Opinião Paulo Rubem Santiago: Enchentes e abandonos Paulo Rubem Santiago é professor da UFPE e mestrando em Educação

Publicado em: 09/06/2017 07:12 Atualizado em:

Publiquei em 22 de junho de 2010 o artigo As enchentes: O dever de casa que não foi feito, destacando as normas e diretrizes existentes em diversas leis para que as cidades fossem efetivamente preparadas para o desenvolvimento urbano, sobretudo para enfrentar e superar situações anormais de precipitação pluviométrica como agora. Lembrei na ocasião da norma constitucional de 1988 para os planos diretores municipais, do Estatuto das Cidades (2001), da lei de saneamento com o sistema de informações do segmento e para a preservação ambiental, a gestão das águas e comitês de bacias hidrográficas Para unificar tudo isso em metas e estratégias exequíveis apresentei, entre 2010 e 2014, uma emenda constitucional criando o Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano, a PEC 162. Entretanto, por aqui e em Alagoas, pelo menos, era como se nada disso existisse. Ainda assim, as cidades e o estado mantêm secretarias de infraestrutura, das cidades, do meio-ambiente, algumas até de habitação e recursos hídricos. Em todas há um número elevado de cargos comissionados preenchidos por aliados políticos e orçamentos correspondentes com verbas assinaladas para a execução de obras, programas e ações pertinentes às respectivas pastas. Parece que tudo ficou no papel desde 2010 e não se venha falar de ausência de verbas federais para tais obras. O que aconteceu desde então? Os mais pobres são novamente vítimas do abandono, da incompetência e da surpresa das chuvas torrenciais sem nenhuma medida preventiva adotada nem qualquer ação de infraestrutura realizada para minorar e contornar com competência os impactos verificados. Percebe-se nisso que as secretarias estaduais das Cidades e das áreas de infraestrutura, ao que tudo indica, não funcionaram como deveriam, assim como a Secretaria de Meio Ambiente e demais órgãos responsáveis pela gestão das águas e de apoio aos comitês de bacia.  Quando das enchentes de 2010 revelou-se que, dois anos antes, em Quipapá, cidade da Mata Sul do estado, na direção do Agreste meridional, o Comitê de Bacia do Rio Una havia se reunido e denunciado que o governo de Pernambuco não respondia às demandas referentes à construção das barragens de contenção de enchentes nos afluentes daquela bacia. Deu no que deu dois anos depois. Passada a tragédia prometeram-se cinco barragens e o desenrolar dos acontecimentos, sete anos depois, já soubemos nos últimos dias. Isso tem nome e sobrenome composto: Abandono, incompetência e irresponsabilidade. Assim como o estado aprovou em lei um “plus” de ICMS a ser transferido aos municípios caso operassem aterros sanitários controlados, poderia também, no mínimo, ter usado do mesmo expediente para fazer acelerar a construção e execução das leis municipais de saneamento, habitação de interesse social, os planos diretores de uso e ocupação do solo, evitando ocupações irregulares, desmatamento nas proximidades de rios e açudes etc. Nada disso, porém, aconteceu, mas, certamente, muitas centenas de milhões de reais foram gastos em publicidade governamental sem qualquer serventia para a promoção do desenvolvimento urbano e a prevenção dessas catástrofes. Por isso não há como considerar natural mais uma enchente dessas proporções, atingindo prédios públicos, as casas e o patrimônio construído pelas famílias, em geral pobres, tirando-lhes bens e vidas. Isso precisa ser investigado, a omissão, a incapacidade e eventuais desvios de verbas exemplarmente punidos, sobretudo com o impedimento por anos e anos de exercício da função pública para os gestores que deixaram as populações abandonadas sem as políticas necessárias ao enfrentamento dessas tragédias previsíveis.
 


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