Educação

Parceria entre Pernambuco e Alemanha é ponte para quem quer estudar e pesquisar na Europa

Na última década, a relação do país com os estados brasileiros se estreitou e criou oportunidades para quem busca qualificação de alto padrão internacional

Publicado em: 07/01/2018 14:00 | Atualizado em: 04/01/2018 21:26


Um símbolo da qualidade científica do país é o terceiro lugar entre as nações ganhadoras de prêmios Nobel. Foto: Markus Scholz/Leibniz Association.

Mais de oito mil quilômetros e um oceano separam Pernambuco da Alemanha. A distância, porém, está mais curta para os pernambucanos nos últimos anos, principalmente se a “ponte” para o país europeu for a educação. De olho na produção científica do mundo e de portas abertas para estudantes de ensino médio, universitários e de pós-graduação, a nação, com sua tradição em pesquisa e produção de conhecimento, está no topo da concorrência internacional pelas “melhores cabeças” do mercado educacional e científico.

Na última década, a relação do país com os estados brasileiros se estreitou e criou oportunidades para quem busca qualificação de alto padrão internacional. Em Pernambuco, a Alemanha tem investido na formação de alunos da rede pública e criado parcerias inéditas. Desde 2008, por exemplo, o idioma alemão faz parte da grade curricular de estudantes do Ginásio Pernambucano. Em fevereiro, os primeiros alunos da rede pública selecionados para fazer intercâmbio de um semestre letivo em escolas alemãs pelo Programa Ganhe o Mundo embarcam rumo a Berlim. Além das unidades do GP, outras três escolas passarão a oferecer em 2018 o alemão como opção de segunda língua.  

O caminho inverso também é feito. Só no ano passado, 11 estudantes alemães cursaram um semestre na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), nas graduações de pedagogia, geografia, ciência da computação, história, letras, ciências sociais, administração e física. Em 2017, cinco alunos - quatro de direito e um de engenharia mecânica - foram estudar na Alemanha. Para este ano, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) tem sete convênios válidos com instituições de ensino superior alemãs e três em fase de assinatura. São novas oportunidades para levar pernambucanos a um dos principais polos de pesquisa e formação acadêmica do mundo.

Um símbolo da qualidade científica do país é o terceiro lugar entre as nações ganhadoras de prêmios Nobel, com mais de 100 condecorações nas áreas de química, física, medicina, literatura, ciências econômicas, além de cinco prêmios Nobel da Paz. Bem posicionada também nos principais rankings internacionais de educação e competitividade, a Alemanha tem muito a nos ensinar em relação à organização do sistema educacional e em termos pesquisa e inovação. O Diario, único jornal não-europeu convidado para a missão “Alemanha: um lugar para estudar e pesquisar”, esteve no país e, durante uma semana, visitou universidades, centros de pesquisa e órgãos de fomento à produção científica nas cidades de Berlim e Jena.

Polo de conhecimento atrai estrangeiros
Depois de ter concluído o ensino médio em Americana, São Paulo, Gérson enviou candidaturas a duas universidades alemãs. Foto: Gérson Zilio/Arquivo Pessoal.

Com uma densa rede de 428 escolas superiores e universidades, a Alemanha é o país em que o inglês não é idioma oficial mais procurado por estudantes de todo o mundo. Só os Estados Unidos e a Grã-Bretanha conseguem atrair mais alunos internacionais. Desde 2011 o total de estudantes estrangeiros aumentou cerca de 20%, principalmente graças às políticas de incentivo e o crescimento do interesse pelo idioma alemão. Hoje, o número de estudantes de ensino superior estrangeiros na Alemanha é o dobro da quantidade registrada em 1996.

A ampla isenção de taxas é uma das principais vantagens das instituições de ensino superior alemãs. Juntos, os governos dos 16 estados e a Federação atuam pela expansão da formação acadêmica por meio do Pacto para Escolas Superiores 2020, criado para financiar 760 mil cursos até 2023. A importância da Alemanha para a União Europeia e para o mundo é outro fator que atrai estudantes estrangeiros.

Foi o que motivou o brasileiro Gérson Domingos Zilio, 22 anos, a optar por fazer o curso superior na Alemanha. Depois de ter concluído o ensino médio em Americana, São Paulo, onde morava, enviou candidaturas a duas universidades alemãs. Foi aprovado em ambas. No entanto, como as notas do ensino médio brasileiro não são reconhecidas no país europeu, precisou revalidar a “ficha 19”. “Após um ano de intercâmbio, me fascinei pelo modo alemão de resolução de problemas, muito mais pragmático do que o brasileiro. A escolha foi feita principalmente com base no atual peso geopolítico da Alemanha no sistema internacional”, conta.

Apesar de ter ficado encantado pelo país e pela cidade de Jena, onde vive atualmente, o estudante do terceiro semestre de ciências políticas e história pretende voltar ao Brasil. “Ao retornar, vou seguir estudando. Tenho como meta um dia trabalhar no Ministério das Relações Exteriores brasileiro, ou seja, o retorno ao Brasil é uma etapa imprescindível para a minha realização profissional”, diz.

Gérson estuda na Universidade Friedrich Schiller de Jena, no estado de Turíngia. Karl Marx, Arthur Schopenhauer e Ernst Abbe também estudaram na instituição visitada pelo Diario em novembro. Friedrich Hegel foi professor de ciências filosóficas na universidade entre 1801 a 1806. Com 18,4 mil estudantes, 8,3 mil funcionários e 3 mil professores, a Friedrich Schiller de Jena tem campus, centros acadêmicos, laboratórios e bibliotecas espalhados por toda a cidade.

A universidade, uma das dez mais antigas da Alemanha, dá vida à Jena, considerada a cidade da ciência. De seus cerca de 100 mil habitantes, aproximadamente 25 mil são estudantes e 20 mil funcionários de instituições de ensino e pesquisa. Desses, 6% são estrangeiros. “Temos um programa de auxílio para alunos de fora da União Europeia para registro, questões relacionadas à saúde e também questões legais”, explica a vice-diretora administrativa da Graduate Academy da Universidade de Jena, Hanna Kauhaus.

A quem também tem interesse em estudar na Alemanha, Gérson recomenda muita força de vontade e persistência. “A língua alemã certamente não está entre as mais fáceis de se dominar, mas, após algum tempo de muito estudo e dedicação, ela se torna parte da personalidade da pessoa. Passado o começo, que pode ser muito difícil, a experiência de estudar na Alemanha se torna muito gratificante”, ressalta. 

Diferentes instituições formam o ensino superior alemão
As universidades alemãs não são vistas apenas como local de ensino, mas também de pesquisa. Foto: Anne Günther/FSU.

O ensino superior alemão tem atraído cada vez mais estudantes estrangeiros. Para estudar na Alemanha, porém, o primeiro passo é entender as diferentes entidades que conferem diplomas de graduação. A educação superior alemã é composta basicamente de três tipos de instituições. As nomenclaturas variam de acordo com a estrutura e a missão. São elas: universidades, escolas superiores e escolas superiores de ciências aplicadas.

Enquanto as universidades clássicas oferecem todo o leque de cursos, as universidades técnicas (TU, na sigla em alemão) se concentram em pesquisas de base nos cursos de engenharia e ciências naturais.  As universidades alemãs - clássicas e TUs - não são vistas apenas como local de ensino, mas também de pesquisa. Elas têm como principal objetivo o fomento de novas gerações de pesquisadores, o ensino de conhecimentos específicos e a formação de cientistas autônomos no trabalho e na pesquisa. As escolas superiores, por sua vez, são voltadas a áreas específicas, como educação, administração pública e artes, por exemplo.

Já as 217 escolas superiores de ciências aplicadas (FH), com viés prático, são uma especialidade alemã. Atualmente, o país discute a possibilidade de as FHs terem o direito de conferir títulos de doutor, até agora um privilégio das universidades.

O caráter prático é muito forte na educação alemã, presente desde o ensino secundário. Hoje, o ensino técnico é o grande motor da economia alemã, mas foi em 1970, com a fundação do Instituto Federal de Formação Profissional (Bibb), que as mudanças começaram. O órgão, ligado ao Ministério da Educação e Pesquisa, é composto por membros de associações patronais, sindicatos de trabalhadores e representantes estatais. Juntos, eles criam e atualizam currículos, elaboram regulamentos e verificam se o aluno está recebendo a educação adequada para o mercado de trabalho.

Se por um lado o ensino técnico incentivado desde cedo reflete em bons resultados na economia, por outro há questionamentos sobre a eficácia do sistema. Isso porque o desempenho escolar alemão melhorou nos últimos anos nas disciplinas de exatas e biológicas, mas piorou na habilidade de leitura e compreensão de texto. Outro debate travado no país é a discrepância entre os estados (länder em alemão), que geram uma desigualdade educacional no país. Os estados do sul da Alemanha têm, por exemplo, melhores desempenhos em avaliações internacionais do que os demais. É por isso que alguns educadores germânicos defendem uma maior cooperação entre estados e União para uma formação escolar mais individualizada.

Excelência em pesquisa beneficia o país
A Alemanha stá entre os poucos países que investem mais de 2,5% do seu PIB em pesquisa e tecnologia. Foto: FaunhoferSociety/Divulgação.

A posição de liderança em exportação de produtos de alta tecnologia, com mais de 10% do mercado mundial, tem uma razão. A Alemanha investe fortemente em inovação. Está entre os poucos países que investem mais de 2,5% do seu PIB em pesquisa e tecnologia. O estudo Innovation Union Scoreboard 2015, da Comissão Europeia, colocou o país, juntamente com a Suécia, Dinamarca e Finlândia, no “grupo top” dos líderes em inovação da União Europeia.

Orgulhoso da posição de destaque mundial, o Ministério das Relações Exteriores do país convoca periodicamente representantes de setores ligado à educação e às ciências de todo o mundo para conhecer o polo tecnológico alemão. Em 2017, o tradicional programa de visitas promovido pelo governo alemão, existente há quase 60 anos e que leva autoridades, especialistas e jornalistas para conhecer o país, contou com a presença do Diario, único jornal com sede fora da Europa a ser convidado.

A base do polo de pesquisa alemão é formada pelas escolas superiores e principalmente pelas quatro grandes instituições de pesquisa extra-universitária do país: a Sociedade Max Planck (MPG), a Sociedade Fraunhofer, a Associação Leibniz e a Comunidade Helmholtz. O Diario visitou as três primeiras. A primeira parada foi na sede da Associação Leibniz, em um moderno prédio na rua Chausseestraße, no coração de Berlim, reconstruído no pós-guerra.

Em 1948, o imóvel estava destruído. Quatro anos depois, a Câmara de Comércio e Indústria da Alemanha contratou o arquiteto Johannes Pässler para demolir as ruínas. O novo edifício de escritórios da associação foi concluído em 1957. Sob o slogan “Teoria com prática: ciência para o bem e em benefício das pessoas”, a Leibniz reúne 89 instituições autônomas de pesquisa.

As áreas de atuação vão desde as ciências biológicas, ambientais e as engenharias, passando pelas ciências econômicas, sociais e regionais até as ciências humanas. “Nossos institutos atuam diretamente ligados a universidades e outros parceiros na realização de pesquisas em diversas áreas. Com o Brasil, por exemplo, sei que temos pesquisas relacionadas ao zika vírus. Nesta e em outras áreas, temos parceiros no Brasil e estamos interessados em aprofundar a cooperação com o país”, pontua a representante do escritório de Assuntos Internacionais da associação, Almuth Wietholtz-Eisert.

Jena, o berço da indústria óptica. Foto: Jan-Peter Kasper/Divulgação.
A 270 km da sede da Associação Leibniz em Berlim, o Diario visitou um dos principais prédios da Sociedade Fraunhofer: o Instituto Fraunhofer de Óptica Aplicada e Engenharia de Precisão. O centro de pesquisas fica na cidade de Jena, que tem uma longa tradição em óptica e fotônica e é considerada o berço da indústria óptica na Europa.

Na cidade, também fica o Instituto Max Planck de Ecologia Química. Lá, 68 estudantes de doutorado - sendo 50% de fora da Alemanha - desenvolvem pesquisas que investigam interações ecológicas com técnicas moleculares, químicas e neurobiológicas. “A Alemanha tem uma tradição importante em ciências. Aqui, estimulamos os nossos alunos a fazerem pesquisa de ponta para, depois, levar os conhecimentos adquiridos também para seus países de origem”, ressalta o professor norte-americano Jonathan Gershenzon, membro e diretor do Departamento de Bioquímica do Instituto Max Planck desde 1977 e professor honorário na Universidade Friedrich Schiller de Jena desde 1999.

Depoimentos:

A Alemanha é um lugar bem interessante, bem diferente do Brasil. Tudo muito organizado e limpo, mas os alemães podem ser um pouco frios. A mudança do tempo durante o inverno também é uma coisa que você demora um pouco para se acostumar. A minha razão principal para trabalhar nesse laboratório (no Instituto Max Planck de Ecologia Química em Jena) foi porque é um dos melhores nessa área de ecologia molecular. Na minha experiência, a grande diferença entre o Max Planck e pelo menos a maioria das instituições brasileiras é a questão do dinheiro. Aqui não é necessário pensar em dinheiro como uma limitação fundamental da pesquisa. É claro que o alvo não é só gastar por gastar ou ser irresponsável, mas raramente acontece de uma questão científica ser abandonada por causa de dinheiro. Não sei ainda aonde vou parar, mas gostaria de voltar para o Brasil e ajudar a fazer esse tipo de conexão entre instituições de pesquisa brasileiras e estrangeiras, porque acho que é uma das coisas mais importantes para o desenvolvimento da pesquisa e dos estudantes brasileiros que querem ser pesquisadores.

Henrique Fernandes de Aguiar Valim, 26 anos, doutorando natural de Araras (SP)


Moro em São Carlos (SP) e estou na Alemanha desde agosto de 2017. Fico aqui até julho de 2018. Trabalho com o desenvolvimento de processos para transformar resíduos de colheita em produtos químicos de alto valor, como combustíveis e plásticos. Atuo em um grupo de pesquisa que trabalha com um tema bastante diferente do que faço, porém com grandes chances de colaboração. Consegui montar a infraestrutura que preciso para desenvolver minha pesquisa e estou tendo a oportunidade de desenvolver vários projetos paralelos. Consegui a bolsa me inscrevendo no edital CAPES-Humboldt, organizado conjuntamente pela CAPES no Brasil e pela fundação Alexander von Humboldt na Alemanha. Para quem tem interesse em fazer pós-graduação aqui, sugiro que primeiramente entre em contato com um grupo de pesquisa. Em seguida, procure os editais do DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico) ou Humboldt. Sobre pesquisa no Brasil e na Alemanha, acredito que a principal diferença esteja em uma maior valorização dela na Alemanha, que se reflete em um maior investimento do governo.

Jean Marcel Ribeiro Gallo, 36 anos, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)


Centro cultural divulga legado alemão no Recife
O diretor do CCBA, Cristoph Ostendorf, explica que, além dos cursos de alemão, o centro promove atividades culturais. Foto: Thalyta Tavares/ Esp.DP.

“Seguidamente sinto uma amarga dor ao pensar que o povo alemão, tão honorável individualmente, é tão miserável coletivamente. A comparação do povo alemão com outros povos desperta em mim um sentimento penoso, do qual trato de escapar como posso.” A frase, do poeta Johann Wolfgang von Goethe, parece ter profetizado a situação vivida pela Alemanha no período da Segunda Guerra Mundial. Devastado por bombardeios e com uma imagem manchada diante do mundo, o país buscou, no período posterior à guerra, se reerguer e melhorar as impressões das outras nações sobre ele.

Parte dessa empreitada foi a criação de centros que divulgassem a cultura e o idioma alemão em todo o mundo. No Recife, essa é a missão do Centro Cultural Brasil-Alemanha (CCBA), uma associação civil sem fins lucrativos, fundada em 1990, a partir de uma iniciativa de ex-bolsistas da Alemanha, do Instituto Goethe, do Consulado Geral da República Federal da Alemanha no Recife e do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD).

O centro, localizado no número 364 da Rua do Sossego, no bairro da Boa Vista, funciona não apenas como uma escola de alemão, mas se define como um “espaço de participação ativa das pessoas com atividades nas áreas de ensino das línguas alemã e portuguesa; diálogo cultural; intercâmbio acadêmico e científico e cooperação econômica entre o Brasil e a Alemanha”.

O diretor do CCBA, Cristoph Ostendorf, explica que o centro promove atividades culturais, como exibições de filmes, realiza projetos nas áreas de meio ambiente, sustentabilidade e aviação civil, além de dar orientações gerais a brasileiros e a alemães que vivem em Pernambuco sobre trabalho, casamento, intercâmbio e outras questões. “Temos uma preocupação grande com temas como democracia, participação e sociedade civil”, afirma.

O braço mais lembrado do centro, porém, continua sendo o de ensino da língua alemã. Hoje, 30 turmas e um total de aproximadamente 300 alunos estudam o idioma no CCBA. O público majoritário é de pessoas com idades entre 18 a 25 anos e com formação superior ou que estão estudando em um curso de graduação. “O ensino de alemão para estrangeiros é uma política pública da Alemanha. Existe um esforço muito grande para melhorar esse ensino em todo o mundo”, frisa.

O universitário Guilherme Carvalho, 21 anos, é um dos alunos do curso de alemão do CCBA. “Eu já tinha feito inglês e estava procurando um segunda língua estrangeira. Achei que o alemão era uma opção menos óbvia, já que a maioria dos meus colegas faziam espanhol ou francês”, explica o estudante que sonha em se mudar para Hanover e de conhecer Berlim e Munique. 

Serviço:
CCBA
Endereço: Rua do Sossego, 364, Boa Vista, Recife
Telefone: (81) 3421.2173
Site: www.ccba.org.br

Herança alemã no Recife
Além do ensino de alemão, o CCBA tem como objetivo preservar a história de alemães na cidade. O centro cultural ajudou o Diario a fazer um resgate do legado alemão no Recife. Confira:

1. O alemão que descreveu a natureza brasileira
Nascido na Saxônia em 1610, o alemão Georg Marcgrave estudou botânica, matemática, medicina e astronomia. Viajou para o Brasil em 1638, onde trabalhou até 1641 e chamou a atenção do conde Maurício de Nassau. Participou de cinco expedições para fazer observações e anotações sobre história natural, astronomia e cartografia. Das expedições, voltava ao Recife trazendo coleções de plantas herborizadas, peles e penas de animais, além de exemplares “empalhados” ou vivos e enjaulados para os viveiros dos jardins de Nassau. Com o neerlandês Guilherme Piso, foi responsável pelas primeiras publicações científicas sobre a geografia e natureza do Brasil.

2. O fotógrafo alemão que revelou a escravidão no Recife
Em 1866, o alemão Alberto Henschel desembarcou no Porto do Recife. Um anúncio publicado no Diario de Pernambuco revela que, inicialmente, ele se instalou no ateliê de Júlio dos Santos Pereira, na Rua do Imperador. Depois, o jornal registrou um novo endereço, de um estúdio próprio, o Fotografia Alemã, no sobrado número 2 do Largo da Matriz de Santo Antônio. Com estúdios também em Salvador e São Paulo, Henschel não se limitou a fazer retratos da nobreza, dos comerciantes e de quem tinha dinheiro. Também registrou os negros, livres ou escravos, em um período anterior à Lei Áurea. Hoje, as imagens integram a coleção Brasiliana Fotográfica, disponibilizadas graças a um convênio do Instituto Leibniz com o Instituto Moreira Salles.

3. O pintor que contou a história do Recife em vitrais
Heinrich Moser foi um pintor, ilustrador e arquiteto alemão que introduziu a técnica dos vitrais no Recife. O trabalho dele, um dos fundadores da Escola de Belas Artes no Recife, em 1932, tem como característica a delicadeza. É autor de vitrais espalhados em vários pontos da cidade, como o Palácio da Justiça, a Basílica de Nossa Senhora do Carmo, o Clube Internacional do Recife e o prédio do Derby da Fundação Joaquim Nabuco. Também é de sua autoria o vitral colorido instalado no alto da escada do hall de entrada do Palácio do Campo das Princesas, que lembra a Revolução Pernambucana de 1817. Confeccionados na técnica tradicional, os vidros foram pintados à mão e foram feitos especialmente para compor os vitrais.

4. Quando o Recife viu o zepelim
De passagem pelo Recife, o dirigível Graf Zeppelin – que fez voos regulares para a capital pernambucana entre 1930 e 1937 – sobrevoou a antiga sede do Diario de Pernambuco, na Praça da Independência. Até a chegada do  “charuto alemão”, no dia 22 de maio de 1930, o Diario já apresentava a importância de o Recife ser incluído numa rota que fazia a ligação entre a Europa e os Estados Unidos. É na capital pernambucana que está de pé a única torre de atracação destas aeronaves que competiam com os aviões no transporte de pessoas por largas distâncias. Na França e na Alemanha, dirigíveis mais modernos e seguros continuam em atividade.

5. Um clube para a comunidade alemã
Por causa da Segunda Guerra Mundial, milhares de alemães se mudaram para o estado. Nesse contexto foi fundado, em 25 de setembro de 1920, o Clube Alemão de Pernambuco, um espaço para germânicos compartilharem cultura e tradições. Quando foi inaugurado, era frequentado por 52 pessoas. O objetivo era estimular a boa convivência entre os sócios alemães, seus familiares e descendentes, mas, depois, as portas foram abertas a sócios brasileiros, que são maioria atualmente. Desde a década de 1960, o clube sedia a Oktorberfest da capital pernambucana, festival de cerveja de Munique, que foi criado pelo rei bávaro Ludwig 1 para celebrar seu casamento em 1810.

Ensino de alemão é realidade na rede pública estadual
As unidades da Rua da Aurora e da Avenida Cruz Cabugá GP foram as primeiras escolas públicas do estado a oferecer o idioma aos estudantes. Foto: Julio Jacobina/DP.

Há 10 anos, o idioma alemão faz parte do dia a dia dos estudantes da Escola de Referência em Ensino Médio Ginásio Pernambucano. A inclusão da língua no currículo escolar de uma escola pública é pioneira no Nordeste e resultou de uma parceria entre o Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, o Instituto Goethe, o Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD) e o governo de Pernambuco, com apoio do Centro Cultural Brasil-Alemanha (CCBA).

As unidades da Rua da Aurora e da Avenida Cruz Cabugá GP foram as primeiras escolas públicas do estado a oferecer o idioma aos estudantes. Também foi pioneira no Nordeste e a segunda do Brasil a participar do programa Escolas: uma parceria para o futuro (Pasch, na sigla alemã). A professora responsável pelo programa no Recife, Adriana Carneiro, destaca que o objetivo do Pasch vai além de ensinar alemão. “Temos o objetivo de fazer com que os alunos de destaque estudem em universidades alemãs”, ressalta. Após a conclusão das aulas oferecidas nas escolas, os alunos ficam aptos a conseguir o certificado Fit In Deutsch I, primeiro reconhecimento de domínio da língua.

Para ingressar nas turmas, com aulas nas terças, quartas e sextas-feiras, o aluno interessado precisa escrever uma carta dizendo por que quer estudar o idioma. “A cada ano, mais pessoas se interessam em aprender o alemão. O domínio da língua é uma grande vantagem no mercado de trabalho. O idioma também é importante nas ciências. Saber alemão torna muitas obras literárias e filosóficas acessíveis, como as de Goethe, Schiller, Immanuel Kant e Freud”, diz a cônsul-geral da Alemanha no Recife, Maria Könning-de Siqueira Regueira.

Por meio do Pasch, os estudantes da rede pública de ensino aumentam a chance de viajar em um intercâmbio financiado pelo governo alemão. Além do programa Ganhe o Mundo, o próprio Pasch leva estudantes para a Europa. O período e os objetivos da viagem, porém, são diferentes. Enquanto no Ganhe o Mundo são seis meses para estudar em uma escola regular, no Pasch são 20 dias para conhecer mais a cultura e história do país.

Neste sábado, o estudante do GP Melksedec da Silva, 16, viaja para Frankfurt pelo Pasch. “Nunca viajei de avião. Estou feliz e nervoso”, conta. Antes de viajar, ele recebeu o incentivo das colegas Renata Cheron, 17, e Melissa Martins, 16, que já viajaram para a Alemanha. “Essa experiência não é só importante para o currículo, mas para a vida”, diz Renata. “Vivi 21 dias maravilhosos em Schwäbisch Hall, no estado de Baden-Württemberg. Conheci muitos museus, pontos históricos e pessoas de vários países”, completa Melissa.

Ganhe o Mundo leva alunos para a Alemanha
Ian Rendrick, 17 anos, integra o grupo dos cinco estudantes selecionados para a primeira turma a embarcar para a Alemanha. Foto: Julio Jacobina/DP.
A partir deste ano, a Alemanha passou a fazer parte das opções de destinos do Ganhe o Mundo, programa de intercâmbio do governo do estado. Em 2017, cinco estudantes foram selecionados e embarcam em fevereiro para a cidade de Berlim. Os alunos, todos oriundos do programa Pasch do Ginásio Pernambucano, participarão do programa internacional de intercâmbio no DID Deutsch-Institut.

A rede estadual vai ampliar de duas para cinco o número de escolas que oferecem o alemão como opção de segunda língua. Ao todo, serão 100 vagas para o curso do idioma. São elas: as escolas de Referência em Ensino Médio Ginásio Pernambucano (que já oferece o curso desde 2008), na Rua da Aurora, bairro da Boa Vista, o Ginásio Pernambucano (com aulas de alemão desde 2016) da Avenida Cruz Cabugá, em Santo Amaro; Joaquim Távora, na Torre; Silva Jardim, no Monteiro, e Ageu Magalhães, em Casa Amarela.

Os intercambistas estudam até um semestre letivo (dependendo da modalidade do programa) em escolas de ensino médio com direito a seguro saúde internacional, passagens aéreas, acomodação em casas de família, refeições, além de receberem bolsas mensais. Desde a primeira edição do PGM, em 2012, mais de seis mil estudantes realizaram o sonho do intercâmbio internacional.

Ian Rendrick, 17 anos, integra o grupo dos cinco estudantes selecionados para a primeira turma a embarcar para a Alemanha. Matriculado no terceiro ano do ensino médio do Ginásio Pernambucano, unidade Aurora, ele conta que se dedicou bastante para encarar a seleção. “Estudei no Pasch por um ano e nove meses e também reforçava em casa. A expectativa para a viagem está grande. Espero me adaptar rápido e conhecer mais da cultura alemã”, revela o estudante, leitor voraz de obras de filósofos alemães. “Já estou com o passaporte em mãos e organizando a mala com muitos casacos, pois vou pegar o inverno lá. Agora é só embarcar”, completa.

Entrevista >> Frederico Amancio, secretário de Educação de Pernambuco

Indicado pelo Consulado Geral da República Federal da Alemanha para participar de uma missão do Ministério das Relações Exteriores no país, o secretário de Educação de Pernambuco, Frederico Amancio, visitou, de 6 a 10 de novembro de 2017, escolas, universidades, centros de pesquisa e órgãos alemães relacionados à educação. Acompanhado da superintendente do Ganhe o Mundo, Renata Serpa, conheceu o sistema educacional que vai receber estudantes pernambucanos a partir de fevereiro. Em entrevista ao Diario, contou o que a Alemanha tem a nos ensinar.

Pernambuco foi um dos estados brasileiros a participar de uma missão do governo da Alemanha sobre educação. Como foi a viagem?
A missão que participei, com Renata Serpa (superintendente do Programa Ganhe o Mundo), foi organizada pelo Instituto Goethe, uma instituição alemã que divulga pelo mundo a língua e a cultura alemã. Essa missão é organizada anualmente com pequenos grupos de convidados para mostrar um pouco sobre o funcionamento do sistema educacional alemão. Por indicação do Consulado da Alemanha no Recife, recebemos o convite. Ficamos muito honrados de sermos os únicos representantes de um estado do Nordeste do grupo. Além da Secretaria de Educação de Pernambuco, estavam presentes representantes das secretarias de Educação dos estados de Santa Catarina, Paraná e São Paulo e dos municípios do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte. Os estados do Sul e São Paulo já tem uma forte tradição em relação ao ensino do idioma alemão. O convite veio em paralelo a um interesse que já existia de estreitar relações com o país, por meio do Ganhe o Mundo.

A viagem teve algum tema específico? O que vocês visitaram no país?
Este ano o tema foi a questão do bilinguismo. A Alemanha quis mostrar a importância desse assunto, pois tem um protagonismo muito forte na comunidade europeia e no contexto educacional como um todo. Um dos focos da educação alemã é o multilinguismo, pois as escolas não trabalham apenas com uma língua essenciais. São dois idiomas obrigatórios, o alemão e o inglês, mais um terceiro eletivo. O inglês faz parte dos exames básicos de avaliação educacional na Alemanha. Aqui no Brasil as avaliações básicas testam os conhecimentos dos estudantes em língua portuguesa e em matemática. Lá, as provas são de alemão, inglês e matemática. Outra questão muito mencionada foi o que eles chamam de “choque do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, principal avaliação internacional aplicada a alunos de 15 anos, em três áreas-chave: ciências, matemática e leitura)”. Por ser um dos países mais ricos do mundo e ter relação forte com inovação e tecnologia, achavam que tinham as melhores escolas, mas quando o Pisa começou a ser aplicado não conseguiram bons resultados. Eles avançaram, mas ainda não estão entre os dez primeiros do mundo (de uma forma geral, o desempenho escolar alemão melhorou nas disciplinas de exatas e biológicas, mas piorou na habilidade essencial de leitura e compreensão de texto). A missão durou cinco dias e visitamos as cidades de Düsseldorf, Essen, Bonn e Berlim. A programação incluía visitas a órgãos, escolas e universidades para entendermos o sistema educacional alemão, que é bastante complexo. O governo federal influencia pouco no sistema de ensino, e os estados têm mais autonomia. São vários tipos diferentes de escolas, com um foco muito grande no ensino médio e em formação profissional. Mais da metade dos alunos do ensino médio da Alemanha faz formação profissional. A Alemanha é precursora ainda do sistema dual de ensino (Segundo o Departamento Federal de Estatísticas da Alemanha, 2,5 milhões de alunos cursam atualmente a modalidade), em que o estudante fica parte do tempo na escola e parte em uma empresa aprendendo na prática. Isso com 14, 15 anos. Isso influenciou outros sistemas da Europa. Na Suíça e Áustria, por exemplo, mais de 70% dos alunos fazem formação profissional no ensino médio.

O que a Alemanha tem a nos ensinar em termos de educação?
A questão da formação profissional é algo que queremos intensificar. Além do Programa Ganhe o Mundo, queremos avançar na parceria com a Alemanha no sentido das escolas técnicas. Queremos construir algum tipo de cooperação na área de formação profissional. A visita ao país foi um primeiro passo nesse sentido. Outra linha que nos aproxima da Alemanha é o próprio Ganhe o Mundo. Já tínhamos no estado o programa Pasch, que é ligado ao Instituto Goethe, nas unidades do Ginásio Pernambucano. São os alunos dessas turmas que vão para este embarque de fevereiro do Ganhe o Mundo na Alemanha. Resolvemos dar um primeiro passo aproveitando esses estudantes do Pasch para passar o semestre letivo na Alemanha, mas vamos ampliar a oferta do curso de alemão para outras escolas. Em 2018, serão cinco, e não mais duas, escolas com aulas de alemão. Passaremos a selecionar dessas cinco unidades os alunos que vão estudar um semestre na Alemanha, intensificando cada vez mais a parceria com o país. Isso é importante porque diferentemente de outros países para onde já enviamos estudantes, como os Estados Unidos e Canadá, a Alemanha não tem muita tradição em receber estudantes estrangeiros para cursar o ensino médio. Isso é algo recente. Para a primeira turma estamos concentrados todos os intercambistas na região de Berlim, pois são escolas mais preparadas para receber estrangeiros, mas, no futuro, com uma maior preparação, esperamos levá-los a outras regiões do país. Vamos aproveitar 2018 para reforçar essa parceria com o governo alemão e, para além do Ganhe o Mundo, estreitar laços em relação ao ensino técnico. 

* Leia a matéria completa na Superedição do Diario deste fim de semana


** A repórter viajou a convite do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha

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