Crack Mãe faz desabafo na Alepe sobre morte de filho dependente Fala aconteceu antes de divulgação do Relatório Mundial das Drogas, no Dia mundial contra o tráfico ilícito de drogas

Publicado em: 26/06/2017 21:47 Atualizado em:

Estela Maria de Azevedo, 55 anos, perdeu o filho há quatro meses. Recém-saído de um tratamento para dependentes de droga, ele tirou a própria vida. Desde então, a dona de casa juntou-se ao grupo Mães contra o crack. Tenta amenizar as dores da perda com o apoio de outras mulheres na mesma situação. Ontem à tarde, ocupou o lugar dos deputados estaduais na tribuna da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). Pediu ajuda para as famílias com dependentes. “É muito difícil existir uma família hoje sem usuário de droga. Nos ajudem. Eu perdi meu filho, mas muitas outras mães ainda vão perder. Depois do tratamento ele não conseguiu emprego. Dizem que tem vaga, mas a porta está fechada”.
O desabafo aconteceu momentos antes do chefe do escritório sobre Drogas e Crime da ONU, Rafael Franzini, divulgar o Relatório Mundial das Drogas, edição 2017, no Dia mundial contra o tráfico ilícito de drogas. Pela primeira vez, o documento foi lançado em Pernambuco. Este ano, também foi lançada a campanha Ouça primeiro, que reforça ações de prevenção junto a crianças e adolescentes. “À medida que se encaminham para a adolescência, se tornam vulneráveis a comportamentos de risco, incluindo uso de drogas. Reconhecendo essa vulnerabilidade, a campanha propõe a prevenção baseada em evidência científica”, pontuou Franzini.
O representante da ONU resaltou que a pesquisa mundial tem limitações porque muitos países não fazem estudos de prevalência de uso de drogas. Os continentes que mais fornecem informações, segundo ele, são a Europa e as Américas. Com isso, o resultado é que em nível mundial o uso de drogas está estável. “Nos países onde foram feitas pesquisas recentes, como Colômbia e Chile, a realidade é outra”, comparou.
Por outro lado, o estudo mostra um incremento no número de pessoas chamadas usuários problemáticos, ou seja, que têm problemas com uso de drogas de distintos tipos. O impacto negativo é pior em quem injeta drogas e ainda mais grave em quem tem HIV e hepatite C. “A hepatite C tem causado prejuízo maior que o HIV entre os 12 milhões de pessoas que injetam drogas no mundo. Desses, 1,6 mihão vivem com HIV, 6,1 milhões vivem com hepatite C e 1,3 milhão vive com as duas doenças. A hepatite C tem influência letal nos usuários de drogas que não conseguem ser tratados, pois o tramento ainda é caro.”
Segundo Franzini, no Brasil, no usuário de crack, a prevalência de HIV e hepatite C é notória. “O mesmo acontece com a população em prisão, onde a presença de doenças é muito maior que na população em geral”. O representante da ONU destacou que as drogas sintéticas também representam preocupação no mundo todo. “Nos anos 80, por exemplo, era pouco conhecida nos Estados Unidos. Agora, o país todo tem a presença delas.”
Franzini se mostrou preocupado com a aparição de novas substâncias psicotrópicas, que na verdade não são novas, apenas não estão incluídas nas listas de controle da ONU. O uso, segundo ele, dobrou. Em três anos (2013-2016), passou de 260 tipos para 483 distintas substâncias. “Temos que estar preparados porque o controle dessas novas substâncias impõe desafios.” Segundo ele, as mudanças se dão no modelo de negócios. “Estimamos que em 2014 o crime organizado no mundo inteiro gerou 1/5 de suas receitas com a venda de substâncias que são controladas internacionalmente, como a heroína, e com medicamentos desviados do mercado, ou produzidos como medicamentos falsificados, sem controle de qualidade.”
Outra preocupação apontada pelo relatório é o uso de novas tecnologias e formas de comunicação, como sites onde as pessoas conseguem comprar drogas. Geralmente, diz Franzini, são usuários que usam com fins recreativos maconha, ecstasy, cocaína, alucinógenos e novas substâncias.
Uma novidade do documento é o estudo temático deste ano, que traça uma relação entre as drogas, o crime organizado, o fluxo financeiro ilícito, a corrupção e o terrorismo. “Um quinto da renda do crime organizado internacional vem de lucros da venda de produtos piratas, depois vem as drogas, o tráfico de seres humanos e de arma”, exemplifica. Além disso, informou, no mundo inteiro há influência do terrorismo na produção e venda de drogas. “A corrupção do mundo das drogas prejudica a democracia e compromete a governabilidade dos estados.”
Franzini encerrou a fala destacando a importância de melhorar a qualidade de conhecimento do mundo das drogas para a construção de políticas de combate eficientes. “Temos que enfrentar o problema como um problema de saúde e não apenas punitivo, de combate ao tráfico”, completou.


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