Fabiana Karla e Tânia Bondezan trazem comédia ao Santa Isabel
Peça 'Radojka – Uma Comédia Friamente Calculada' é estrelada pela pernambucana Fabiana Karla e pela paulistana Tânia Bondezan, com direção de Odilon Wagner
Pedro Cunha - Especial para o Diario
Publicado: 18/07/2025 às 06:00

( João Caldas)
A pernambucana Fabiana Karla e a paulistana Tânia Bondezan dividem o palco em um jogo cômico que, por trás das gargalhadas, escancara as dores do envelhecimento e da precarização do trabalho. Em Radojka – Uma Comédia Friamente Calculada, as duas atrizes dão vida às cuidadoras Glória e Lúcia, mulheres maduras empurradas a um dilema improvável: manter o emprego a qualquer custo, mesmo depois da morte da idosa de quem cuidavam. Em cartaz no Teatro de Santa Isabel, de hoje a domingo, o espetáculo propõe uma reflexão bem-humorada sobre os limites éticos em um mundo que marginaliza os mais velhos.
Dirigida por Odilon Wagner, a montagem brasileira do premiado texto dos uruguaios Fernando Schmidt e Christian Ibarzabal preserva a estrutura clássica da comédia. Na trama, Radojka já está morta quando Glória e Lúcia, temendo perder o emprego, escondem o corpo e se enredam em situações absurdas que testam sua moral e ética. Com ritmo ágil e cheio de reviravoltas, a peça diverte enquanto faz refletir. A cenografia, em formato gabinete, recria com detalhes um apartamento intimista, ampliando a imersão do público.
“O humor é uma das melhores formas de fazer as pessoas refletirem sobre os problemas da sociedade”, acredita Tânia Bondezan, que imprime leveza e cumplicidade à personagem. “Eu adoro quando o público ri e, ao mesmo tempo, se pega pensando: ‘será que eu faria diferente?’. É isso que me move no teatro: divertir, provocar e, de algum jeito, transformar”.
Para ela, a peça cumpre seu papel não só por fazer rir, mas também por provocar uma autocrítica no público sobre ética. “Eu acredito que a plateia, depois de se sorrir muito, sai pensando até que ponto a gente chega para conseguir o que quer”, reflete. “As personagens são testadas na sua moralidade, e o público se vê refletido nisso e acaba se perguntando a mesma coisa. É esse espelho que a comédia coloca diante da gente que eu acho fascinante. A gente ri das situações absurdas, mas, no fundo, são escolhas que poderiam ser nossas”.
Fabiana Karla define a montagem como um desafio e se orgulha de ter impresso sua marca pessoal à personagem, equilibrando irreverência com a sofisticação que a trama pede. Ela, que se aproxima dos 50 anos, diz que a peça também é uma oportunidade para discutir o etarismo, que ainda permeia as artes e, sobretudo, a televisão, onde a pressão estética e a escassez de bons papéis para mulheres maduras são mais evidentes.
“É um movimento cruel, que ainda trata o envelhecimento quase como uma sentença. Na TV, sentimos muito isso, a pressão estética e a dificuldade de encontrar personagens que não sejam estereotipadas com a idade que temos. Já o teatro, para mim, é um lugar que liberta. No palco, esse etarismo parece passar longe. Somos julgados pelo que entregamos em cena, pela emoção, pela jogo artístico”, opina a pernambucana.
A emoção de se apresentar em casa, confessa Fabiana, se soma à expectativa diante do público exigente e caloroso. “Pernambuco é um caldeirão fervoroso, um celeiro potente de arte. Sempre fico com o coração saindo pela boca quando piso em um palco do Recife”, admite ela, que espera ver família e amigos na plateia e sente a responsabilidade redobrada: “O público recifense tem um crivo alto, mas ama, se diverte, vibra.”
Desde sua estreia em 2016, em Montevidéu, Radojka percorreu palcos da América Latina, Europa e Estados Unidos. No Brasil, a primeira temporada estreou em março do ano passado, com Marisa Orth dividindo a cena com Tânia. “O convite para montar essa obra veio diretamente do autor Fernando Schmidt”, conta a atriz, que também assina a produção. “Ri muito já na primeira leitura, fiquei encantada com a inteligência do texto e comecei a traduzi-lo imediatamente. Quando mostrei ao Odilon, ele se apaixonou pela peça e topou dirigi-la”, conta.
No palco do Teatro de Santa Isabel, ela e Fabiana prometem conduzir a narrativa entre gargalhadas e introspecção, reafirmando a arte como um espaço de diálogo sobre temas mais que nunca urgentes da sociedade.



