Defesa diz que Bolsonaro foi "dragado para os fatos da trama golpista"
Para especialista, defesa do ex-presidente "sempre foi muito difícil pelo contexto em que ele se inseriu" e por seguir "esticando a corda com o Supremo"
Publicado: 03/09/2025 às 22:12

Bolsonaro: novo indiciamento da PF aumenta pressão às vésperas de julgamento (Foto: Ton Molina/STF)
Na retomada do julgamento do núcleo 1 da trama golpista, nesta quarta-feira (3), foram ouvidas as sustentações das defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno; do ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; e do ex-ministro de Bolsonaro e candidato à vice na chapa de 2022, general Braga Netto. Ao longo do dia, advogados buscaram afastar Bolsonaro da trama golpista.
Na avaliação do professor e coordenador do curso de Direito da ESPM, Marcelo Crespo, a defesa do ex-presidente “sempre foi muito difícil”, pelo contexto em que “ele se inseriu”.
No segundo dia de sessões, o advogado do ex-presidente, Celso Vilardi, disse não existir “uma única prova” de que Bolsonaro tenha participado de uma tentativa de golpe e que o ex-mandatário foi “dragado” para os fatos.
A defesa do ex-presidente também solicitou a anulação da delação premiada de Mauro Cid, acusando-o de “não ser confiável devido às contradições e omissões”, e de ter “colocado sua voluntariedade em cheque” ao afirmar que foi coagido em seu interrogatório. Para o professor, a crítica à delação não foi uma “grande surpresa”.
“Eles dizem que o Mauro Cid é mentiroso, que ele falou e depois que voltou atrás, mas por outro lado, acabam até concordando que as provas da Polícia Federal foram todas incluídas no processo”, aponta.
Marcelo ressalta a tentativa da defesa de Bolsonaro de “interpretação dos fatos” apontados na acusação como a impressão da minuta golpista no Palácio do Planalto.
“Ele quer jogar de que isso é um movimento pueril, infantil, mas tem outras coisas que acabam contrapondo. Por exemplo, no próprio interrogatório de Bolsonaro, Alexandre de Moraes perguntou: ‘Você tendo perdido o recurso no TSE, você chamou generais para discutir alternativas?’ e ele concordou. Confessou que para além da parte de recursos, tinha ali uma intenção de permanecer no poder”, lembra Crespo.
Para o professor, a defesa de Bolsonaro “sempre foi muito difícil”, por todo contexto em que o ex-presidente se inseriu. “Ele está sendo julgado não por um ato específico, mas por uma sucessão de atos, e uma sucessão de comportamentos que concluíram no 8 de janeiro. Se fosse um ato único, específico, a defesa talvez fosse mais fácil, mas tem um contexto do Bolsonaro sempre esticando a corda com o Supremo”, ressalta.
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Diferenças entre as defesas
Para Crespo, houve muitas diferenças entre o estilo e as características dos advogados “como o advogado ali que elogiou o Fux, o advogado que falou da sogra, que está uma coisa muito mais no entorno das defesas do que no conteúdo delas mesmo”.
“As defesas trazem os elementos, por vezes técnicos, por vezes interpretativos, mas a minha avaliação é de que não houve grande mudança. Ninguém levantou nada tão louvideiro que pudesse dizer: ‘Agora se descobriu algo no meio dos das provas que pudesse mudar o destino dos acusados’. Não tem nenhuma inovação material”, avalia.
O advogado do general Braga Netto, José Luis de Oliveira Lima, afirmou que as acusações do procurador-geral da República (PGR), Paulo Gonet, contra o ex-ministro são baseadas em “uma delação mentirosa e oito prints adulterados”.
A defesa também alegou não ter tido acesso completo ao material da Procuradoria-Geral da República (PGR), que sustenta a acusação da suposta trama do golpe.
A defesa do general Augusto Heleno, representada pelo advogado Matheus Milanez tentou deslocar o militar do ex-presidente, dizendo ter perdido espaço no governo e também contestou a condução do ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, afirmando que houve “falhas” no processo. Milanez também criticou uma pergunta feita por Moraes a uma testemunha sobre uma postagem em rede social, que não constava nos autos.
Enquanto as demais defesas foram enfáticas em argumentar que a tentativa de golpe não existiu, o advogado do ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, argumentou durante sua sustentação oral que o general atuou de forma ativa para afastar qualquer iniciativa golpista do ex-presidente e que temia o levantamento e rompimento do Estado democrático de direito.
Ainda segundo as defesas, o professor destaca a posição de respeito dos advogados aos ministros, com as saudações e elogios.
“É um trabalho técnico como qualquer outro. Você tá lá como advogado, você não tá lá como inimigo do juiz. Você está defendendo o interesse de alguém. Tratar bem os ministros só reforça o trabalho técnico e talvez, até por isso, eles consigam ter a percepção mais próxima dos ministros, de algum ponto da defesa para atenuar um pouquinho a pena ali ou aqui”, aponta Crespo.
Cálculo das penas
Para Crespo, ainda não é possível antecipar a dosimetria (cálculo) das penas, se os réus forem condenados, cabendo “a cada um dos ministros”, com Moraes, o ministro relator, trazendo o fio condutor e sua interpretação. “A partir da manifestação dele é que vai entender se ele vai puxar mais para pena máxima ou não”, ressalta.
O professor ainda destaca que, de acordo com o artigo 59 na Constituição, a dosimetria deve avaliar todo o contexto, incluindo o comportamento do acusado e as características, “podendo valorar para mais ou para menos”. E, do outro lado, a acusação do PGR reiterando o que trouxe na denúncia.
“É possível que Alexandre de Moraes, diga que Bolsonaro sendo o então Presidente da República conspirando para ficar no poder, torna a conduta ainda mais gravosa. E esse tipo de interpretação pode levar sempre uma pena mais alta”, especula.
Crespo avalia que as penas deverão ser altas, mas não chegarão no máximo, “até por uma questão política”. “Não deveria ser assim, mas é uma leitura que eventualmente o Supremo vai condenar, mas dizer: ‘Não precisamos dar pena máxima, vai parecer eventualmente que é uma uma perseguição’”, explica.
Possíveis condenações
De acordo com o professor, a condenação das prisões poderá ser acima de 10 anos e deve acontecer por todo o “contexto das provas”, mas observa que o regime do cumprimento da pena deverá ser uma questão a ser discutida.
“Como regra, se é condenado a altas penas, começa em regime fechado, mas é sabido que o regime fechado, como foi pro presidente Lula e como pode ser para o Bolsonaro, até por questões de segurança, possivelmente, não será num presídio comum”, aponta.
Após a possível condenação, Crespo ainda acredita que a defesa do ex-presidente poderá usar a argumentação da fragilidade que já vem sendo construída, mas que a tendência do Supremo não será a de considerar imediatamente a questão da saúde, e “dependeria da defesa depois fazer um pedido e demonstrações para tentar mudar alguma coesão nesse sentido".
“Ele tem trabalhado junto aos seus advogados para demonstrar que está fragilizado, que está com com soluços. De fato têm essas questões de saúde. Então, ele tem condições de pleitear que não fique preso em regime fechado, mas em um regime domiciliar. Recentemente houve uma decisão que favoreceu o Color nesse sentido, acredito que vão buscar isso como um um parâmetro”, concluiu.

