Opinião José Luiz Delgado: Outros méritos José Luiz Delgado é professor de Direito da UFPE

Publicado em: 08/11/2017 07:04 Atualizado em:

Não só do ponto de vista civilizacional geral, de que falei outro dia, mas do ponto de vista propriamente religioso, o protestantismo apresenta inegáveis méritos.

Teria a Igreja se reformado, se não fosse a revolta protestante? Estava ela num evidente mau caminho e o clamor por uma profunda reforma vinha de todos os lados. Nada obstante, a reforma era postergada. Sem o protestantismo, teria ela sido feita? Na melhor das hipóteses teria demorado muito tempo.

Além disso, o protestantismo realçou valores cristãos originais, que eram portanto valores católicos, mas que andavam meio esquecidos, ou meio ofuscados. O primeiro deles é a verdade essencial de que é Cristo que nos salva. É o sacrifício redentor de Cristo, o magno preço, que salva cada um de nós. O absolutamente inimaginável sacrifício da cruz: o Deus vivo e verdadeiro não somente se encarnar, mas ainda sofrer e morrer por nós, crucificado? Preço absolutamente além de qualquer pretensão nossa. Não são as obras que nos salvam, embora sejam elas sempre importantes e necessárias. Mas tal viera sendo a ênfase nas boas obras que aquela verdade essencial, a do único sacrifício redentor, andava meio apagada. Importantes aprofundamentos teológicos vieram sendo feitos, ao longo dos séculos, a respeito da “doutrina da justificação”, até culminar numa excepcional Declaração Conjunta em que a Igreja Católica e a Federação Luterana Mundial confessam em uníssono: “somente por graça, na fé na obra salvífica de Cristo, e não por causa de nosso mérito, somos aceitos por Deus e recebemos o Espírito Santo que nos renova os corações e nos capacita e chama para boas obras”.

Também, a necessidade de ler a Bíblia. É evidente que os livros da Bíblia foram definidos pela Igreja, e que Jesus não mandou escrever o que dissera e seguirmos esses escritos – mas o que Ele fez foi constituir um grupo de amigos ao qual entregou a mensagem. E, assim, a Igreja está acima da Bíblia – a Igreja, portanto o magistério institucional, a tradição. Isso não significa porém que a Bíblia pudesse ser desprezada e esquecida. Mesmo que houvesse riscos de que essas leituras individuais levassem a interpretações equivocadas, era necessário difundir e valorizar a leitura da Bíblia. Levar a cristandade comum, não apenas os pastores, à intimidade com a Bíblia, à leitura assídua e meditada dela, é grande mérito do protestantismo.

Em matéria de arte religiosa pode-se pensar que catolicismo e protestantismo são até complementares: enquanto aquele dedicou-se mais à pintura e à escultura, às artes plásticas, o protestantismo dedicou-se mais à música sacra. Neste campo, o catolicismo havia ficado apenas no canto gregoriano, com toda a magnificência que o caracteriza, mas não ia além. Desenvolvera, sim, pintura e escultura admiráveis, que o protestantismo, meio por conta de sua aversão às imagens, repudiava. Mas a ênfase, o desenvolvimento, o culto da boa música e do canto religiosos são outro mérito do protestantismo.


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