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Editorial: Os frutos deixados por Nildo Nery

Publicado em: 06/01/2018 08:16 | Atualizado em: 06/01/2018 08:23

Pernambuco encerrou a semana com um grande motivo para lamentar – a morte do desembargador Nildo Nery dos Santos, ex-presidente do TJPE. Antes de tudo, tratava-se de um humanista. E a perda de pessoas assim, justamente quando o mundo passa por turbulências que sacodem os pilares dos direitos humanos, só pode mesmo ser considerada uma lástima. Lacuna ainda maior quando lembramos que a própria Justiça, em nível nacional, vê-se, nos dias de hoje, alvo de severos questionamentos. Embora não seja nunca adequado ou até mesmo justo estabelecer comparações, o também professor universitário, querido pelos alunos que contribuiu para transformar em colegas de profissão, distinguia-se exatamente pela sensibilidade: identificava faltas e queria trabalhar para diminuir o abismo da desigualdade social.

Fez do seu jeito, que parecia muito diferenciado no objetivo e no alcance – usou a música como uma oferta de futuro para milhares de crianças e jovens teoricamente sem perspectiva de nenhum. E acertou. Sua fórmula humanista de Justiça que também alcançasse os joões e as marias nascidos em bairros muito pobres do Recife, acabou por revelar o essencial nas entrelinhas de cada ação do Programa Criança Cidadã: quando há um sonho e esforço para realizá-lo, os frutos são promissores. Desde 2003, os passos se mostraram cada vez mais largos, pois o programa originou a ONG Associação Beneficente Criança Cidadã, que hoje responde por um espaço cultural, a orquestra e as olimpíadas. Reúne 330 crianças e adolescentes que já podem sonhar com um caminho.

Porém, o grande legado de Nildo Nery, mais do que a ação, é o exemplo. E morreu aos 83 anos sem aparentar nenhum cansaço ou arrependimento diante do desafio vencido. Por ele, teria vivido mais sete vidas dedicadas a provar, na prática, que a Justiça pode bem mais do que simplesmente oferecer respostas objetivas às costumeiras demandas, pois, sem um olhar mais demorado e cuidadoso sobre as carências dos desfavorecidos, dá a impressão de existir apenas pela metade. Seria de extremo valor que os desembargadores jovens pudessem provar, agora, o quanto assimilaram a lição. É de legados assim, honrados com práticas semelhantes, que a Justiça precisa para conseguir restabelecer a sintonia com o povo.
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