Baby baby Lulu Santos transforma hits da roqueira Rita Lee em funk, samba e música eletrônica 'No fundo, queria que todas as músicas funcionassem na pista', o cantor, em entrevista à reportagem do Viver

Por: Fellipe Torres - Diario de Pernambuco

Publicado em: 23/10/2017 11:14 Atualizado em: 23/10/2017 11:23

Lulu gravou hits de Rita Lee. Foto: Leo Aversa
Lulu gravou hits de Rita Lee. Foto: Leo Aversa
Lulu Santos era um adolescente de 16 anos quando encontrou pela primeira vez com Rita Lee, àquela época integrante d’Os Mutantes. Era começo da década de 1970, e o garoto foi até os estúdios da TV Globo para acompanhar a participação da banda no icônico programa de auditório Som livre exportação. Dali a 16 anos, em 1986, já um artista com quase duas dezenas de hits vencedores de discos de ouro, ele confessou ao jornalista Nelson Motta a vontade de prestar um tributo à Rainha do Rock. O projeto nunca saiu do papel, até a leitura da autobiografia de Rita Lee, recentemente, reacender no músico a vontade de 20 anos atrás. Como resultado, surge Baby baby (disponível nas lojas e plataformas de streaming), álbum com 12 releituras de hits da roqueira.
 
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Para dar nova cara a algumas faixas, Lulu contou com instrumentistas como Pretinho da Serrinha e os coprodutores DJ Memê, Hiroshi Mizutani, Silva, Tranquilo Soundz (Breno LT, Marcelinho da Lua e Márcio Menescal) e Fancy Inc (Adriano Dub e Matheus Rodrigues). Assim, os sucessos de Rita ganharam elementos de música eletrônica, samba, música havaiana, funk carioca. Regravado, ele próprio, por artistas os mais diversos, Lulu Santos fala com conhecimento de causa: “A regravação afetiva e carinhosa é cheia de possibilidades”.%u2028Vindo de outro projeto de regravação de repertório a-lheio, Lulu canta & toca Roberto e Erasmo (2013), o compositor de Tempos modernos resume o sentimento de fundir a si próprio com os hits de alguém. “A sensação é de paralaxe. Se você fechar o olho, vai perceber que a mistura dos dois é que dá a profundidade. (...) No fundo, queria que todas as músicas funcionassem na pista”, revela.
 
Entrevista Lulu Santos // cantor

Você se sentiu trabalhando o repertório de uma amiga ou de uma ídola?
É muito mais a segunda coisa. O que mais me impressionou no livro é que Rita relata muito especificamente como as canções foram feitas. No caso de Fuga número 2, por exemplo, os integrantes de Os Mutantes tinham um contrato para atribuir as canções ao grupo, sem importar quem tivesse feito. E ela diz que a música foi dela. Para mim foi importante saber disso. É engraçado, porque é a canção que singulariza a Rita, mesmo dentro dos Mutantes. E eu só vim saber disso agora, a essa altura, sobre uma música de 1967. Descobri que era o que eu estava achando, mesmo. Na verdade, o disco é feito do ponto de vista do fã, do fascínio. Se o livro conta a história dela, das músicas dela, o avesso disso é a história da minha vida, onde eu estava e o que estava sentindo quando ouvi cada uma das canções. 

Ela acompanhou o processo de criação do disco?
Conheço a Rita há 48 anos, mas a gente não tem uma relação de proximidade. Nós dois temos uma natureza de personalidade reservada. Beto Lee (filho de Rita e Roberto de Carvalho) intermediou o contato. Pouco tempo depois, surgiu uma resposta do Roberto dizendo para eu fazer o que quisesse. No decorrer desses seis meses, quase tudo o que ficava pronto eu ia passando primeiro para ele dizer o que estava achando. Depois, a Rita me mandou uma mensagem super carinhosa, agradecendo, dizendo que queria me encher de beijinhos. Já estava feito. Mas, para o artista, sempre há o risco de não se sentir representado ali, naquele projeto. 

Você sabe bem como é ter as próprias canções relidas. É envaidecedor? Dá ciúmes?
No meu caso, gosto muito. Adoro quando a pessoa enfia a mão, tem outra ideia, muda tudo. Um cantor chamado Mika, que já foi do grupo Rebeldes, gravou no ano passado uma música com um sample de Aviso aos navegantes. Vários grupos sertanejos gravaram Apenas mais uma de amor, o NXZero também. A gravação afetiva e carinhosa é cheia de possibilidades. 

Rita é símbolo de ousadia e contestação. Os artistas de hoje são um tanto apáticos?
Esse espírito de contestação realmente está ausente da música popular brasileira. Talvez seja uma resposta sociológica ao tempo que a gente está passando, um tempo de dificuldade moral, então as pessoas escolhem músicas que são como um bálsamo, uma cachaça. Se conscientizar está mais difícil, se a dor é muito intensa, tudo o que você faz é esmorecer. Mas, ao mesmo tempo, isso é um pouco fruto de a gente ser da geração baby boomer, de uma geração pós-guerra, que trouxe a contestação para o cenário público. Antes, uma geração não contestava a outra, nem falava em termos de preceitos diferentes. Está no DNA da gente. 

Você também já apostou no repertório de Roberto e Erasmo. Que sensação desperta a experiência de se aventurar nos hits de outro artista?
A sensação é de paralaxe. Se você fechar o olho, vai perceber que a mistura dos dois é que dá a profundidade. (...) Quando você é autor e vê a arquitetura da composição do outro por dentro, você começa a ver as sustentações, começa a entender a forma do outro de fazer e a observar também o seu próprio trabalho a partir de outro ponto de vista.

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