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Fliporto desvenda curiosidades de Fernando Pessoa como tradutor e objeto de tradução
No último dia da Festa Literária de Pernambuco, o poeta português é debatido pelo viés da tradução para diversas línguas
Por: Viver/Diario - Diario de Pernambuco
Publicado em: 16/11/2015 07:10 Atualizado em: 16/11/2015 01:36
Ioram Melcer mediou as perguntas entre Zenith e Saraiva. Foto: Fliporto/Divulgação |
Numa de suas frases mais conhecidas, Fernando Pessoa, homenageado deste ano na Fliporto, disse que sua pátria era a língua portuguesa. Foi além: invasões territoriais a Portugal lhe incomodariam menos que a ortografia maltratada - "Sim, porque a ortografia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida." A citação do Livro do Desassossego veio à tona neste domingo, último dia da 11ª Festa Literária Internacional de Pernambuco, a Fliporto, em Olinda. No palco, três dos mais aclamados estudiosos do legado do poeta português debateram sua obra pelo viés da tradução: a fidelidade à língua-mãe (o português), a condição de poliglota do escritor e os desafios de adaptar seus textos a outros idiomas foram os eixos principais do encontro entre o israelense Ioram Melcer, o norte-americano Richard Zenith e o português Arnaldo Saraiva.
Em espanhol e português, o trio de pesquisadores versou sobre as características de Fernando Pessoa como tradutor, uma faceta menos desbravada pelo público em geral. "Ele não era rígido, como não deve ser qualquer tradutor. Porque rigidez é estupidez, rígidos são estúpidos. Qualquer radical ou fanático é rígido. E quem trabalha como tradutor tem que estar aberto às outras línguas e a outras culturas. O português de Pessoa é límpido, tanto que todo brasileiro pode lê-lo sem problemas lexicais. O português dele é um português clássico. E o tradutor Pessoa também foi um tradutor de classe", declarou Saraiva, investigador literário fundador do Centro de Estudos Pessoanos. Perguntado sobre qual seria, de fato, a língua-mãe de Pessoa - que da infância à fase adulta, em diferentes países, aprendeu português, inglês, francês, alemão, grego e, inclusive, latim - Saraiva esclareceu ainda: "Creio que a lÍngua materna de Pessoa foi, claramente, o português. Ele hesitou em ser escritor em inglês, uma lÍngua que já tinha projeção internacional, e optou pelo português, para que o idioma alcançasse projeção nacional também."
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Zenith, considerado o maior tradutor de Fernando Pessoa para o inglês - segundo Ioram Melcer, "o mundo anglo-saxão não conheceria a literatura lusófona como a conhece hoje em dia se não fosse o trabalho de Zenith." - também vê o Brasil como ponto decisivo para sua jornada. "Devo ao Brasil a minha relação com a língua portuguesa, embora meu sotaque não puxe ao brasileiro. Aprendi português em Florianopolis, onde vivi durante três anos. E foi lá que comecei a ler Pessoa", recorda. Em relação ao domínio do idioma, necessário ao exercício como tradutor, Zenith opta pela modéstia. "Não gosto dessa expressão de dominar uma língua, porque são as línguas que nos penetram e dominam." Para ele, a tradução é uma forma de "possuir" o texto, já que este é reescrito pelo tradutor. "Para fazer uma boa tradução", recomenda o americano, "é fundamental que sejamos possuídos pelo texto."
Os méritos de Pessoa como escritor e como tradutor, estes últimos especialmente, foram ressaltados pelos pesquisadores. O público reagiu principalmente às curiosidades em torno do poeta, como a quantidade de idiomas dominados por ele e as associações dos seus textos aos de outros autores, mais antigos e também consagrados - Pessoa, segundo Zenith, buscava referências em Shakespeare ao escrever poemas em inglês, por exemplo. Para o israelense Melcer, o exercício da escrita é, por si só, uma tradução. "Todo escritor é tradutor, porque translada algo de uma dimensão a outra. Todo escritor traduz algo, ainda que seja a si mesmo pra o público. No caso de Pessoa, traduzir a si mesmo era algo extremamente complexo, uma galáxia inteira."
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