Opinião Luzilá Gonçalves Ferreira: O padre e as quadrilhas Luzilá Gonçalves Ferreira é doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e Membro da Academia Perambucana de Letras

Publicado em: 13/06/2017 07:33 Atualizado em:

Um personagem, no cenário da cidade. Além de cumprir, digamos religiosamente, suas obrigações eclesiásticas (o que lhe permitia penetrar na vida alheia de parte da população e frequentar salões literários, como aquele de Dona Anunciada Camila, a formosa qual pincel em tela fina de Maciel Monteiro), o padre Lopes Gama foi educador, tradutor, professor de retórica no Seminário de Olinda, deputado. Dirigiu os Cursos jurídicos, o Colégio de Órfãs, a Instrução Pública. Mas o que nos deixou de mais interessante é, certamente, seu jornal O Padre Carapuceiro, publicado por vários anos a partir de 1840. Um excepcional documento sobre o Recife, a desonestidade de políticos e de certas senhoras que mandam nos maridos e espalham boatos sobre a vida alheia, copiam as modas estrangeiras, sobretudo as vindas da França. E tudo isso o padre o faz com estilo vivo, cômico, delicioso. Como no capítulo  do jornal dedicado às quadrilhas, palavra que no Nordeste lembra antes a dança, como o lembrou Luce Pereira há dias, no DP, lamentando que as atuais andam perdendo a graça antiga e mais se assemelham a Escolas de Samba. Mas voltemos ao padre. Que, segundo a tradição secular que atribui aos moradores de convento o gosto pela boa cozinha, o bom vinho, descreve sua predileção pela culinária junina, as canjicas, os milhos assados à fogueira, mas ridiculariza a moda das quadrilhas, nas quais os cavalheiros só fazem andar e cumprimentar as damas que “enrufadas em seus engomados vestidos”  e assim “´por modo de peruzinhos que começam a brigar.”

Em crônica de 6 de abril de 1842, o Carapuceiro  retoma o tema da quadrilha e acrescenta uma observação infelizmente muito atual : “Por toda a parte aparecem quadrilhas (inclusive de ladrões)”.  Como atuais são as observações do padre sobre as mazelas de nossa cidade. Uma reeedição do jornal O Carapuceiro, organizada por Leonardo Dantas, foi feita pela Prefeitura do Recife, há uns anos, e uma compilação de alguns dos melhores trechos do jornal, por Evaldo Cabral de Melo, agora esgotada, foi realizada pela Companhia das Letras. Mas o leitor deste artigo pode encontrar toda uma matéria sobre o Carapuceiro com trechos do jornal, no livro Escritores Pernambucanos do Século 19, tomo I, editado recentemente pela Cepe, de autoria, toda modéstia à parte, desta que vos escreve. Uma grande leitora e admiradora de Lopes Gama, o padre Carapuceiro, uma das joias da Literatura Pernambucana.


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