarações de renda dos alvos. Entre 2017 e 2023, Alessandro e os dois policiais penais movimentaram quase R$ 6,3 milhões, de acordo com o documento.

No caso de Vinicius Diego, a Polícia concluiu se tratar de uma “conta de passagem” – utilizada para receber e redistribuir valores, com o objetivo de tentar burlar mecanismos de rastreamento financeiro. De agosto de 2023 a abril de 2025, ele movimentou R$ 3.613.886,64. Para a Receita Federal, ele declarou renda mensal de R$ 7.888,54.

Já em relação a Ronildo, a movimentação financeira seria de quase R$ 500 mil, sendo R$ 247.899,92 em créditos e R$ 255.712,46 em débitos, de outubro de 2024 a abril de 2025. Para a Polícia Civil, os valores são incompatíveis com sua renda mensal, declarada em R$ 10.064,40.

O Diario entrou em contato com o advogado que representa Alessandro, Ana Paula, Vinicius e Ronildo, mas não obteve resposta. O espaço segue aberto para manifestação.

Procurada, a Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (Seap) também não respondeu. No dia da operação, a pasta emitiu nota em que dizia que “não compactua com quaisquer atos ilícitos no sistema prisional de Pernambuco” e “segue à disposição e colaborando com todas as investigações policiais”.

Leia a nota, enviada ao Diario de Pernambuco, da defesa de Alessandro, Ana Paula e Ronildo:

A defesa de ANA PAULA LOPES BEZERRA, ALESSANDRO BARBOSA MARTINS DE SOUSA e RONILDO BARBOSA DOS SANTOS vem a público esclarecer que, embora a operação tenha sido deflagrada em 19/08/25, o acesso aos autos só foi concedido em 25/08/25, o que inviabiliza, até o momento, uma análise conclusiva sobre as acusações.

O que se observa, preliminarmente, é uma investigação iniciada em desrespeito às garantias constitucionais, sem que os investigados tenham sido ouvidos, e baseada em delações anônimas e conjecturas sem provas. Os valores apontados não condizem com a realidade financeira dos envolvidos, que vivem de forma modesta, com bens financiados.

A exposição pública precoce e infundada compromete a reputação de servidores que há mais de 20 anos atuam com dedicação e sem qualquer mácula funcional. A defesa seguirá firme na missão de corrigir as falhas da investigação e assegurar o respeito ao devido processo legal.

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