Opinião

Fernando Araújo: A Constituição exige respeito

Fernando Araújo é advogado, professor, mestre e doutor em Direito. É membro efetivo da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas - APLJ

Publicado em: 15/02/2018 10:51

A Lei mais importante do país (a Constituição de 5 de outubro de 1988) vem sendo alvo de ataques, modificações absurdas ao longo desses anos. As ofensas e os vilipêndios a essa “jovem senhora” de apenas 30 anos – com permissão do sentido figurado tem sido violentos. Não se trata de defender que todas as regras contidas na Carta Política sejam eternas. A crítica vai para algumas alterações perpetradas pelo Parlamento em desconformidade com a ampla vontade dos eleitores, conforme atestam pesquisas realizadas. Mudanças que consagram verdadeiros retrocessos. E afrontam até as chamadas cláusulas pétreas garantidas pelo §4º, do art. 60. Apesar de sua curta existência, o Estatuto Maior do país já sofreu mais de 100 emendas e outras se encontram em tramitação. Algumas foram derrotadas, curiosamente as de cunho progressista, a exemplo de uma do senador Paulo Paim/RS que impedia retirar recursos da Previdência para fins diversos. A conclusão que se tira dessa realidade é que fizemos uma Constituição progressista para ser operada por uma maioria congressual conservadora. O que vem piorando a cada nova eleição (oxalá seja diferente em 2018!). Como texto de ruptura, a CF de 1988 foi elaborada com o propósito de superar muitas mazelas e iniquidades que dominavam a sociedade, como a pobreza e a marginalização e as desigualdades regionais (art. 3º), bem como garantir a prevalência dos direitos fundamentais. A Constituição é um valor. É algo em que a nação acredita e que todos querem ver concretizados os seus mandamentos. Daí ter dito “O Senhor Diretas” – deputado Ulysses Guimarães ao promulgá-la, exigindo de todos o maior respeito ao seu conteúdo: “A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da Pátria”. E disse mais: “a Nação quer mudar. A Nação deve mudar. A Nação vai mudar. A Constituição pretende ser a voz, a letra, a vontade política da sociedade rumo à mudança. Que a promulgação seja nosso grito: – Mudar para vencer! Muda, Brasil!”. Sabia ele que ali se encerrava o momento constituinte, levado a efeito com muita luta e maestria, quando o legislador originário captou e arrolou para dentro do texto da LEX MATER, em forma de princípios, os valores nacionais. Essa discussão sobre a vedação do regresso social deita raízes na Alemanha do início dos anos 1970, quando aquele país atravessava dificuldades econômicas, mas mesmo assim manteve as conquistas sociais do seu povo no denominado Estado do Bem-Estar Social. Depois, outros seguiram os mesmos passos, inclusive Portugal. No Brasil, ainda existe uma saída, que não é a do poema de Carlos Pena Filho, “entrar no acaso e amar o transitório, senão a de vermos julgadas procedentes pelo STF – Supremo Tribunal Federal as ADIs 5.230 e 5.246(Ação Direta de Inconstitucionalidade). Ótima oportunidade para um amplo debate acerca da existência do princípio da vedação do retrocesso social e os seus eventuais limites em nossa Carta Magna. É que elas(as ações) questionam em seu bojo a legitimidade do Executivo e Legislativo de poderem suprimir ou restringir benefícios sociais que foram assegurados anteriormente aos cidadãos. Aliás, muitos desses retrocessos são justificados por crises artificiais e conjunturais. Entabulam discursos persuasivos a partir de instrumentos com tecnologias de ponta em face de uma população carente nesse insensato mundo de pós-verdades e fake news. É isso.
 
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