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Editorial: Abominável preconceito

Publicado em: 12/01/2018 06:54

Asociedade brasileira, ou pelo menos parte dela, precisa do divã de um analista. Um tratamento para se livrar do preconceito, do racismo, da intolerância e das fobias. Apela-se para piadas sem a menor graça para depreciar as pessoas, especialmente aquelas as quais se convencionou chamar de “diferentes”. Mas diferentes em quê? Negros seriam diferentes por causa da cor da pele? Os não adeptos das religiões de matriz europeia seriam diferentes por terem formas próprias de diálogo com o sagrado? Os não héteros seriam diferentes em razão de se relacionar com pessoas do mesmo sexo?

Independentemente da etnia, do credo e da orientação sexual, todos são humanos, condição imutável para que sejam merecedores de respeito. Simplesmente, respeito. Ninguém precisa ser tolerado e, sim, respeitado. Ao longo da semana, um apresentador de tevê criticou a emissora concorrente e, em tom jocoso e com palavras chulas, afirmou que a adversária tem no seu staff homossexuais em excesso.

O que seria engraçado — na verdade, uma manifestação inequívoca do atraso e um ato de violência — foi mais um dos muitos subterfúgios usados para agredir a população de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis (LGBTs). Aceitar o comentário como“brincadeira” é naturalizar a discriminação e o preconceito, absolutamente nocivos às relações humanas. Hoje, o Brasil, seguido do México e dos Estados Unidos, é o país com o maior número de homicídios de homossexuais do planeta. Em 2016, mais de 340 gays foram mortos, alvo do discurso e da prática do ódio, que assume proporções absurdas no cenário nacional. A cada 25 horas, um LGBT é morto no país.

Mais: o Brasil se destaca, no ranking mundial, com 61.619 homicídios por ano. Um dado vergonhoso, que mostra a ineficiência do poder público em garantir a segurança dos cidadãos. É nesse cenário de horror que os homossexuais, negros e os tidos como“diferentes” são tratados ante os muitos retrocessos políticos e sociais que punem a todos sem distinção.

Atitudes gratuitas de agressões não são repreendidas. Há quem as considere normais e as incentive usando a projeção social conquistada. Reforça-se, dessa forma, uma cultura medieval e um estigma contra casais do mesmo sexo, algo inconcebível para os atuais tempos. O Judiciário reconheceu como legítima a união homoafetiva, em julgamento histórico pelo Supremo Tribunal Federal, em2011, que teve como relator o então ministro Carlos Ayres Britto.

O preconceito por opção sexual, etnia, credo é expressamente vedado pela Constituição.Mas, ainda assim, há os que o defendem. Adotam comportamento invasivo e afrontam direito do outro à privacidade e de dispor da sua sexualidade como bem entender. O homofóbico não reconhece que o padrão de família se transformou e evoluiu.

Casais gays deixaram a clandestinidade e deram novo formato aos núcleos domésticos. A mudança é legal e acolhida não só pelo Judiciário, mas por instituições seculares que sempre a condenaram. O líder máximo da Igreja Católica, papa Francisco, cumprimentou o casal brasileiro de homossexuais que, em junho do ano passado, batizou os três filhos adotivos. O gesto do pontífice sinalizou ao mundo que a era da fogueira acabou.

Ainda que não tenha tido a intenção, o papa deixou claro aos que vivem e agem nos subterrâneos dos tempos do obscurantismoque, noséculo 21 e daí em diante, entre os humanos, deve prevalecer um dos dogmas LGBT: “Love is love”. Assim, a humanidade caminhará melhor.
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