Saúde

Hábitos de vida mais saudáveis podem reverter aumento de miopia entre crianças

Uso exacerbado de aparelhos eletrônicos e pouca exposição ao sol são vilões dos casos de miopia entre os pequenos, podendo até prejudicar o rendimento escolar

Publicado em: 03/07/2018 16:27 | Atualizado em: 03/07/2018 17:46

Maria Luiza Friedheim, 8 anos, é míope: os graus das lentes dela são de 3,5 no olho esquerdo e 4 no olho direito. Foto: Marlon Diego/Especial para o DP

Principal causa de perda visual reversível para longe, a miopia afeta até 36% da população brasileira. Até 2050, segundo projeções realizadas pela Academia Americana de Oftalmologia (AAO), metade dos brasileiros terão esse erro refrativo. O aumento da miopia em todo o mundo tem relação direta com os hábitos de vida na infância. O uso exacerbado de aparelhos eletrônicos e a pouca exposição a ambientes com iluminação solar acabam comprometendo a visão nessa fase da vida, atrapalhando até mesmo o desenvolvimento cognitivo.

No Brasil, de 22 a 72 milhões de pessoas têm miopia. Os números só crescem, em proporções que têm alertado os médicos oftalmologistas. “Atualmente, há mais crianças míopes e há maior progressão do problema do que em décadas anteriores. Os graus de miopia têm aumentado rapidamente”, ressalta a oftalmologista do Hospital de Olhos de Pernambuco (Hope) Simone Travassos. 

Para a médica oftalmologista Polyana Marinho, é importante que as crianças brinquem ao ar livre com luz solar. Hábitos mais saudáveis podem combater a miopia. Foto: Peu Ricardo/DP

O uso de aparelhos eletrônicos, como celulares, tablets e computadores, é colocado como o vilão do problema. “A utilização desses eletrônicos leva ao uso maior da visão de perto. Isso provoca uma alteração na musculatura interna do olho e dificulta o relaxamento para a visão de longe. Então, quanto mais tempo de uso da visão de perto, mais difícil será enxergar objetos mais distantes”, explicou a oftalmologista pediátrica do Hospital de Olhos de Pernambuco (Hope) Polyana Marinho. 

Segundo a médica, a permanência em ambientes fechados, com pouca iluminação, também favorece o quadro. “A luz solar ajuda para que não ocorra o crescimento do globo ocular. Quanto maior for o diâmetro do olho, maior a tendência a ser míope. Por isso, é importante que os pais levem as crianças para brincar ao ar livre, em ambientes onde haja sol”, acrescentou Dra. Polyana Marinho. Ela lembra que até 70% da relação dos seres humanos com o mundo se dá através da visão. 

Em crianças até os dois anos, a miopia não é tão comprometedora. Porém, a partir dessa idade, com a introdução no ambiente escolar, esse vício de refração pode comprometer a sociabilidade, o comportamento e até o desenvolvimento intelectual dos pequenos. Se não identificada de forma precoce, a miopia pode levar a situações mais sérias como descolamento da retina e glaucoma.

Por isso, é fundamental para os pais, além de rever os hábitos e brincadeiras infantis, prestar atenção às queixas dos filhos. “Normalmente, a criança começa a aproximar os objetos para observar melhor, aperta o olho quando procura algo ou alguém mais distante. São os principais sinais de miopia”, detalha Dra. Polyana Marinho. 

Para a mãe de Maria Luiza, Lais Friedheim, a fotofobia da filha foi o gatilho para que a família procurasse atendimento oftalmológico. Foto: Marlon Diego/Especial para o DP
Uma careta, durante a exposição ao sol na praia, foi suficiente para que familiares de Maria Luiza Friedheim, 8 anos, percebessem que algo fugia ao comum. A fotofobia foi o gatilho para a procura de um oftalmologista. “Passamos a ir ao médico a cada três meses. E aos três anos ela começou a usar óculos”, conta a mãe, a dentista Lais Friedheim, 42. Maria Luiza também faz tratamento com atropina diluída desde o fim do ano passado: “O grau dela aumenta mais ou menos em um por ano, é muito rápido. Há cinco anos, o olho esquerdo era 1 e o direito 1,25. Hoje já é 3,5 e 4”, diz Lais. 

A identificação precoce permitiu que a menina já iniciasse a fase escolar adaptada aos óculos e evitasse comprometer o aprendizado. Hoje, eles são os melhores amigos de Malu, companheiros desde o momento do acordar até mesmo às aulas de ginástica. O recomendado para os pais é permanecer atentos. “O ideal é que as crianças façam acompanhamento com visitas ao oftalmologista a cada seis meses durante os dois primeiros anos de vida”, orienta Simone Travassos. 

Após essa fase, as crianças devem frequentar o oftalmologista uma vez por ano. Quando detectado algum erro refrativo, seja miopia ou hipermetropia de grau elevado, a consulta deve acontecer em intervalos mais curtos. 

>> Tratamentos e correções

É recomendado que as crianças façam acompanhamento com visitas ao oftalmologista a cada seis meses durante os dois primeiros anos de vida.
 Ao contrário do que muita gente pensa, os óculos não tratam a miopia, eles compensam o erro refrativo. A função deles é fazer a correção para permitir que o paciente enxergue melhor. Um novo recurso terapêutico vem sendo estudado como método para estabilizar a miopia. É a atropina, uma substância que diluída em 0,01% é capaz de evitar a progressão do grau. 

O colírio de atropina diluída tem sido adotado depois que estudos realizados com crianças entre 6 a 15 anos, sem doenças oculares correlatas e que apresentavam a cada seis meses um aumento de grau maior que 0,5, dioptria mostraram eficácia no controle do erro refrativo. Uma pesquisa realizada em Cingapura mostrou que o uso de uma gota por dia do colírio de atropina diminuiu a progressão da miopia em 50% dos casos, em comparação às crianças não tratadas com a medicação. 

A médica oftalmologista Simone Travassos tem observado aumento nos casos de miopia entre crianças. Segundo ela, os graus também têm aumentado mais rapidamente. Foto: Shilton Araújo/Especial pra o DP
“Estudos têm mostrado que a atropina, embora não tenha sido criada com esta finalidade, tem diminuído a progressão da miopia. Isso não significa diminuição do grau de miopia, nem garante que não haverá aumento, mas desacelera esta progressão. A expectativa é de que ele será menor do que nos pacientes que não usam atropina”, explica a oftalmologista do Hope Simone Travassos.  

Em diversos países, a substância já foi aprovadas pelos órgãos de controle. Aqui no Brasil, ainda está em processo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas já pode ser usada, desde que com a assinatura de uma carta de anuência dos pais”, explicou a oftalmologista Polyana Marinho. O tratamento com atropina é feito da seguinte forma: todas as noites é preciso pingar uma gota nos olhos do paciente, até o fim da época em que a miopia costuma estabilizar, no fim da adolescência e início da vida adulta. 

A atropina diluída não é indicada para todos os casos, portanto é importante que, antes de fazer o uso, os pais ou responsáveis levem a criança para uma consulta oftalmológica. “Uma das contraindicações é para crianças e adolescentes que têm doenças cardiovasculares”, acrescenta Dra. Polyana. 

A atropina diluída é um novo recurso terapêutico estudado como método para estabilizar a miopia. Pode melhorar a qualidade de vida de inúmeras crianças míopes. Foto: Peu Ricardo/DP

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