Além do intervalo bíblico: Conheça os projetos de cunho religioso na Câmara do Recife
Projeto de lei que institui o chamado intervalo bíblico não é o único de cunho religioso em tramitação na Câmara Municipal do Recife
Publicado: 06/09/2025 às 10:21

Plenário da Câmara Municipal do Recife (Foto: Carlos Lima (CMR) / Assessoria )
A Câmara Municipal do Recife aprovou, na última terça-feira (2), o projeto de lei que garante aos estudantes de escolas públicas e privadas o direito de se reunir durante os intervalos para “professar sua fé” – encontro popularmente conhecido como “intervalo bíblico”. Apesar da polêmica em torno da aprovação, a proposta não é a única de cunho religioso tramitando na Casa José Mariano.
Segundo o levantamento do Diario de Pernambuco, pelo menos nove dos 330 projetos de lei enviados pelos vereadores recifenses em 2025 dispõem sobre a fé. Além disso, outros quatro textos de 2024 continuam em tramitação no legislativo.
A maioria das propostas trata de incluir elementos religiosos no calendário do município ou no rol de Patrimônios Culturais Imateriais do Recife. Outro tema recorrente é, justamente, a religião nas instituições de ensino.
O projeto de lei 61/2025, de autoria de Thiago Medina (PL), pretende garantir aos estudantes de ensino básico, superior, e técnico, além de cursos de idiomas e de pré-vestibular, o direito à “livre manifestação individual e coletiva relacionadas ao estudo, troca de experiências e à prática religiosa” em escolas, universidades e cursos privados ou públicos.
A proposta prevê, ainda, que os alunos tenham direito a reivindicar espaços reservados para a prática das manifestações nos estabelecimentos à direção da instituição. O texto reforça que a lei independeria do credo dos estudantes.
O vereador Alef Collins (PP), por sua vez, propôs a inclusão da Bíblia Sagrada como material de leitura paradidática no ensino público e privado do Recife. De acordo com o projeto de lei 144/2025, as parábolas bíblicas podem ser incluídas em disciplinas como história, literatura, filosofia, artes e ensino religioso, além de outras matérias correlatas.
Para garantir a liberdade religiosa prevista na Constituição Federal, o texto diz que nenhum estudante é obrigado a participar das atividades pedagógicas que incluam a leitura bíblica, dependendo apenas da autorização dos pais ou responsáveis.
Patrimônio Cultural
Três dos 13 "projetos religiosos" em tramitação na Casa José Mariano desde 2024 envolvem declarar elementos sagrados como Patrimônios Culturais Imateriais do Recife.
O vereador Osmar Ricardo (PT) quer tornar patrimônio, através do projeto de lei 146/2025, a Roça Oxaguiã Oxum Ipondá. O local é apontado como “referência nacional e internacional no fortalecimento da ancestralidade jeje-nagô” e abriga “o maior Festival de Candomblé da América Latina, o Ejilá Osé Oborá”.
A parlamentar Liana Cirne (PT) propôs estender a honraria ao Bloco Lírico Utopia e Paixão com a proposta 283/2025. A agremiação nasceu no Morro da Conceição, e faz homenagem à padroeira Nossa Senhora da Conceição, “entrelaçando fé popular e expressão carnavalesca de forma única e respeitosa”, justifica o texto.
Já Thiago Medina pretende incluir no rol a Primeira Igreja Presbiteriana do Recife através do projeto 305/2025. Com mais de 150 anos, o local é uma referência histórica para o bairro das Graças, Zona Norte da capital, e é apontado como referência no serviço social.
Calendário municipal
Outros três projetos de lei pretendem criar datas de cunho religioso no calendário municipal do Recife. São eles o “Dia do Estado Laico”, de autoria da vereadora Cida Pedrosa (PCdoB) no texto 116/2025; o “Dia do Combate à Cristofobia”, proposto por Alef Collins no projeto de lei 128/2025; e o “Dia Municipal dos Jovens da Assembleia de Deus”, descrito no texto 293/2025 pelo parlamentar Luiz Eustáquio (PSB).
Nome de rua
Três propostas do legislativo também tratam de alterar nomes de vias públicas do Recife para homenagear figuras ou elementos religiosos.
O projeto 27/2025, de Cida Pedrosa, quer chamar de “Travessa Terreiro de Mãe Amara” uma
via no Bairro Dois Unidos em referência ao Terreiro Ilê Obá Aganjú Okoloyá, que é situado no local, e “pela contribuição inestimável de sua fundadora, Mãe Amara de Xangô Aganjú, para a preservação da tradição nagô em Pernambuco”, argumenta a vereadora.
Em 2024, o vereador reeleito Wilton Brito (PSB) propôs chamar de “Rua Cristo Rei” a atual Rua Limoeiro, no bairro Jordão Alto, através do projeto 208/2024.
No mesmo ano, o também reeleito Paulo Muniz (PL) enviou o projeto de lei 185/2024 para transformar a Rua Bom Jesus da Lapa em ‘Rua Irmã Adélia”, freira que ficou conhecida por ter visões de Nossa Senhora em Cimbres e pelas atividades sociais no Recife. Ela faleceu em 2013.
Religião e sociedade
A ex-vereadora Michele Collins (PP), mãe de Alef Collins, enviou o projeto de lei 19/2024, em janeiro do ano passado, para “assegurar aos templos religiosos a liberdade para atribuir o uso dos banheiros de suas dependências de acordo com a definição biológica de sexo”, indo de encontro com as necessidades das pessoas transgênero. Segundo o sistema da Câmara do Recife, o texto está travado nas comissões da Casa desde fevereiro de 2024.
Outro projeto parado desde a legislatura anterior é o 175/2024, de Chico Kiko (PSB), que cria o “Programa de Assistência às Vítimas de Intolerância Religiosa” no Recife.
Cristianismo é maioria
O “intervalo bíblico” foi alvo de polêmica na última semana entre vereadores e profissionais da educação devido a aprovação sem um dos artigos originais do texto, que previa a inclusão de atividades pedagógicas incentivando a diversidade religiosa em sala de aula. Dessa forma, críticos da lei – como as parlamentares Kari Santos (PT) e Cida Pedrosa (PCdoB) – apontam que religiões além das cristãs não estariam contempladas no direito ao encontro.
O autor do projeto, vereador Luiz Eustáquio (PSB), confirmou que a elaboração da proposta foi voltada para a comunidade evangélica, mas alegou que alunos de outras religiões teriam o direito ao intervalo garantido.
As vertentes do cristianismo são maioria na Câmara Municipal. Dos 13 projetos citados nesta matéria, oito são declaradamente voltados às comunidades católicas e evangélicas, enquanto duas citam diretamente religiões de matriz africanas. As outras quatro dizem respeito à diversidade religiosa.

