Opinião Geraldo Brindeiro: O Senado da República e o impeachment "A Constituição Federal estabelece que compete privativamente ao Senado processar e julgar o impeachment do presidente da República"

Por: Diario de Pernambuco

Publicado em: 26/08/2016 07:12 Atualizado em:

Por Geraldo Brindeiro
Doutor em Direito por Yale, professor da UnB, foi procurador-geral da República (1995-2003)

A Constituição Federal estabelece que compete privativamente ao Senado processar e julgar o impeachment do presidente da República. Trata-se de julgamento político, insuscetível de controle judicial, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Nesse sentido, no Mandado de Segurança 34.193 -DF, medida cautelar, em 11 de maio de 2016, relativo ao processo de impeachment atualmente no Senado, afirmou o relator, Ministro Teori Zavaski: “...não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que, direta ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não dos fatos ou sobre a procedência ou não da acusação. O juiz constitucional dessa matéria é o Senado Federal...”

Aliás, a Suprema Corte dos Estados Unidos, no caso Nixon v. United States (506 US 224 – 1993), por decisão unânime, reafirmou sua orientação clássica no sentido de que, nos processos de impeachment, a validade da decisão final do Senado é insuscetível de judicialização, cabendo a ele – e não à Suprema Corte – a palavra final sobre a Constituição.

A jurisprudência do STF é no sentido de que, no julgamento do impeachment pelo Senado da República, “...a instauração e decisão final são decisões de natureza predominantemente política – cujo mérito é insuscetível de controle judicial...”(Vide, e.g., Mandado de Segurança 23.885-DF, relator Carlos Velloso; e Mandado de Segurança 20.941-DF, relator Sepúlveda Pertence). E em Acórdão unânime recente do STF, tal orientação jurisprudencial foi reafirmada, conforme se lê em trecho da ementa do MS 30.672-DF, agravo regimental, de que foi relator Ricardo Lewandowski : “ Constitucional. Impeachment...IV- Questões referentes à sua conveniência ou ao seu mérito não competem ao Poder Judiciário, sob pena de substituir-se ao Legislativo na análise eminentemente política que envolvem essas controvérsias”.

Finalmente, crimes de responsabilidade são atos do presidente da República que atentam contra a Constituição, especialmente contra a probidade na administração e a lei orçamentária, dentre outras hipóteses, mencionadas na Carta Magna. São ainda tipificados  em lei especial – a Lei Federal 1.079/50. E compete privativamente ao Senado processar e julgar tais crimes de responsabilidade, limitando-se a condenação - que somente será proferida por dois terços dos votos da Casa - à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública .

Crimes comuns praticados pelo presidente da República, por outro lado - além de tipificados no Código Penal e em leis esparsas,  com conceitos próprios, objetivos distintos e sanções penais nas hipóteses de condenação: a perda temporária da liberdade – são processados e julgados exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal após denúncia apresentada  pelo procurador-geral da República. Podem eventualmente constituir também crimes de responsabilidade, se, na vigência do mandato, referirem-se ao exercício das funções presidenciais, afastada a imunidade constitucional. Mas a configuração de crimes de responsabilidade independe do cometimento de crimes comuns e o julgamento destes nada tem a ver com o Senado da República.

No Brasil, o então presidente Collor foi absolvido pelo STF na ação penal por corrupção, mas foi condenado pelo Senado no julgamento do impeachment. Conforme a Resolução 101, de 1992, do Senado, por atos atentatórios à Constituição contra “a probidade na administração”, por “infração de lei federal de ordem pública” e “procedimento de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. Nos EUA, no escândalo Watergate, o presidente Nixon foi submetido a impeachment por obstrução da Justiça , violação do juramento de respeitar a Constituição e as Leis do País e desobediência a notificações da Câmara. Nem sequer houve ação penal.

Se o presidente da República - por ação ou omissão - atentou contra a Constituição, especialmente contra “a lei orçamentária” e “a probidade na administração”; violou a Lei de Responsabilidade Fiscal; autorizou ou permitiu operações de crédito definidas como crimes de responsabilidade na Lei Especial, e ainda como atos de improbidade administrativa; e editou decretos de créditos suplementares sem  prévia autorização do Congresso Nacional, vedados pela Carta Magna (CF, artigo 167,  V), deverá ser condenado pelo Senado da República no processo de impeachment.


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