° / °

Vida Urbana
HOSPITAL ULYSSES PERNAMBUCANO

Mecanismo Nacional de Combate à Tortura pede fechamento de hospital psiquiátrico da Tamarineira

Fiscalização no hospital psiquiátrico da Tamarineira identificou necessidades de reformas estruturais urgentes, situação de grave desassistência dos pacientes e vulnerabilidade das mulheres

Jorge Cosme

Publicado: 20/05/2025 às 19:02

Hospital Ulysses Pernambucano./Foto: Divulgação

Hospital Ulysses Pernambucano. (Foto: Divulgação)

O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), órgão federal independente, recomendou o fechamento do Hospital Ulysses Pernambucano, no bairro da Tamarineira, Zona Norte do Recife. O relatório de fiscalização realizado em 2024 foi apresentado na última segunda-feira (20) na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).

Entre as irregularidades identificadas no Hospital Ulysses Pernambucano estão precariedade estrutural, ausência de separação por gênero na emergência, contenções químicas frequentes, contenções mecânicas irregulares, exposição de pacientes, equipe de saúde defasada e guardas patrimoniais que "ajudam" na contenção de pacientes.

"Infelizmente, os direitos das pacientes não são completamente observados nessa unidade", diz Camila Antero, perita do MNPCT. Composto por 11 peritos independentes, o órgão é vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

"Esses leitos psiquiátricos devem ir para hospitais gerais, de acordo com a lei da reforma psiquiátrica, de maneira descentralizada", acrescenta Antero. Para ela, esse processo não deveria ser feito de forma abrupta, considerando os direitos dos pacientes e a realocação dos profissionais.

Ela destaca que o fechamento está previsto em lei estadual de 1994. "Vamos botar essa lei para viger no estado", pede a perita. Procurado, o governo de Pernambuco afirma que tem implementado melhorias na unidade.

Fiscalização

Durante a fiscalização no hospital da Tamarineira, em 18 de abril de 2024, o MNPCT encontrou uma pessoa que estava sendo obrigada a urinar em uma garrafa, "porque o policial militar que o custodiava não autorizava sua ida ao banheiro", diz o relatório. No dia da inspeção, 52 homens e 41 mulheres eram atendidos pelo serviço.

Ainda de acordo com o documento, o edifício apresenta instalações desgastadas, insalubres e mal conservadas, com ambientes extremamente quentes e sem ventilação. Trabalhadores da limpeza confirmaram infestação de ratos.

Os pacientes dormiam em colchões sem capa, lençol, travesseiros ou roupa de cama. "Não pode ser oferecido tratamento degradante e desumano aos pacientes, obrigando-os a deitar-se diretamente sobre a espuma de colchões. Pessoas internadas relataram ter frio ao dormir", acrescenta o relatório.

Profissionais da unidade relataram que as usuárias, ao se aproximarem das janelas, eram frequentemente alvo de assédios de caráter sexual e de chacota por transeuntes e por trabalhadores da obra do Parque da Tamarineira.

 

O relatório também informa que pacientes relataram ter sofrido violência física imediatamente antes da internação na unidade, levando "muitas pancadas na cabeça".

"Outros usuários disseram não ter sofrido violência física por parte de funcionários, mas de outros pacientes, sim, e que há espancamentos durante o período da noite, quando há menos funcionários na unidade", detalha o documento.

Os integrantes do mecanismo também mencionam muitas faixas amarradas na cama e pelo chão. "Segundo as entrevistas, é frequente o uso da contenção mecânica, principalmente no período da noite, sendo uma prática excessiva que muitas vezes ocorre sem a devida prescrição médica".

O relatório reforça que a contenção mecânica pode causar danos físicos, traumas psicológicos e ferir a dignidade dos pacientes. O uso excessivo ou inadequado pode levar à estigmatização e marginalização dos indivíduos, defende.

Posicionamento

Por nota, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) destacou que o Governo de Pernambuco publicou edital de licitação para contratação de empresa que deverá realizar manutenção predial, preventiva e corretiva. "Este edital contempla ainda outras dez unidades de saúde, do Recife e do interior do estado, resultando em um montante de R$ 60,5 milhões", declara.

A pasta reforça que os pontos apontados pelo mecanismo são referentes à visita realizada em 2024 e que, desde então, a pasta e a direção do serviço têm atuado na implementação de melhorias.

"Para se ter uma ideia, mais de 100 profissionais para assistência à saúde dos pacientes, entre psicólogo, enfermeiros, médicos, assistentes sociais, etc, foram contratados e passaram a fazer parte do quadro assistencial do HUP", informa.

"Os sinais de melhorias na assistência integral aos pacientes também se refletem no tempo internamento no serviço, que hoje dura em média 20 dias", acrescenta. Segundo o MNPCT, a média de permanência deveria ser de cerca de 15 a 20 dias.

O hospital

O Ulysses Pernambucano é o segundo hospital psiquiátrico do Brasil, inaugurado em 1º de janeiro de 1883, e passou a ser administrado pelo Estado em 1924.

Entre 1930 e 1935, foi realizada uma grande reforma em seu modelo assistencial, promovida pelo médico psiquiatra Ulysses Pernambucano. Em 1981, o antigo Hospital da Tamarineira recebeu a atual denominação, em homenagem ao médico.

Em 1992, o conjunto arquitetônico do hospital foi tombado pelo Patrimônio Histórico do Estado.

Mais de Vida Urbana