Opinião Zeca Brandão: A formação do arquiteto urbanista e o enfrentamento da crise urbana "É fundamental que esse novo modelo de pós-graduação não se restrinja a preparar profissionais apenas para atender de forma adestrada ao mercado existente"

Por: Diario de Pernambuco

Publicado em: 12/07/2016 07:34 Atualizado em:

Por Zeca Brandão
Arquiteto urbanista e professor associado da UFPE

Nós arquitetos temos sido poupados dessa saraivada de críticas que prefeitos e empresários da construção civil têm recebido diante da crise que vivem as grandes cidades brasileiras. Em última instância, eles são realmente os principais responsáveis pela baixa qualidade das nossas cidades, visto que o protagonismo do arquiteto urbanista na produção dos espaços urbanos mostra-se, de fato, cada vez menor. Ainda assim, penso que os arquitetos têm a sua parcela de culpa e investir na capacitação desses profissionais, através da criação de novos programas de pós-graduação, pode ajudar no enfrentamento dessa crise urbana.

Nessa direção, já observa-se um aumento gradativo do número de programas de pós-graduação em arquitetura e urbanismo, tanto lato sensu (especializações), como stricto sensu (mestrados e doutorados). Entretanto, apesar da grande quantidade de cursos ofertados, constata-se a carência de uma nova modalidade de pós-graduação: o mestrado profissional. Diferentemente do mestrado acadêmico que forma pesquisadores, que posteriormente fazem o doutorado e, geralmente, seguem a carreira de professor universitário, esse novo modelo de mestrado se propõe a preparar o profissional mais direcionado ao mercado de trabalho. Tal especificidade torna esse tipo de pós-graduação mais apropriado ao caso aqui tratado, na medida que ele visa alcançar resultados práticos imediatos.

Vale ressaltar, porém, que considerar o mercado não significa compartilhar dessa verdadeira obsessão por ele que caracteriza a época em que vivemos, com a valorização do profissional cegamente subordinado à exigências pontuais e fragmentadas. O pensamento crítico diante das demandas imediatas - quase sempre atreladas ao lucro - não é estimulado, nem tão pouco visto como algo importante na formação do profissional. Ao contrário, uma postura mais reflexiva sobre a própria produção é geralmente vista como arriscada, podendo até mesmo ameaçar a eficiência do serviço prestado. O arquiteto não poderia desviar-se desse padrão e, assim como outros profissionais, ele também tem sido preparado para atender as reivindicações particulares dos seus clientes, sem questionar, de forma mais consistente, o papel de seu ofício perante a sociedade em geral.

Portanto, é fundamental que esse novo modelo de pós-graduação não se restrinja a preparar profissionais apenas para atender de forma adestrada ao mercado existente, reproduzindo soluções padronizadas e de baixa qualidade espacial. É preciso, ao contrário, que o curso tenha como propósito desenvolver o senso crítico e investigativo dos alunos, sem perder de vista o compromisso com a aplicação imediata do conhecimento produzido. Mais do que isso, ter o ousado objetivo de capacitar esses técnicos para o exercício de uma prática reflexiva, que promova o autodesenvolvimento profissional e contribua com a qualidade do próprio mercado. Só assim, um mestrado profissional em arquitetura e urbanismo poderá cumprir o seu objetivo maior, que é colaborar efetivamente para a construção de cidades melhores.

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