A chance de recomeçar a vida depois do acidente Após ficar paraplégico, Alexsandro Carneiro passou a valorizar mais a família e se dedica ao esporte

Por: Celso Ishigami - Diario de Pernambuco

Publicado em: 25/06/2015 17:26 Atualizado em: 25/06/2015 19:52

Com bandeirolas coloridas penduradas na traseira da bike, Alexsandro tenta se fazer mais visível para os motoristas (Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres)
Com bandeirolas coloridas penduradas na traseira da bike, Alexsandro tenta se fazer mais visível para os motoristas

"A última coisa que lembro é meu amigo dizendo 'não vai dar' e a gente sobrando na curva". Em seguida, Alexsandro Carneiro, que voltava dirigindo sem cinto de segurança de uma vaquejada em Amaraji, Zona da Mata Sul de Pernambuco, foi arremessado do carro. O carona saiu ileso do acidente, mas Alexsandro sofreu fraturas múltiplas nas costelas e na coluna, herdando a paraplegia como sequela irreversível do acidente. Porém, quando pensava que sua vida havia terminado, descobriu que ela estava apenas começando. Hoje, cinco anos depois, não é raro encontrá-lo pedalando (isso mesmo!) pelas ruas do Recife, enquanto alimenta o sonho de disputar uma paraolimpíada.

Aquela era somente mais uma das vezes em que Alexsandro deixava a mulher e os dois filhos em casa para aproveitar a noite com os amigos, como lembra sua esposa, Ligia Roberta. "A vida dele era curtir o fim de semana com os amigos e beber até cair. Vivia de amizades e farra. Várias vezes pensei em largar. Várias vezes mesmo. Chegou o tempo de eu nem falar mais. Eu já estava ignorando aquela situação. Comecei a viver pra mim. Quando ele sofreu o acidente, eu tinha acabado de entrar de férias e estava tomando coragem para o divórcio".

Apesar da mágoa que ainda persiste, Ligia não conseguiu virar as costas ao marido. "Quando o médico disse que eu nunca mais voltaria a andar, perdi a vontade de viver. Foi um desespero para mim e apra minha mulher. Acho que para ela o desespero foi maior do que o meu", revela Alexsandro. Entretanto, a partir do acidente, o casal encontrou motivo para apostar num recomeço. "Depois do acidente, enxerguei que a família é tudo. Antes eu só queria saber de de beber e de sair sozinho, mas minha família não desistiu de mim quando eu mais precisei. Foi então que passei a ser um pai e um marido presente. Um homem de verdade", acrescenta.

"Não sei se é a sensação de liberdade ou a adrenalina, mas fico completamente à vontade na bicicleta", descreve (Ricardo Fernandes/DP/D.A Pres)
"Não sei se é a sensação de liberdade ou a adrenalina, mas fico completamente à vontade na bicicleta", descreve

Do acidente, em junho de 2010, até alcançar a autonomia de hoje, foram cerca de três anos de terapia e persistência, compartilhadas pelo casal na luta diária que promoveu a reaproximação. "O acidente salvou a nossa família. Foi quando ele acordou pra vida e viu o estado em que estava e quem estava ao lado dele", decreta a mulher, com dureza. Juntos, eles viajaram para Brasília, depois de serem aceitos no Sarah Kubitschek - rede hospitalar de referência no tratamento de vítimas de poli traumatismo. "Participamos de aulas, palestras e treinamentos para que a gente pudesse enfrentar as dificuldades do dia a dia de um paraplégico com mais tranquilidade", lembra Ligia.

Pouco a pouco, o desespero pela impossibilidade de voltar a andar foi substituído pelo estilo de vida que ele mesmo havia rejeitado. "Ele começou a dar atenção para os filhos. Almoçar em família, viajar em família, participar das festas com nossos parentes. Eu sempre ia para todo canto sozinha com meus filhos. Hoje, ele vive para a família e para o esporte que escolheu". Com a voz embargada e os olhos marejados, Alexsandro reconhece. "Precisei passar por uma tragédia para dar valor ao que realmente importa nessa vida. Hoje, tudo o que quero é ser um marido e um pai digno de orgulho".


O papel do esporte
Quem precisa (ou escolhe) andar de bicicleta no caótico trânsito do Recife sabe que os sustos fazem parte do dia a dia. Imagine se o modelo exigir que o ciclista pedale deitado, a um palmo do chão. Com bandeirolas coloridas penduradas na traseira da bike, Alexsandro tenta se fazer mais visível para os motoristas. Mas ainda assim não é possível evitar todos os finos. "Sempre tem alguém que passa xingando, tirando fino", lamenta. "Mas a maioria me dá força, grita alguma palavra de apoio de dentro do carro e sai acenando. Mas não esperava nada diferente. Hoje, entendo que as dificuldades aparecem pra gente superar. Então, eu continuo a minha caminhada".

Depois de se arriscar no basquete sobre rodas, Alexsandro descobriu no ciclismo adaptado uma paixão. "Não sei se é a sensação de liberdade ou a adrenalina, mas fico completamente à vontade na bicicleta", descreve, sem esquecer que, através do esporte, voltou a sonhar. "Esse esporte é algo que me motiva a acordar cedo todos os dias, me alimentar de maneira adequada e procurar sempre superar meus limites. Treino todos os dias e ainda tenho o sonho de disputar uma Olimpíada".

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