Quinta Filme pernambucano Brasil S/A será exibido com trilha sonora ao vivo Orquestra de Câmara de Pernambuco acompanhará sessão do longa-metragem dirigido pelo cineasta pernambucano Marcelo Pedroso

Por: Júlio Cavani - Diario de Pernambuco

Publicado em: 10/08/2016 07:50 Atualizado em: 10/08/2016 11:31

Imponência das músicas acompanha o estilo épico do filme, que ironiza a linguagem apoteótica da publicidade das grandes estatais (Ivo Lopes araújo/ Divulgação)
Imponência das músicas acompanha o estilo épico do filme, que ironiza a linguagem apoteótica da publicidade das grandes estatais
 
Uma orquestra com 35 integrantes tocará, ao vivo, a trilha sonora do filme Brasil S/A, que simultaneamente será projetado na tela do Cinema São Luiz nesta quinta, a partir das 20h. Sob regência do maestro José Renato Accioly, os músicos terão que encaixar precisamente os temas instrumentais de autoria do compositor Mateus Alves nas cenas dirigidas pelo cineasta Marcelo Pedroso.

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Premiado no Festival de Brasília em 2014 e selecionado para o Festival de Berlim em 2015, Brasil S/A finalmente entra em cartaz nos cinemas brasileiros a partir desta quinta. A orquestra participará apenas da primeira sessão no São Luiz, com capacidade  de público para 950 pessoas. Os ingressos começam a ser vendidos uma hora antes (às 19h, por R$ 10 e meia por R$ 5) na bilheteria do cinema.

Projeções de filmes acompanhadas por bandas ou músicos já são uma prática comum no Recife em festivais e cineclubes. O diferencial desta vez é justamente as composições de formato sinfônico e a quantidade de instrumentos tocados ao mesmo tempo. Em Hollywood ou em países como Inglaterra, França e Itália, as trilhas sonoras orquestrais são comuns. No cinema de Pernambuco, apesar da força musical do estado, são raros os exemplos de orquestras locais que gravam especialmente para o cinema (por falta de tradição e de cursos de formação).

A trilha sonora de Brasil S/A é formada por sete temas instrumentais. Para a projeção desta quinta no São Luiz, as músicas foram retiradas do filme, mas os demais sons foram mantidos. A gravação original foi feita em 2014 no Seminário de Olinda com a participação de 25 instrumentistas. Na versão ao vivo, serão necessários 35 músicos para que os instrumentos consigam alcançar um volume equivalente ao dos outros efeitos sonoros. A Orquestra de Câmara de Pernambuco fará a apresentação, que tem suporte do Conservatório Pernambucano.

"Cada tema é associado a um personagem, seja ele uma máquina ou um ser humano", detalha Alves. Na música A dança do cortador de cana, por exemplo, os movimentos do ator Edilson Silva são acompanhados por um solo de violoncelo. Cegonha drive, Marcha das máquinas (tocada em duas versões), Brasil S/A, A coroação da rainha negra e O lançamento do operário espacial são os títulos das outras composições.

José Renato Accioly admite que esta será a primeira vez em que ele rege uma orquestra para acompanhar um filme. "Eu tenho que sincronizar as músicas com as cenas. Tenho estudado durante muitas horas", explica o maestro. Segundo o regente, "há momentos mais livres e outros que precisam de mais sincronia. É um grande desafio porque os instrumentos não podem entrar antes e nem depois das imagens. Eu vou olhar para a tela, enquanto os músicos olham para mim. Requer treino."

Partitura com uma das músicas da trilha sonora. Foto: Maíra Caldeira/ Divulgação
Partitura com uma das músicas da trilha sonora. Foto: Maíra Caldeira/ Divulgação

De acordo com Mateus, a sessão será literalmente uma experiência única, mas não perfeita. "É impossível soar exatamente como é na versão original do filme", antecipa o compositor. Ele explica que, por questões humanas, uma orquestra normalmente nunca consegue tocar uma mesma música duas vezes de forma igual, com os mesmos tempos.

Além das músicas orquestrais, a trilha de Brasil S/A tem também um baião, gravado pelo acordeonista Júlio César Mendes (professor do Conservatório Pernambucano), e um rap, produzido com a participação de Mateus Alves (baixo), Renato da Mata (DJ), Ryan Cockerham (voz), Pierre Leite (teclados) e Amanda Beça (backing vocals). Na projeção de amanhã, essas duas músicas estarão no próprio filme (sem execução ao vivo no São Luiz).

Os longas-metragens pernambucanos Permanência, de Leonardo Lacca, e Animal político, de Tião, também usam temas originais gravados com um estilo orquestral, mas elas foram produzidas na Inglaterra pelo compositor Jon Wygens junto com 14 músicos e regência de um maestro. Filmes como Sangue azul, de Lírio Ferreira, e País do desejo, de Paulo Caldas, também possuem músicas com instrumentos sinfônicos, mas tocados por grupos com menos integrantes. Mateus Alves já havia trabalhado de forma semelhante com Marcelo Pedroso no curta Em trânsito, que é uma espécie de prólogo para Brasil S/A. Naquela ocasião, entretanto, o compositor gravou a trilha sonora em Londres, onde estudava.

Veja vídeo sobre a trilha do filme:


SOBRE O FILME BRASIL S/A
Marcelo Pedroso optou por uma trilha sonora orquestral sinfônica por causa do tom épico e apoteótico das imagens de Brasil S/A. De forma irônica, sem diálogos, o filme critica o triunfalismo econômico que se baseia em lógicas desenvolvimentistas industriais sustentadas por uma sociedade guiada por um consumismo alienante. O longa-metragem é uma sequência de coreografias protagonizadas por tratores, navios, caminhões e personagens humanos, como um pescador engolido por empreendimentos portuários e um cortador de cana transformado em astronauta. Há ainda questionamentos sobre a incorporação de modelos de vida estrangeiros sobre o cotidiano dos brasileiros, que aproximam-se de um fanatismo religioso cego quando cultuam os últimos lançamentos do mercado. As sequências, que chegam a lembrar cartuns elaborados com imagens reais, também mostram como isso tudo é nocivo para uma convivência social urbana harmoniosa. Filmado em 2014, o longa-metragem foi profético ao antecipar-se a problemas que se confirmariam nos anos seguintes, como a fragilidade do polo industrial de Suape, por exemplo, onde foram rodadas algumas cenas. O formato narrativo não é linear e nem cinematograficamente convencional, mas os espectadores não necessariamente terão dificuldades para absorver as informações, até porque a liguagem audiovisual adotada é bastante baseada na publicidade, principalmente nas propagandas megalomaníacas das grandes estatais e instituições financeiras.

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