Opinião

José Luiz Delgado: Um dia atrás do outro

José Luiz Delgado é professor de Direito da UFPE

Publicado em: 17/01/2018 07:20

Conduzido por seu Príncipe, o mundo se levanta contra Deus – escrevi na última vez. E, ao escrever isso, me lembrei, espantado, que o Concílio havia pretendido uma espécie de reconciliação entre a Igreja e o mundo e importantes teólogos e padres conciliares, quase em êxtase, puseram-se a descrever as maravilhas deste mundo. Era esse o “espírito conciliar”: a alegria diante do mundo (que passa), aquela ilusão, ou aquela idolatria que, com sua magnífica lucidez, Maritain iria denunciar como prosternação diante do mundo, ajoelhar-se diante do mundo. O que diriam hoje aqueles otimistas e ingênuos padres conciliares vendo essa revolta do mundo contra o plano de Deus, esse erguer-se do mundo contra o Criador? O mundo que tanto eles louvaram, diante do qual tanto se deliciaram, é essa resposta demoníaca que dá à Igreja...

Nada como um dia atrás do outro. O tempo é senhor da razão. Dado um evento evidentemente importante, espere-se um pouco, dê-se tempo ao tempo, que só depois de certo intervalo, aparecerá a boa perspectiva daquele evento, seus frutos, sua significação, seu alcance, seus desdobramentos.

Brasília, por exemplo. Revejo agora, no rico depoimento de Carlos Chagas sobre o regime militar, a oposição à construção dela, sob o argumento de que ela afastou a elite política do sentimento do povo, e que, se o governo tivesse continuado no Rio, a vibração popular, a pressão das ruas, a força da opinião pública não toleraria os abusos de corrupção que, ao longe, naquelas imensidões do planalto central, se perpetraram. É possível. Mas poderia o Brasil não construir Brasília? não tomar posse efetiva daqueles espaços gigantescos e promissores? Poderia continuar preso apenas ao litoral, desconhecendo as potencialidades do fabuloso centro-oeste? Nada como um dia atrás do outro. Construída pelo gênio de Juscelino, Brasília quase virava um elefante branco, dadas as prevenções contra ela tanto de Jânio quanto de Jango. A rigor, foi o regime militar que a salvou. E hoje aí está ela, viva, contradizendo em tanta coisa o plano piloto original – também nisso, paradigma das contradições de que o país é cheio, e, por isso mesmo, desafiando a força coletiva para enfrentar a corrupção e livrar o Brasil da casta de políticos corruptos que o domina.

Revendo a história de Carlos de Lima, espanto-me com a violenta oposição que moveu ele à construção da Avenida Boa Viagem, empreendida pelo governo Sérgio Loreto. Pode-se imaginar o Recife sem aquela avenida? Há muito ela se tornou verdadeiro cartão postal de nossa capital. De mão dupla passou a mão única; de casario variado e mansões imponentes, passou a fileira de prédios de apartamentos, ainda bem que separados uns dos outros, diferentemente da muralha horrível de Copacabana; de residência dos mais abastados passou a lugar de festivais e passeatas que devem tirar o sossego dos moradores – mas Avenida sempre essencial para a vida da cidade, absolutamente inimaginável sem ela.  O governo Sérgio Loreto viu mais longe, teve a visão mais certeira e mais fecunda. Nada como um dia atrás do outro.
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