A importância de eleger um bom Parlamento

Maurício Rands
Advogado, PhD pela Universidade Oxford, Secretário de Acesso a Direitos da OEA. As opiniões são pessoais

Publicado em: 23/07/2018 03:00 Atualizado em: 23/07/2018 09:28

As eleições estão na esquina, a dois meses e meio. Mas ainda não caíram no foco da maioria das pessoas. O noticiário está concentrado nas candidaturas ao executivo. Mas também vamos eleger os legisladores federais e estaduais. É preocupante a pouca atenção dedicada à escolha dos poderes legislativos. Ninguém vai conseguir governar bem se não tiver apoio nos parlamentos. A destinação dos recursos, as mudanças institucionais e a fiscalização das políticas, programas e projetos vão depender de decisões adotadas no Congresso Nacional e nas assembleias legislativas.

O quadro das candidaturas ainda está indefinido. As coligações idem. Indefinições nunca vistas em eleições anteriores. O que é mais um testemunho sobre a disfuncionalidade do atual sistema político. Alguns fatos da semana que passou, todavia, podem estar iniciando definições. Um deles foi a unidade do chamado Centrão (PP, DEM, SOL, PR, PRB), que resolveu apoiar Alckmin. Com uma lógica que vai além da dependência à vitória do candidato apoiado. Como lembrou Vera Magalhães (O Estadão, 22-7), esse apoio funda-se em outra estratégia: o poder no parlamento a ser eleito, o fortalecimento dos arranjos eleitorais nos estados, e a eventual participação no governo a ser eleito, mesmo que não seja o do candidato deles. Como se essas forças já estivessem antevendo que o presidente eleito vai ter que ter fazer acordos básicos para assegurar alguma governabilidade em um país em crise tão profunda. Também na semana passada, começaram alguns sinais de possível estagnação de Bolsonaro. Como a falta de partidos coligados e as recusas do senador Magno Malta e do general Heleno para integrarem a chapa como vices.  
O Brasil, tal como está, é ingovernável. Polarização excessiva, reformas institucionais adiadas, bomba fiscal engordada com o pacote de 100 bi aprovado nas últimas semanas, desemprego renitente, corrupção e violência. Vai precisar de capacidade de diálogo, essa ferramenta tão essencial ao funcionamento das democracias. Essa última necessidade pode ser viável com quaisquer das candidaturas que hoje têm mais chance de êxito. Tirando o possível, mas improvável, acidente de uma eventual eleição de Bolsonaro. Que o debate eleitoral apenas iniciado tem potencial para que mais gente perceba duas características da candidatura do capitão reformado. Primeiro, a fraude. Depois de sete mandatos de deputado e de repetir a velha prática  de eleger filhos e parentes, é necessária uma dose alta de ingenuidade ou desinformação para acreditar que Bolsonaro é a ‘antítese’ de tudo que está aí. Mormente que é instrumento de construção de um outro modo de fazer política. Depois, o erro das soluções que propõe. Sim, porque as debilidades da nossa democracia não devem conduzir à sua supressão, ao autoritarismo. Ao contrário, o de que o país precisa é de melhorar a democracia, aperfeiçoando-a para ampliar os espaços da participação cidadã, da ética republicana e da capacidade de bom funcionamento das instituições. Não precisamos do autoritarismo, xenofobia,  machismo, homofobia e racismo propostos por Bolsonaro.

Porque não se pode menosprezar o discernimento da maioria do eleitorado, parece razoável a  hipótese de que Bolsonaro bateu no teto ou tende a minguar. Daí que a presidência pode vir de uma das principais candidaturas do campo democrático, pela ordem das últimas pesquisas: Lula/Hadad, Marina, Ciro e Alckimin. Apesar da agressividade e polarização dos partidários de cada campanha nas redes sociais, pode haver espaço para um salto qualitativo no debate entre essas forças. Nas duas hipóteses mais prováveis. Seja naquela em que uma dessas candidaturas passe ao segundo turno contra Bolsonaro. Seja naquela em que duas dessas quatro candidaturas estejam na disputa do dia 28 de outubro. Alguns elementos da cultura cívica e democrática podem ajudar a configurar o cenário pós-eleição que permita a reconstrução do país. Para inaugurar uma nova etapa e enfrentar os problemas inadiáveis que nos prendem ao atraso, que tal um debate que reconheça o outro, que não demonize o diferente, que apresente soluções viáveis, e que olhe menos pelo retrovisor e mais para nosso futuro? E que tal eleger parlamentos com melhor qualidade?

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