Clássico de Shakespeare, 'O Mercador de Veneza' aporta no Recife com Dan Stulbach
Com curta temporada na Caixa Cultural Recife, Dan Stulbach encarna Shylock em montagem que atualiza o clássico 'O Mercador de Veneza', de Shakespeare, e confronta os radicalismos do presente
Publicado: 24/07/2025 às 04:00

Dan Stulbach protagoniza Shylock, em adaptação de 'O Mercador de Veneza' (Foto: Ronaldo Gutierrez/Divulgação)
Poucos papéis da dramaturgia mundial contam com uma galeria tão ilustre de interpretações quanto Shylock, de O Mercador de Veneza. Escrito há mais de 400 anos por William Shakespeare, o agiota judeu já foi vivido por nomes como Al Pacino, no cinema, Sir Patrick Stewart, no teatro londrino, e o saudoso Pedro Paulo Rangel, nos palcos nacionais. Agora, é Dan Stulbach quem assume esse legado na Caixa Cultural Recife, em um texto repensado para os dias atuais. A produção entra em cartaz hoje e segue até 2 de agosto, com sessões de quinta a sábado, sempre às 20h.
Com direção de Daniela Stirbulov, a montagem transporta a história da Itália renascentista para um tempo presente. O foco se volta para Shylock, que ganha protagonismo em uma narrativa atravessada por temas como antissemitismo, racismo e disputas movidas pelo capital. Na história, o mercador Antônio oferece uma libra de carne como garantia de uma dívida, o que desencadeia um julgamento sobre justiça, poder e preconceito.
Filho de imigrantes judeus poloneses, Dan Stulbach transforma o palco em espaço de resistência contra a intolerância. “Vivemos um momento de polarizações, de radicalismos alimentados pelas redes sociais, onde as pessoas se fecham em bolhas e rejeitam, de forma cada vez mais agressiva, aquilo que as desafia”, aponta, em conversa exclusiva com o Viver. “É por isso que esse papel carrega um enorme senso de responsabilidade”, reflete ele, que iniciou sua trajetória nos palcos com a peça Peer Gynt, em 1990.
Para criar uma experiência imersiva, o centro do palco abriga uma estrutura acrílica transparente, elevada, que serve de tablado para os 12 artistas em cena. Suspenso acima deles, um painel circular de LED projeta palavras e frases ligadas à ação, além de imagens captadas em tempo real por um operador de câmera. Mas, no fim, o que realmente vai prender a plateia da Caixa Cultural pela garganta não é a tecnologia, e sim a narrativa. “De forma profunda, não simplista, deixa rastros dentro de cada pessoa que sai do teatro. É esse impacto que desejo como artista”, afirma Stulbach, também conhecido do grande público pelos seu trabalho nas novelas Mulheres Apaixonadas, Senhora do Destino e A Força do Querer.
O mesmo compromisso foi decisivo quando ele aceitou o convite de Walter Salles para viver Baby Bocaiúva, amigo de Rubens Paiva, em Ainda Estou Aqui. Para o ator, a repercussão popular superou até a premiação no Oscar. “Fico emocionado com as mensagens que recebo, os encontros na rua, o impacto que o filme causou nas pessoas. Gente que se emociona, que se vê na história, que entende a importância política daquele momento retratado”, celebra.
Momentos como esses o fazem lembrar dos tempos em que, ainda em formação, assistia e aprendia com mestres como Tony Ramos, Irene Ravache e o saudoso Paulo Autran. Anos mais tarde, não só contracenou com eles, como também consolidou uma das carreiras mais respeitadas da dramaturgia nacional. “Somos poucos, quando você conta, os atores realmente comprometidos com a arte e com o país. Mas são pessoas que acreditam em um Brasil melhor e na arte como ferramenta de transformação", diz. Agora, no palco da Caixa Cultural, seu Shylock prova que esses ensinamentos seguem vivos e mais necessários do que nunca.

