Do crime às indenizações: como estão os processos envolvendo o caso Miguel
Sergio Hacker e Sari Corte Real respondem a processos criminal, cível e trabalhista relacionados à morte de Miguel Otávio, de 5 anos
Publicado: 04/06/2025 às 12:23

Sergio Hacker e Sari Corte Real. (Foto: Reprodução/Redes sociais)
A morte de Miguel Otávio, menino de 5 anos que faleceu após cair de uma das Torres Gêmeas do Recife, no bairro de São José, no Centro do Recife, completou cinco anos na última segunda-feira (2). Uma manifestação foi realizada em frente aos prédios para marcar a data e pressionar a Justiça.
Liderando o ato, Mirtes Renata Santana de Souza, a mãe de Miguel, cobrou punição a Sari Mariana Costa Gaspar Corte Real, sua ex-patroa e ex-primeira dama de Tamandaré, que estava responsável pelo menino no momento da tragédia.
“A mulher que cometeu um crime contra meu filho está aí em cima vivendo a vida dela como se nada tivesse acontecido”, disse Mirtes, durante o protesto. Ela cobra o aumento da pena criminal contra Sari que, embora tenha sido condenada pela morte, recorre à sentença em liberdade.
Além desse processo, Sari e o marido, o ex-prefeito de Tamandaré Sergio Hacker, são réus na Justiça em outras ações relacionadas à morte de Miguel. O Diario de Pernambuco reuniu os processos que envolvem o caso para destrinchar em que estágio estão no momento.
Processo criminal
Na esfera criminal, Sari Mariana Costa Gaspar Corte Real foi condenada a pena de 8 anos e 6 meses de prisão, por abandono de incapaz com resultado morte, em maio de 2022. Um ano e meio depois, a pena foi reduzida para 7 anos em regime fechado após julgamento de apelação da defesa.
Sari e Mirtes Renata Santana de Souza recorreram da decisão que diminuiu a pena. O caso tramita na 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE).
Em 19 de maio de 2025, a última movimentação do processo, a defesa de Sari interpôs embargos de declaração contra o último acórdão que julgou as apelações. Entre os pedidos, a ex-patroa de Mirtes pretende reduzir ainda mais a sua pena.
Atualmente, o processo está na Diretoria Criminal para cumprimento de determinações do relator dos recursos de apelação, desembargador Cláudio Jean Nogueira Virgínio, proferidas no dia 12 de maio de 2025.
Após efetivadas as diligências necessárias pela Diretoria Criminal, o processo seguirá para o Gabinete do desembargador Eudes dos Prazeres França, que é relator dos recursos de embargos de declaração interpostos pela ré e pela assistente de acusação.
Processo Cível
A sentença assinada em 30 de julho de 2024 pelo juiz Julio Cezar Santos da Silva fixou uma indenização por danos morais de R$ 250 mil em favor de cada um dos pais de Miguel e R$ 100 mil para a avó Marta Maria Santana Alves.
Também foi determinado o pagamento de pensão tendo como início a data em que a vítima completaria 14 anos, idade a partir da qual é admitida a celebração de contrato de trabalho, e o termo final seria a data em que a vítima completaria a idade correspondente à expectativa média de vida dos brasileiros. O valor corresponde a 2/3 do salário vigente à data do óbito do garoto e será reduzida para 1/3 após a data em que ele completaria 25 anos.
A última movimentação do caso ocorreu em 19 de outubro de 2024, quando os advogados que representam Mirtes e Marta apresentaram contrarrazões à apelação de Sari Corte Real.
A ex-primeira dama de Tamandaré pediu em apelação que seja reconhecida a inexistência de responsabilidade civil culposa e minoração das indenizações para o patamar de R$ 50 mil a cada genitor e R$ 25 mil para a avó.
Processo trabalhista
O Tribunal Regional do Trabalho (TRT-6) condenou o casal Sari Gaspar Corte Real e Sergio Hacker a indenizar Mirtes e Marta em R$ 1 milhão, sendo R$ 500 mil para cada, por danos morais pela morte do menino e por fazerem as duas empregadas trabalharem durante a pandemia de Covid-19.
Na primeira instância, em 6 de setembro de 2023, o valor da indenização estabelecido foi de R$ 2,01 milhões. Posteriormente, a indenização foi reduzida.
A defesa de Sari alegou conflito de competência por estar em trâmite duas ações relacionadas à morte de Miguel, uma na esfera trabalhista e outra no âmbito da Justiça comum estadual.
O ministro Marco Aurélio Belizze, do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), deferiu parcialmente o pedido liminar, interrompendo a reclamação trabalhista em setembro de 2024.
Corte de Contas
Em abril deste ano, o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) multou o ex-prefeito de Tamandaré Sérgio Hacker Corte Real por colocar servidores municipais para prestar serviços pessoais a ele. Entre esses servidores estão Mirtes Renata Santana de Souza e Marta Maria Santana Alves, respectivamente mãe e avó do menino Miguel.
A irregularidade envolvendo as empregadas domésticas de Sérgio Hacker foi descoberta após a exposição do caso envolvendo o falecimento de Miguel.
Além de pagar multa de R$ 31 mil, o ex-prefeito deverá quitar débito de R$ 509.115,59, em solidariedade com outros três servidores.
Tribunal Regional Federal
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) aplicou uma pena de quatro anos e dois meses de prisão em regime semiaberto a Sérgio Hacker Corte Real, ex-prefeito de Tamandaré, por desvio de verbas públicas. Ele é acusado de nomear para cargos em comissão na prefeitura três pessoas que trabalhavam como empregas domésticas, estando Mirtes e Marta entre elas.
Na primeira instância, ele foi condenado a 15 anos de prisão, a serem cumpridos em regime inicialmente fechado. Hacker recorreu ao TRF5 e conseguiu reduzir a pena para quatro anos e dois meses de reclusão, com regime inicial semiaberto.
Ainda inconformado, ele entrou com recurso especial para questionar, no STJ, as circunstâncias levadas em consideração pelo TRF5 para o cálculo da pena. Para o Ministério Público Federal (MPF), o recurso não deve sequer ser admitido, pois requer que as provas do processo sejam reavaliadas pelo STJ.
"Isso não é possível em recurso especial, que tem a função de avaliar apenas se as leis foram aplicadas de forma correta no curso do processo", declarou o MPF em nota enviada em fevereiro de 2025.
Ação Civil Pública
Ação Civil Pública alega que os ilícitos trabalhistas praticados por Sergio Hacker e Sari Corte Real contra Mirtes e Marta geraram lesão extrapatrimonial coletiva à categoria das trabalhadoras domésticas e à sociedade. Uma ação civil pública é um instrumento processual que tem por finalidade defender em juízo os direitos ou interesses coletivos.
O colegiado regional manteve a condenação de primeiro grau dos acusados ao pagamento de indenização por dano moral coletivo, no montante de R$ 386.730,40, destacando que o caso revela uma dinâmica de trabalho permeada por atos "estruturalmente discriminatórios", e que "gira em torno da cor da pele, do gênero e da situação socioeconômica" da categoria coletiva das trabalhadoras domésticas.
Em recurso, que já foi negado, os acusados afirmaram que eram utilizados como "bode expiatório", sendo punidos no lugar de todos os cidadãos que contribuem ou contribuíram para o que chamaram de "discriminação estrutural dos empregados domésticos".
"A tentativa de se eximir da responsabilidade civil e trabalhista sob o argumento retórico de ausência de culpa ou da gravidade de sua conduta apenas reitera o acerto do montante fixado: é inexcusável se acreditar que o valor de R$ 386.730,40 é elevado para recompensar a lesão coletiva perpetrada em decorrência dos inúmeros ilícitos verificados nos autos", assinala o ministro relator do recurso de revista Alberto Bastos Balazeiro, em 28 de junho de 2023. O voto foi seguido de forma unânime pela Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Em julho de 2023, foram impetrados embargos de declaração, novo recurso para revisão da sentença. Segundo o histórico do processo no TST, ele foi concluído para voto em agosto de 2023. Não há atualizações após essa data.
Luana Piovani
Sari Gaspar Corte Real processou a atriz Luana Piovani em novembro de 2024 alegando que a artista proferiu ataques pessoais, "afirmando inverdades e violando direitos da personalidade".
Segundo a defesa de Sari, Luana Piovani afirmou a inverdade de que "a autora da presente ação assassinou Miguel, destacando que o Governo de Pernambuco deveria colocá-la na cadeia". A ex-primeira dama pediu uma indenização de R$ 50 mil por danos morais.
As últimas movimentações do caso se deram em abril deste ano, com Sari requerendo o depoimento pessoal da atriz, e a defesa de Luana Piovani argumentando entender que as provas documentais são suficientes.
Câmara de Tamandaré
Em agosto de 2020, a Câmara Municipal de Tamandaré arquivou uma denúncia de improbidade administrativa e um pedido de impeachment contra o então prefeito Sergio Hacker. Os dois casos estavam relacionados aos contratos de Mirtes e Marta como servidoras da prefeitura enquanto trabalhavam de empregadas domésticas do gestor.
O que diz a defesa
A defesa segue confiante no Judiciário, que deve absolver Sari da acusação de abandono de incapaz com resultado morte por ausência de previsibilidade do resultado, como ficou demonstrado durante a instrução do processo. A fase atual é aguardar o julgamento dos embargos de declaração pelo TJPE.

