Consciência negra Segregação racial persiste na ocupação do Recife Povoamento da capital reproduziu ao longo dos séculos a separação entre negros/pardos e brancos, em um processo simbólico de transformação das senzalas em guetos

Por: Adaíra Sene

Publicado em: 19/11/2015 12:20 Atualizado em: 06/05/2016 19:14



O preto no branco estampa os documentos oficiais e trilha sua própria história nas ruas do Recife. Ilhada, a Zona Norte concentra o menor número de negros do município. Percorrendo as periferias, a pele escura dá cor e voz ao povo. Com 1,5 milhão de habitantes, o Recife abraça 890 mil pretos e pardos, de acordo com o Censo 2010. Abraço sufocante, reflexo de uma colonização promíscua que transformou senzalas em guetos com o passar dos séculos.

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Reduto de escravos no passado, muitos bairros da cidade permanecem com a população prioritariamente negra. Peixinhos, por exemplo, nos limites com Olinda, tem 75% de seus moradores pretos. Juntos, eles somam 3.787 pessoas, das 4.998 que moram no local. Por trás das estatísticas, revela-se o processo de povoamento da capitania. Se Afogados, que hoje tem 60% de seus moradores com a pele escura, assim se denomina foi devido ao grande número de escravos que se afogaram ao tentar atravessar o Rio Cedros, braço do Capibaribe.

Nos percursos da colonização, muitas rotas contam o surgimento de abrigos em virtude da venda de terras e da invasão holandesa. Casa Amarela nasceu ao redor do Arraial Velho do Bom Jesus pouco depois dos holandeses chegarem. Lá, estiveram Luís Barbalho e Martim Soares Moreno, Filipe Camarão com seus índios e Henrique Dias com seus negros. Todos empenhados em manter a guerra. Com o tempo, o Arraial foi se enraizando e se transformando em outros logradouros, como o Alto Santa Terezinha e os bairros adjacentes: Linha do Tiro, Água Fria, Bomba do Hemetério, Alto José do Pinho, Morro da Conceição e Alto José Bonifácio.

Se em Casa Amarela moram 12.730 negros, o vizinho rico, Casa Forte, só tem 1,4 mil. A tênue via que os separa é inversamente proporcional ao disparate dos números. A dicotomia se repete por toda a cidade. Enquanto no bairro de Boa Viagem 32% da população é preta, no Pina, o número alcança a marca de 61%.

Do ponto de vista histórico, a Várzea, na Zona Oeste, não foge à lógica. O bairro foi sede de um pequeno povoado no século XVI, originado no Engenho Santo Antônio, que foi fundado nos primeiros anos da colonização por Diogo Gonçalves. Ao seu redor gravitavam 16 outras fábricas de açúcar que juntas formavam a chamada Várzea do Capibaribe. Hoje, a localidade é lar para mais de 40 mil negros.

Confira no mapa a proporção de negros, considerando pretos e pardos, no Recife por bairro:

 



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