Julgamento no STF começa com reforço de tese de trama de golpe e pedido de rescisão de delação
A avaliação é da professora de Direito Constitucional Adriana Rocha Coutinho
Publicado: 02/09/2025 às 22:44

Dia 1 do julgamento da Trama Golpista (Foto: Gustavo Moreno/STF)
O primeiro dia de julgamento dos acusados do núcleo 1 da trama golpista no Supremo Tribunal Federal teve início com uma reafirmação da tese central da acusação: a de que houve uma tentativa concreta de golpe de Estado no país, segundo a avaliação da professora de Direito Constitucional, Adriana Rocha Coutinho.
A acusação apresentada pelo Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, na fala da professora, se mostrou “sólida e bem estruturada”, mesmo sem trazer fatos novos em relação ao que já era conhecido no processo construído com base em documentos e delações.
Para Adriana, a apresentação da peça acusatória foi “dentro do esperado” e teve como objetivo confirmar a coerência do Ministério Público com a tese já apresentada.
As estratégias escolhidas pelas defesas dos réus, por outro lado, variaram bastante, de acordo com a professora. Para ela, algumas, como a de Mauro Cid, foram vistas como bem articuladas; outras, como a de Alexandre Ramagem, conduzida por Paulo Cintra, deixaram a desejar do ponto de vista técnico. A professora também ressaltou o estilo “teatral” do advogado Demóstenes Torres, que defende Almir Garnier e elogiou os ministros do Supremo, numa tentativa “clara” de evitar embates com a Corte.
“Essa estratégia, na verdade, é uma resposta à própria fala de Alexandre de Moraes, que já iniciou o processo ressaltando a importância da defesa, não só da democracia, mas do próprio Supremo Tribunal Federal. O que é que fizeram os advogados? ‘Vamos elogiar a Corte’”, aponta.
Adriana avaliou a defesa de Mauro Cid, que centrou seus esforços na manutenção do acordo de delação premiada. Segundo a professora, essa foi a escolha “correta”, “reforçando a tese do golpe e preservando os benefícios do colaborador”.
De acordo com Adriana, o foco da defesa em proteger o acordo também reforça a existência de materiais concretos contra os acusados, enfraquecendo tentativas dos demais advogados de negar a existência de um plano golpista.
Individualização de condutas
Adriana também destacou a importância da individualização das condutas por parte do STF. Na sua avaliação, um dos grandes desafios da Corte será “ter o cuidado de individualizar cada uma das condutas, sob pena realmente de aparentar um equívoco”. Nesse ponto, a professora reforça que o julgamento não pode tratar todos os réus de forma “indistinta”, o que poderia comprometer a legitimidade da decisão.
Para a especialista, o primeiro dia de julgamento teve um bom ritmo de andamento, mesmo “morno” em termos de novidade, mas com “respeito ao devido processo legal”. Contudo, Adriana avalia que uma eventual surpresa pode vir de pedidos de vista ou alegações formais por parte das defesas. Nesse cenário, a atenção retorna para como os ministros irão reagir.
“Ainda que as defesas não tenham apresentado nada substancialmente novo, o processo caminha para momentos mais tensos, principalmente com a análise do papel de Bolsonaro na trama golpista”, avalia Adriana.
Expectativas para o segundo dia
A expectativa para o segundo dia está nas defesas dos generais e principalmente na estratégia que será usada em defesa de Jair Bolsonaro. Para a professora, existe a expectativa de observar como os advogados do ex-presidente tentarão lhe dissociar da responsabilidade pelos atos, sem confrontar diretamente o STF, tática adotada pela defesa no primeiro dia.
“Estamos aguardando a fala dessa defesa de Bolsonaro, como é que essa defesa vai tentar destruir essa responsabilidade do ex-presidente Bolsonaro sem atacar o Supremo Tribunal Federal”
A ausência de Bolsonaro no julgamento, para Adriana, é vista como uma “estratégia muito pensada”, com o objetivo de “desmobilizar a atenção pública” e manter a narrativa de que o julgamento já estaria decidido.
“Ele não comparecer é uma estratégia, também, para desmobilizar a tensão do julgamento. Tudo isso é bem pensado para depois dizer que não foi para o julgamento porque pode construir o discurso político que não acreditava, que ia ser condenado de qualquer jeito”, avalia.
Possibilidades das defesas
Adriana especula que a defesa dos generais Augusto Heleno e Braga Netto pode trazer novos elementos, como o questionamento da competência do STF para julgá-los, uma vez que ambos são militares. Ela observa que os advogados de Augusto Heleno podem seguir a linha, argumentando que “isso é um fato novo na história do Brasil” e que os militares talvez devessem ser julgados pela Justiça Militar. Além disso, há possibilidade do questionamento do julgamento ter ocorrido por Turma e não pelo Plenário.
Para a professora, o que está em jogo, além da responsabilização penal de acusados, é a reafirmação da solidez das instituições democráticas diante da conspiração de golpe desde a redemocratização, como defendeu o relator Alexandre de Moraes.
“Os ministros passam, mas o STF tem que permanecer. Não vamos confundir as instituições com seus representantes temporários. Então, acho que é isso que tá faltando também nessa compreensão desse julgamento. Mas é um fato histórico, é um momento único”, pontua.

