Especial

Em nome dos filhos

Neste fim de semana em que é celebrado o Dia dos Pais, o Diario conta as histórias de três pais, biológicos ou não, que têm as trajetórias marcadas pela relação de troca e parceria

Publicado em: 12/08/2018 10:21 | Atualizado em: 12/08/2018 11:19

Crédito: Gabriel Melo/Esp. DP (Crédito: Gabriel Melo/Esp. DP)
Crédito: Gabriel Melo/Esp. DP (Crédito: Gabriel Melo/Esp. DP)

A figura paterna autoritária, distante e fria de “antigamente” perdeu espaço nas famílias atuais. Se no passado as relações entre pais e filhos costumavam ser simbolizadas pelo uso do poder, hoje, já não é mais assim. O século 21 pede pais mais participativos e abertos ao diálogo, à troca de conhecimento e vivência entre as gerações. Mais do que respeitados, eles querem e precisam ser parceiros para construir uma relação mais horizontal com os filhos.

Essa mudança passa pela discussão sobre o conceito de masculinidade e de ressignificação da paternidade, iniciadas na década de 1990, quando, na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada na China, ficou definida como diretriz a busca de maior participação masculina na promoção dos direitos sexuais e reprodutivos. Em um país como o Brasil, em que historicamente milhões de crianças e adolescentes crescem apenas sob os cuidados das mães e sequer conheceram os pais, a discussão é ainda mais necessária.

Neste fim de semana em que é celebrado o Dia dos Pais, o Diario conta as histórias de três pais, biológicos ou não, que têm as trajetórias marcadas pela relação de troca e parceria, e mostra como isso faz diferença na concepção de relações mais saudáveis. É o caso de Eduardo e Marcelo Coelho, que, além do vínculo como pai e filho, são ainda colegas de trabalho. A parceria em casa e no ambiente profissional fez os laços entre eles se estreitarem. James e Marilena Smith são alunos da mesma turma na faculdade e dividem a rotina de estudos. Já o advogado Flávio Brasil conseguiu construir uma relação de afeto com os três enteados a partir da troca de experiências.

Um amor revelado em carinho e ações

O advogado Flávio Brasil, 40 anos, não é de usar muito as palavras para se expressar sobre o afeto que mantém pelos enteados. Tímido, prefere as ações. Esta reportagem é uma delas. Como poucas vezes desde que chegou na vida de Gabriel, Ana Lúcia e Davi, abriu o coração publicamente para apresentar os filhos que a vida o trouxe há 12 anos. Ser padrasto mudou a concepção de paternidade que Flávio vinha construindo até aquele momento. Também deu uma salvaguarda dupla aos jovens de 23, 20 e 18 anos.

A relação de Flávio com os enteados foi forjada na necessidade, na aceitação e no respeito. A mãe deles costumava viajar a trabalho por até 40 dias, então ele assumia a responsabilidade integral dos cuidados. “Nunca quis ofuscar a imagem de pai. Inclusive, conversava com eles para ter uma referência paterna. Meu papel sempre foi mais de segundo porto, de orientar a partir da minha experiência”, diz. O convívio, porém, fortaleceu os laços de forma orgânica, explica Ana Lúcia.

Ela lembra, com carinho, de ações corriqueiras de Flávio. “Um dia, por exemplo, meus irmãos estavam fora e ele fez questão de perguntar o que eu gostaria de almoçar. Me levou para um restaurante e pediu justamente o que eu disse. Ele é muito protetor, cuidadoso”, diz. “Às vezes, ele não expressa com palavras. Mas, em ações, não se pode medir o quanto somos importantes para ele”, complementa Davi. Flávio, que queria apenas ser parceiro e orientar quando fosse consultado, ganhou admiração intensa. Nesse dia dos pais, decidiu retribuir. “É a forma de dizer o quanto tenho carinho e amor por eles”, resume. 

Mais do que colegas de estudo
Crédito:  Thalyta Tavares/Esp.DP (Crédito:  Thalyta Tavares/Esp.DP)
Crédito: Thalyta Tavares/Esp.DP (Crédito: Thalyta Tavares/Esp.DP)

O servidor público James Smith, 57 anos, já havia tentado por duas vezes cursar direito. Formado em contabilidade, ele pegou gosto pela área jurídica no trabalho, mas nunca teve fôlego suficiente para passar do primeiro período da nova graduação. Faltava motivação. Faltava a companhia da filha, Marilena Smith, 29. A insistência dela para que o pai a acompanhasse nas aulas foi virada definitiva dessa história. James ingressou no curso pela terceira vez e hoje é um dos melhores alunos da turma do quinto período de direito da Faculdade Integrada de Pernambuco (Facipe).

James sempre viu na filha vocação para a área e quando ela cursava jornalismo já fazia recomendações para que migrasse ao direito. Quando terminou a primeira graduação, Marilena não teve dúvidas. Mas, sabendo do desejo antigo do pai, começou uma campanha para que ele a acompanhasse. Assim, a parceria paternal virou também estudantil. “Antes, eu achava as aulas do primeiro período um saco. Ela passou a me motivar, dizer que o curso ia melhorar”, lembra James. Para James, Marilena é excelente mediando conflitos. Para Marilena, James tem uma capacidade surpreendente de captar os assuntos dados em sala de aulas. Cada um tem uma fórmula para estudo, mas os dois aproveitam o tempo em casa para discutir os temas. “Ele é o melhor aluno da turma e eu me sinto na obrigação de corresponder”. Mas quando ela se estressa, James troca o papel de colega pelo de pai para acalmar a filha.

Afinidades em casa e também no trabalho
Crédito: Gabriel Melo / Esp. DP (Crédito: Gabriel Melo / Esp. DP)
Crédito: Gabriel Melo / Esp. DP (Crédito: Gabriel Melo / Esp. DP)

Antes de se tornar colega de trabalho do pai, em abril deste ano, o estudante de licenciatura em matemática da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Eduardo Coelho, 21, pouco conhecia da rotina profissional dele. De natureza sigilosa, o trabalho do engenheiro de testes Marcelo Coelho, 48, era mantido em segredo até mesmo para a família. Quando soube de uma seleção para estagiar no projeto CIn/Motorolla, no Centro de Informática da universidade, onde o pai trabalha, Eduardo se inscreveu para concorrer a uma das vagas. Foi selecionado e se tornou, além de filho, colega de trabalho e confidente de Marcelo.

No trabalho, pai e filho atuam em subtimes diferentes do projeto e não têm contato direto. Ainda assim, podem passar os intervalos juntos e conversar sobre os testes que realizam em aparelhos da marca Motorolla. “Como o contrato prevê sigilo em relação ao que é feito aqui, eu sequer sabia o que meu pai fazia. Hoje, sou a única pessoa da família com quem ele pode conversar sobre o que faz”, conta Eduardo. Moradores de Aldeia, em Camaragibe, pai e filho saem de casa no mesmo horário e vão conversando no caminho. “Aqui, cada um vai para as suas atribuições. Nossa relação é muito ‘de boa’”, afirma Marcelo.
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