Arte Detalhes de corpos viram paisagens em livro fotográfico Fotógrafa Dominique Berthé lança publicação neste sábado no forte das Cinco Pontas

Por: Júlio Cavani - Diario de Pernambuco

Publicado em: 05/03/2016 08:04 Atualizado em: 04/03/2016 17:02

Fotos sugerem relação entre paisagens naturais e corpos humanos (Foto: Dominique Berthé/ Divulgação)
Fotos sugerem relação entre paisagens naturais e corpos humanos
 
No livro Paisagem: arqueologia de uma coleção, um conjunto de 96 imagens produzidas por uma fotógrafa francesa diante da natureza e dos seres humanos de Pernambuco resulta em uma reflexão filosófica sobre as dimensões físicas e afetivas da realidade. As fotos de Dominique Berthé, associadas aos textos Maria Alice Amorim (versos) e Maria do Carmo Nino (prefácio), sugerem uma integração entre as formas e texturas do corpo, das plantas e dos minerais, que misturam-se para originar uma matéria temperada por desejos.

"Não quero simplesmente mostrar as coisas. É um trabalho de artista", diferencia Dominique, que enxerga "sensualidade" nas imagens selecionadas. "Sou um coração batendo no mundo", diz um texto de Clarice Lispector, inserido no livro. "O olho apalpa as carnes", escreve Maria Alice no poema que atravessa as páginas.

Na lógica construída pelas fotos, canaviais assemelham-se a cabelos coloridos dos foliões no carnaval. A textura do couro cabeludo recém-raspado é relacionada às plantações com a cana-de-açúcar recém-cortada. Tranças afro lembram cordas. Fendas de formações rochosas mesclam-se com órgãos humanos. Um corpo melado de lama, com pêlos petrificados, lembra a casca de uma abacaxi ou o caule espinhoso de uma planta. Sulcos provocados pela ação da água sobre as pedras viram volumes de veias sob a pele de um pulso. As analogias insinuam que os homens e mulheres não só fazem parte, mas também são constituídos das mesmas partículas moleculares do ambiente natural onde vivem.

A palavra "paisagem", mencionada no título do livro, ganha um significado expandido. "Quero mostrar que as coisas pequenas são tão importantes quanto as grandes", explica Dominique em entrevista cedida ao Viver. Para ela, um ambiente microscópico tem o mesmo valor de um campo aberto. A diferença estaria apenas no enquadramento e no recorte, seja pela lente da câmera ou pelo próprio olhar de quem vê.

A "arqueologia" estaria no gesto de selecionar as imagens do passado e dar sentido a elas, já que as fotos foram feitas ao longo de 20 anos e formam uma "coleção". Elas não foram produzidas com uma consciência de conjunto, mas reunidas e agrupadas durante o processo de elaboração do projeto, patrocinado pelo Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura). "É uma justificativa", assume Dominique. "O título é uma forma de incorporar a noção de passagem do tempo", aponta a fotógrafa para reforçar que as fotos não necessariamente devem ser entendidas como composições estáticas.

Livro tem encadernação com formato horizontal expandido. Foto: Karina Morais/Esp.DP
Livro tem encadernação com formato horizontal expandido. Foto: Karina Morais/Esp.DP

LANÇAMENTO E EXPOSIÇÃO
Paisagem: arqueologia de uma coleção será lançado neste sábado, às 16h, no Forte das Cinco Pontas (Museu da Cidade do Recife), onde 100 exemplares serão distribuídos gratuitamente. Na ocasião, as fotos serão projetadas em um telão e debatidas pelas autoras Maria Alice e Maria do Carmo e pela pesquisadora Joana D´Arc Souza Lima. O mesmo local receberá uma exposição, a partir de 14 de julho, com as imagens ampliadas e apresentadas em uma disposição diferente da presente no livro, que tem projeto gráfico assinado pelo estúdio Zolu, dos designers Aurélio Velho e Luciana Calheiros.

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