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Polícia indicia a atriz Suzy Camacho por desvio de R$ 42 milhões do ex-marido

A atriz teria se aproveitado da condição de saúde debilitada do ex-marido nos últimos anos de vida

Estadão Conteúdo

Publicado: 02/07/2025 às 18:04

Farid Curi e Suzy Camacho/Arquivo pessoal

Farid Curi e Suzy Camacho (Arquivo pessoal)

A Polícia de São Paulo indiciou criminalmente a psicóloga e ex-atriz global Suse Maria Gomes Camacho Curi, a Suzy Camacho, de 64 anos, pelo suposto desvio de R$ 42,2 milhões do patrimônio de seu ex-companheiro, o empresário Farid Curi, falecido aos 85 anos. Ela teria se aproveitado da condição de saúde debilitada de Farid nos últimos anos de vida para realizar - até com uso de documentos falsos -, uma sucessão de movimentações financeiras e patrimoniais em benefício próprio e de seus familiares.

Ao Estadão, o criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso, que defende Suzy, disse que ‘tudo não passa de uma grande armação dos filhos de Farid’. D’Urso é taxativo. “É tudo mentira, nada foi apurado, nenhum crime foi verificado e nenhuma denúncia criminal existe contra a Suzy.”

Suzy Camacho, psicóloga, foi atriz de novela da Globo. Em 1987, fez parte do elenco de Brega & Chique. Também atuou em ‘A viagem’. Depois, afastou-se da carreira artística.

A Polícia atribui à Suzy violação aos artigos 102 e 107 do Estatuto do Idoso. O 102 fala em apropriação ou desvio de bens, proventos, pensão ou outros rendimentos do idoso. O 107 fala de abandono ou negligência no trato do idoso.

Farid Curi morreu aos 85 anos, em setembro de 2022. Ele foi um dos sócios da rede de supermercados Atacadão, comprada pelo Carrefour por cerca de R$ 2,2 bilhões em 2013.

Ele e Suzy se casaram em 29 de junho de 2013 pelo regime da separação obrigatória de bens.

Relatório final do inquérito do 4.º Distrito Policial (Consolação), ao qual o Estadão teve acesso, afirma em 55 páginas que durante o período em que Farid ‘enfrentava sérias limitações cognitivas e físicas’, houve uma evolução patrimonial significativa por parte de Suzy, incompatível com a renda que ela havia declarado à Receita Federal.

Esse crescimento foi constatado a partir da análise de declarações de Imposto de Renda, de dados bancários e de um relatório elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que apontou um volume elevado de transações bancárias, aquisições de bens e transferências para terceiros ‘sem justificativa econômica plausível’.

A Polícia destaca que, além da discrepância entre os valores movimentados e a renda declarada, a investigação identificou que Suse passou a centralizar a administração financeira de Farid após afastar tanto seus filhos quanto a funcionária de confiança que historicamente cuidava das finanças do empresário. A gestão dos recursos foi então assumida por um irmão dela, Pompilio Camacho.

A investigação aponta que Pompilio passou a figurar como co-titular em uma conta originalmente vinculada a Farid. Essa conta, movimentada majoritariamente por Pompilio, ‘foi usada para realizar saques em espécie e transferências expressivas para contas em nome da própria Suzy e de pessoas próximas a ela’.

A análise bancária apontou o saque de R$ 1,29 milhão em dinheiro e transferências que ultrapassam R$ 3 milhões para contas de titularidade exclusiva de Suse.

Outras movimentações despertaram a atenção dos investigadores, inclusive o envio de mais de R$ 1,2 milhão da mesma conta para Pompilio Camacho, ‘além de doações sucessivas a outros familiares, como sua mãe, seus sobrinhos e seu filho, que somaram aproximadamente R$ 900 mil’.

Também foram registrados empréstimos e transferências que ultrapassam R$ 3,7 milhões para terceiros, ‘com fortes indícios de utilização de pessoas interpostas, laranjas, o que sugere tentativa de ocultação da origem dos recursos’.

Entre os bens adquiridos nesse período, diz o inquérito, está um imóvel comprado por mais de R$ 2,4 milhões de uma empresa falida transação considerada atípica pelos investigadores.

A movimentação internacional também entrou na mira da Polícia. O rastreamento aponta uma transferência para Suse de US$ 450 mil de uma empresa sediada nas Bahamas, além da declaração, a partir de 2020, de contas bancárias em Mônaco e Miami com saldo superior a R$ 18 milhões. Tais registros, diz a Polícia, ‘não possuem lastro na capacidade econômica da investigada e podem indicar tentativa de burla ao regime de separação total de bens estabelecido com Farid’.

Para o delegado Guilherme Sabino Corrêa, que presidiu o inquérito, existem ‘robustos indícios de que Suzy tenha se valido da condição clínica de seu então companheiro para esvaziar indevidamente seu patrimônio, de modo sistemático e silencioso’,

A estimativa preliminar dos valores desviados ou ocultados girava entre R$ 25 milhões e R$ 30 milhões. Após ‘refinamento e análise das provas’, a Polícia concluiu que o desfalque bateu em R$ 42.256.507,31 do patrimônio de Farid Curi ‘na constância do matrimônio’.

A investigação mapeou também beneficiários das operações, ‘a fim de permitir eventual responsabilização penal e recuperação de ativos em favor do espólio de Farid Curi’.

Segundo o delegado Guilherme Sabino Corrêa, do 4.º Distrito Policial (Consolação), as provas indicam que Suzy ‘não possuía capacidade financeira para movimentar todos os valores destacados’ no Relatório de Inteligência Financeira do Coaf.

“Há fortes indícios de que seus investimentos financeiros e imóveis adquiridos durante o matrimônio com Farid Curi, especialmente após o ano de 2019, quando o idoso apresentou doença que o tornou absolutamente incapaz para os atos da vida civil, foram produto de desvios de valores do cônjuge”, sustenta o relatório final do inquérito.

A Polícia destaca que o casamento foi regido pelo regime de separação total de bens, que na época era obrigatório para pessoas com mais de 70 anos. Ao longo da convivência com Suzy, o empresário ‘apenas indicou um único apartamento no Rio de Janeiro como sendo adquirido em conjunto com a investigada, compondo todos os demais bens exclusivamente o seu patrimônio’.

“Neste sentido, citam-se os pontos destacados, exaustivamente detalhados no Relatório de Investigação, concluindo-se por um desvio de R$ 42.256.507,31 do patrimônio de Farid Curi, na constância do matrimônio.”

O inquérito foi aberto a partir de uma representação dos filhos de Farid atribuindo a Suzy ‘apropriação ou desvio de bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento’ do empresário, ‘dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade, enriquecimento próprio e de seu filho’.

Ainda segundo a investigação, a ex-global teria ‘coagido de qualquer modo, suposto uso de medicação excessiva e suposta pressão psicológica, o idoso Farid a doar, contratar, testar ou outorgar procuração’.

O início do relacionamento foi descrito assim por uma das filhas de Farid. “Meu pai sempre sofreu com fortes dores na coluna, sofrendo diversas cirurgias graves na coluna e, por tal motivo, passou a, gradativamente, sofrer com as limitações inerentes ao quadro clínico imposto, bem como com a dolorosa e dificultosa recuperação. O casamento, assim, passou a ser visto com bons olhos, vez que entendíamos que a relação com Suzy teria colaborado em superar tais dificuldades físicas, inclusive uma eventual depressão.”

A filha do empresário informou que, até 2016, a relação do casal era descrita como ‘normal’.

Um filho de Farid declarou. “Não houve qualquer imposição contrária dos filhos quanto à união, pelo contrário, viam seu pai bem e feliz, retomando, inclusive, viagens. Todavia, com o passar do tempo, Suzy excluiu Farid do seu convívio social, inclusive chegando a proibir os próprios filhos de terem qualquer contato pessoal ou à distância.”

A filha disse que, ‘a partir daí, a família passou a perceber um drástico distanciamento de seu pai, em comparação à rotina imposta pelo próprio pai à família até então’.

“As visitas passaram a ser espaçadas e, quando aconteciam, em que pese avisá-lo com antecedência, era claro o incômodo de Suzy que, a todo custo, procurava deixar os familiares incomodados e desconfortáveis, seja olhando para o relógio, seja bocejando, seja indicando que estava próximo do horário do jantar’.

“Suzy jamais deixava a declarante e seus irmãos sozinhos com Farid. Tal postura, por óbvio, tornavam as visitas muito mais rápidas e superficiais. Além disso, informa que seu pai, com o passar dos anos, passou a se tornar mais silente, interagindo cada vez menos. O que relata neste ato, foi objeto também de observação de seus outros irmãos, notando que Suzy, com o passar do tempo, passou a afastá-lo dos filhos e familiares, indo de encontro com todo afeto e harmonia que Farid construiu durante os anos.”

Outro filho do empresário declarou que até 2016 ‘tinham uma convivência diária na empresa, porém em razão de seu limitante quadro de saúde, ele passou a se distanciar, oportunidade em que as visitas passaram a ser a única forma de encontrá-lo’.

“No entanto, quando essas visitas aconteciam, era claro o incômodo de Suzy com minha presença, tentando, a todo custo, tirar minha liberdade na residência. Não conseguia, sequer, me dirigir à cozinha para buscar um copo de água, em claro esforço em me deixar incomodado e desconfortável. Jamais consegui ficar com meu pai sozinho durante as visitas.”

Uma testemunha, que pediu para não ser identificada com receio de represálias, afirmou. “Não tem qualquer dúvida que ao contrair matrimônio com Suzy, houve uma mudança drástica em sua rotina, passando a se distanciar gradativamente, até a atual situação, que consiste na proibição de qualquer contato dos filhos e amigos com o pai. Os eventos e festas deixaram de ocorrer e Farid passou a ficar mais recluso. O distanciamento dos filhos e dos amigos, concomitantemente com a piora em seu quadro de saúde, tornando-o cada vez mais dependente, tem relação próxima com o ingresso de Suzy em sua vida.”

A mesma testemunha enfatizou. “Recentemente, foi pego de surpresa quando, em pleno Dia dos Pais, soube da proibição dos filhos em ver Farid, deixando filhos e netos em plena via pública, em que pese pedidos para visitá-lo. Ciente de seu estado de saúde e das dificuldades de raciocínio que possui, tem certeza absoluta que tal determinação partiu de Suzy. Há alguns meses, Farid perguntou ‘por que meus filhos não vêm mais me visitar?’, com muita tristeza nos olhos, mesma tristeza que notava quando o encontrava pessoalmente’.”

Para a Polícia, Suzy teria coagido Farid, por meio de suposto uso de medicação excessiva e pressão psicológica, a doar, contratar, testar ou outorgar procuração.

Em agosto de 2022, o Ministério Público de São Paulo chegou a denunciar Suzy Camacho por supostamente falsificar atestados médicos para se apropriar de R$ 10 milhões de Farid. Na ocasião, a defesa da ex-global negou qualquer ato ilícito de Suzy.

 

 

COM A PALAVRA, OS ADVOGADOS DOS FILHOS DE FARID CURI

Os criminalistas Rodrigo Carneiro Maia Bandieri e Rubens de Oliveira, que representam os filhos do empresário Farid Curi, disseram ao Estadão que ‘confiam plenamente na Justiça e no trabalho técnico desempenhado pela Polícia Civil, em longa investigação’.

“A nossa confiança se estabelece, também, nas investigações que estão em andamento.”

 

COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA LUIZ FLÁVIO BORGES D’URSO, QUE REPRESENTA SUZY CAMACHO

O criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso, que representa Suse Maria Gomes Camacho Curi, a Suzy Camacho, reagiu enfaticamente às conclusões da Polícia Civil de São Paulo.

“A Suzy é vítima de uma grande armação dos filhos do Farid. Eles os filhos, respondem a vários inquéritos policiais, desde denunciação caluniosa, corrupção de testemunhas, perseguição e ameaça contra Suzy que, por anos, teve medida protetiva contra eles.”

Segundo D’Urso, os filhos do empresário teriam submetido sua cliente até à ‘escuta ilegal e violência psicológica, além de vários outros crimes de que ela foi vítima.’

“Acusaram a Suzy levianamente e a Justiça tem restabelecido a verdade.”

“A Suzy foi investigada neste inquérito policial por seis anos. Os filhos do Farid, nesta guerra contra a Suzy, acusaram-na de maus tratos a idoso”, argumenta o criminalista. “É tudo mentira, nada foi apurado, nenhum crime foi verificado e nenhuma denúncia criminal existe contra a Suzy.”

D’Urso relata que Suzy Camacho foi ‘esposa de Farid e, por mais de 10 anos, cuidou dele’.

“Os filhos do Farid receberam mais de 300 milhões de reais do pai ainda em vida e depois processaram o pai por causa de dinheiro”, afirma o advogado. “A partir daí, foi estabelecida uma guerra entre os filhos dele, de um lado, e Farid e Suzy de outro.”

“Após seis anos de investigação infrutífera, o delegado ao ser transferido para outro DP (o que se deu há 15 dias) apresentou este relatório também há uns 15 dias, desconsiderando tudo o que foi produzido de provas pela defesa. Somente relatou o lado dos filhos, que mentem descaradamente por causa de dinheiro. O delegado, que nada encontrou de crime, indiciou a Suzy sem fundamento, o que vai ser corrigido pela Justiça.”

Segundo D’Urso, os filhos do empresário ‘usaram jornalistas para acusar Suzy de vender uma casa milionária do Farid’.

“A casa de praia valia 62 milhões. Provamos que quem vendeu a casa foi a filha do Farid, pela metade do preço! E ainda não prestou contas no Inventário. Isso também gerou um inquérito policial para investigar a filha do Farid. Tem muita coisa nesse caso. Tem até processo na Corregedoria da Polícia Civil.”

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